Marcos Daniel cita falta de camaradagem no adeus e lembra furo a boicote por R$ 2 mil

Com uma lista de lesões no ombro, o gaúcho Marcos Daniel decidiu tentar encerrar a carreira em Roland Garros, mas a falta de uma desistência antecipou para esta terça-feira o abandono das quadras de um dos principais brasileiros após Gustavo Kuerten. A saída sem a última vez em Paris causou certa mágoa com tenistas lesionados que não desistiram para que ele pudesse atuar.

Já sem treinar regularmente, ele não tinha boas condições para jogar o qualificatório e precisava de quatro desistências para entrar na chave principal. David Nalbandián, Paul-Henri Mathieu e Fernando González desistiram do Grand Slam. Marcos Daniel entrou em contato com outros tenistas lesionados, mas eles preferiram esperar o final da semana para uma possível desistência, o que lhe deixou magoado, conforme afirmou em entrevista exclusiva ao UOL Esporte nesta terça-feira.

O tenista que já foi número 56 do mundo havia lesionado o joelho em janeiro deste ano antes de enfrentar o espanhol Rafael Nadal, quando abandonou a partida. No trabalho de recuperação, o gaúcho começou a ter problemas no ombro e não viu outra saída a não ser se retirar aos 32 anos sendo o segundo maior vencedor de challengers com 14 títulos, mas sem conquistar um torneio ATP depois de 16 anos de carreira e algumas vitórias destacadas, como a diante do ex-número 1 Lleyton Hewitt.

Marcos Daniel encerra a carreira como único brasileiro a enfrentar Roger Federer e Rafael Nadal no circuito até o momento, sendo três confrontos com o espanhol. Ele acumulou 14 conquistas de challenger para ficar como o segundo maior vencedor de torneios da série na história, atrás apenas do japonês Takao Suzuki, que ganhou 16, e do marroquino Younes El Aynaoui, com 15.

Momento da aposentadoria sem Roland Garros

Hoje [terça-feira] era 4h da manhã e eu estava olhando no computador. Sabia que não ia acontecer nada. Falamos ontem [segunda-feira] com o [chileno Fernando] González, e ele desistiu. E depois tentamos contato com o [argentino Juan Martin] Del Potro e ele disse que iria abandonar na quinta, o [alemão Tommy] Haas falou que deve cancelar. Eu não posso obrigar a cancelar, mas por questão de camaradagem podiam tirar o nome antes. Por questão de algumas horas eu fiquei fora. Fiquei triste, não precisava ficar um fora. Mesmo que fosse lá para perder na primeira rodada, já perdi tantas... Queria muito ter ido para lá. Agora estou aposentado e vou jogar dominó na praia O argentino Juan Martin Del Potro confirmou sua participação em Roland Garros somente na noite de terça-feira.

A última partida de Daniel foi no Torneio de Estoril, quando perdeu para o francês Edouard Roger-Vasselin ainda na primeira rodada.

Desejo de jogar o Pan de Guadalajara

Eu pensei tanto no Pan como na Olimpíada, eram minhas metas, eram coisas que me motivavam, como a Copa Davis. Com essa lesão seria muito complicado, até seria muito legal ir, mas depois da lesão deu um banho de água fria e tirei da cabeça de jogar o Pan devido a isso. Sem treinar, não tenho chance Daniel jogou o Pan do Rio-2007 e foi eliminado nas quartas de final.

