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Análise: Medina surfa na carência nacional de heróis rumo à idolatria

José Ricardo Leite

Do UOL, em São Paulo

23/12/2014 08h28

Nem mesmo a família de Gabriel Medina esperava que ele fosse causar tanto furor em 2014. Para os que nunca acompanharam surfe, o nome do meninão da praia caiu quase que como um meteoro no esporte nacional. Na mídia, nos bares, nas redes sociais...nos últimos dias, seu nome saía da boca das pessoas e dos teclados de computadores ou smartphones como se fosse um velho conhecido. De paraquedas, nadando ou de prancha, fato é que Medina tem nas mãos a senha pra adentrar à galeria de ícones do esporte nacional. E já começou a digitá-la.

A rapidez de sua ascensão lembra a velocidade da atual era da informação e dos compartilhamentos virais. Mas as várias curtidas que o surfista acumula em muito são oriundas da carência brasileira de grandes ídolos no esporte fora do futebol (sem, obviamente, minimizar seu feito pra lá de relevante no surfe). O Brasil está carente após o fim de Guga e Senna e há tempos procura um ícone. Medina, com apenas 20 anos, já se lançou nessa onda que está por vir.

A velocidade de trem bala para tentar formar um ídolo por aqui não é tão novidade em tempos recentes. Que o diga Anderson Silva, que até 2011 era apenas um brasileiro que se destacava em um esporte com palco nos Estados Unidos e que muitos torciam (e ainda  torcem) o nariz para sua prática. Depois do cinematográfico chute frontal sobre o queixo de Vitor Belfort, Spider pegou um elevador que em poucos segundos o levou à idolatria. Ele mesmo já se comparou a Kuerten e Senna.


Mas a curva do lutador do UFC parece estar na descendente. Perdeu o status de supercampeão e ganhou uma certa dose rejeição pela maneira que isso se desenrolou, com ares de deboche. Terá 40 anos em 2015 e sua permanência no esporte tende a não ser duradoura. Parece estar subindo a placa do último round.

Se o sol de Anderson está se pondo, o de Medina nasce com raios fortes que já começam a brilhar na vista. Mas além do relevante feito esportivo e da carência nacional por um ícone, Medina tem a seu favor o carisma. O garoto das roupas coloridas carrega a humildade como se fosse uma prancha presa no corpo. Uma corda que parece ser difícil de se soltar. Nesse aspecto, tem muito em comum com Guga, o último dos ídolos que tinha imagem quase que incontestável perante aos fãs.

Jeitão desencanado, fala de “bicho grilo”, bermuda, chinelos e forte relação com o mar, uma das paixões do brasileiro por envolver o orgulho da sensação de produto nacional. O “estilo carisma”, pra usar também um termo da moda, potencializa a imagem do surfista.

Mesmo que sem segundas intenções, ao levantar a bandeira brasileira para comemorar seu título, Medina praticamente distribuiu um cartão pessoal para a idolatria. Carregar a flâmula verde e amarela, praxe de Guga e Senna, é mexer com o emocional tupiniquim. Ainda mais no ano do 7 a 1.

Medina, com seu boné, óculos de sol e cabelo molhado da praia, tem tudo para ser o novo “ídolo legal”, como foi Guga. Status que Cesar Cielo não atingiu pelo jeitão tímido, caseiro e família. Sem demérito algum por isso, já que o nadador carrega junto dos óculos aquáticos a reputação de bom moço e exemplo familiar.

Até a amizade com Neymar pode ajudar a potencializar Medina, que mantém alto nível de integração com os esportistas do país, principalmente os mais jovens e descolados. A relação com o maior nome do futebol já rendeu foto com língua de fora e o sinal de “parça” com os dedos. Entrou pro time.

O tamanho e o status que Medina ocupa agora e futuramente como ídolo nacional vão ficar na cabeça de cada um.  Ídolos não são impostos. Tampouco há uma democracia que os elegem por maioria de votos. Mas eles têm o poder de tornar cada atitude algo tão relevante como seu feito esportivo.

Na última sexta, a festa na praia de Pipeline com bandeiras brasileiras foi repercutida como um título da Fórmula 1 ou Grand Slam do tênis. Junto do colar florido e troféu de acrílico, Medina ganhou um ingresso para o clube dos grandes ídolos. E tem cara de quem vai aproveitar o convite e se divertir como em um baile do Havaí. Vai surfar nas ondas da carência nacional por ídolos. Levando na prancha seus feitos, qualidades e carisma do garotão das praias.