Polêmicas da Copa Davis: furo de boicote e desententimento com Meligeni

Caí de para-quedas totalmente por questões financeiras, liguei para o Larri e acabei aceitando porque tinha que jogar, não tinha grana para seguir. Sabia que isso iria dar um problema sério, mas tem momentos em que a gente tem de optar e era a única forma de seguir jogando. Já era casado e a situação era feia mesmo na parte financeira. São situações da vida no momento e não me arrependo porque foi o que me deu condição de poder falar hoje. Se eu tivesse a opção, não iria. Hoje eu digo não, obrigado. Mas na época R$ 2 mil me salvaram a vida. Hoje a gente pode se dar ao luxo de não aceitar. O caso do Meligeni foi uma opção dele, é passado. O Soderling era realmente incrível e passou por cima de nós. Ficou para trás

Em 2004 os principais tenistas brasileiros liderados por Gustavo Kuerten decidiram boicotar a equipe da Copa Davis em protesto contra os problemas da administração do então presidente da CBT, Nelson Nastás. Marcos Daniel foi convocado, jogou e acabou perdendo ao sentir cãibras contra o Paraguai e o Brasil acabou caíndo para a segunda divisão mesmo jogando em casa, na Costa do Sauipe.

Lesões que encurtaram a carreira

Eu tenho um monte de lesões no ombro. Tive uma fratura de estresse na clavícula, no mesmo ombro uma ruptura parcial do ligamento em três lugares, o tendão desfiou e hoje tenho 40% só do tendão. Com essa perda de massa a minha força caiu um monte e tenho também uma bursite no ombro. Começou e foi uma atrás da outra. Isso eu já estava na austrália quando joguei contra o nadal, mas era tanto antiinflamatório pelo joelho que nem senti. Tentei, fiz o que deu. Estava perdendo para caras que ganhava fácil, meu nível caiu demais

Frustração pela falta de títulos da ATP

Pelas circunstancias da carreira e lesões não consegui nunca estar no melhor da minha forma desde jovem. Isso fez com que não conseguisse alcançar o que queria. Não me agrada nada o resultado que tenho da ATP, apesar de eu ter ganhado de muitos caras. Ganhei do [Lleyton] Hewitt, do [Fernando] Gonzalez, [Mariano] Puerta, [Jose] Acasuso, [Guillermo] Cañas... Mas o resultado mais expressivo foi semifinal [Gstaad-2009]. Acho que tinha potencial para mais, mas como o tempo passou, aquele meu objetivo de ser maior ficou. No final das contas só de estar jogando mesmo que não fosse o esperado eu estava satisfeito. O [médico Gilbert] Bang escreveu que eu tinha duas lesões sérias e ele foi me enrolando. Eu sentia na pele, mas não sabia que era isso mesmo. Mesmo que eu ganhasse, jamais estaria 100%. Queria ter ganhado ATP e feito mais coisas, não deu. Mas com o que eu tinha, consegui bastante coisa sempre sozinho, sem grana e fazendo o que dava

Possível carreira de técnico na academia de Larri Passos

Na verdade a gente conversou rapidamente na academia, nada oficial. É um desejo que tenho de ficar trabalhando com tênis. Já estou com mestrado e doutorado. Para mim e para os jogadores que poderão trabalhar comigo é legal. Meu caminho foi bem complicado e a gente sabe por onde percorrer e agora eles devem voltar depois de Wimbledon, seria muito bacana, mas por enquanto não tem nada fechado com ninguém. Não adianta sair correndo, vamos ver o que aparece, se há interesse em clubes e academias. O melhor é seguir aqui, neste momento estou desempregado. Vamos ver se a CBT com um centro de treinamento não pode me encaixar para trabalhando ali

Único brasileiro a jogar com Roger Federer e Rafael Nadal

Eu sou um felizardo, incrível realmente isso. É um momento que quando eu lembro, dou uma olhada nos meus arquivos ali, descendo até a quadra para jogar contra o Federer... Era uma situação complicada, eu estava tentando entrar entre os 100 e ele batendo todos os recordes. Joguei com ele quando ele era o cara, e com o Nadal quanto ele era o cara também. Com os dois eu fiz bom jogo, ali deu para ver que tinha potencial para fazer algo a mais, mas estou satisfeito com o que fiz. Agradeço a Deus. Joguei com o Hewitt que também foi numero um do mundo e até ganhei na época e foi muito show