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Fisiologistas veem Djokovic e Nadal sob riscos de ultramaratonistas em jogo de quase 6h

Nadal e Djokovic apontam exaustão após final mais longa da história dos Grand Slams - AFP PHOTO/PAUL CROCK
Nadal e Djokovic apontam exaustão após final mais longa da história dos Grand Slams Imagem: AFP PHOTO/PAUL CROCK

Bruno Freitas

Do UOL, em São Paulo

31/01/2012 13h19

Novak Djokovic e Rafael Nadal impressionaram o mundo do tênis no último domingo em uma partida de alto nível técnico na decisão do Aberto da Austrália, com duração de quase 6 horas. Os dois melhores jogadores da atualidade quebraram o recorde de duração em uma final de Grand Slam, mas levaram seus corpos próximos ao limite, lidando com um pacote de riscos atrelado ao esforço físico exagerado.

CENAS DA MARATONA NA AUSTRÁLIA

  • Daniel Munoz/Reuters

    Novak Djokovic desaba de cansaço após vencer Rafael Nadal na final em duelo de cinco sets

  • Julian Smith/EFE

    Finalistas Djokovic e Nadal se abraçam depois do último lance da partida de 5 horas e 53 minutos

Djokovic venceu Nadal em exatas 5 horas e 53 minutos, com o placar de 3 sets a 2 (parciais de 5-7, 6-4, 6-2, 6-7(5-7) e 7-5). Na opinião de brasileiros prestigiados na área de fisiologia esportiva, os dois tenistas chegaram no nível de exigência física semelhante ao de um ultramaratonista.

"A tolerância no esporte de alto rendimento tem sido muito permissiva. Acho que se tem ultrapassado o limite do bom senso, em esportes como a ultramaratona, o Ironman [modalidade de longas distâncias do triatlo]. São exigências que, à luz do conhecimento cientifico, estão muito acima do recomendável, do tolerável", afirma Turíbio Leite de Barros, ex-fisiologista do São Paulo.

"Numa situação como esta [final Djokovic x Nadal] existe uma absurda perda de água e de sais mineiras. A perda de sódio é o que mais ameaça a saúde numa situação como essa. É preciso assegurar que não haja queda do nível de sódio. Falando de uma forma mais contundente, é algo que pode matar um indivíduo. Existem inúmeros casos de morte por perda de sódio nas corridas longas, não é terrorismo. Isso é chamado de hiponatremia", acrescenta Turíbio. "A diferença é que os tenistas têm intervalos para se hidratar", conclui.

O antigo fisiologista do São Paulo tinha como prática usar uma fita especial colada ao corpo dos atletas para reposição imediata de sódio e potássio, em iniciativa preventiva contra câimbras. Fisiologista da equipe médica do Corinthians, Antonio Carlos Fedato Filho fala de outros truques que o tenista pode adotar contra ameaças físicas em jogos tão longos.

"O isotônico é uma boa forma de repor os sais minerais e outras substâncias. A banana demora um pouco para o corpo absorver, mas dá uma certa energia e serve em situações de esvaziamento gástrico muito grande. Na reposição de sódio especificamente, tem a fita que o Turíbio usava no São Paulo. Mas eu também recomendo o [molho] shoyo, que é puro sódio. Tem uma rápida absorção pelo corpo", diz o profissional do Corinthians.

UM JOGO PARA A HISTÓRIA

Antes do duelo de domingo em Melbourne, o recorde de finais de Grand Slam era da decisão do Aberto dos Estados Unidos de 1988 entre o sueco Mats Wilander e o tcheco naturalizado norte-americano Ivan Lendl, com 4h54.

O jogo de domingo também foi o mais longo da história do Aberto da Austrália. Curiosamente, Rafael Nadal também esteve presente no recorde anterior: em 2009, o confronto do espanhol contra o compatriota Fernando Verdasco na semifinal durou 5h14.

Na avaliação dos fisiologistas consultados, jogadores submetidos a este tipo de exigência física devem repousar por pelo menos 72 horas antes de retomarem a atividade física.

No domingo, Djokovic e Nadal não conseguiram disfarçar a exaustão durante a cerimônia de premiação. Enquanto patrocinadores e dirigentes do torneio discursavam, os dois jogadores se apoiaram na rede para descansar. Depois da cena inusitada, a organização providenciou cadeiras e garrafas de água para a espera dos finalistas pelos troféus.

Apesar do cansaço, o campeão Djokovic apresentava uma euforia acima do normal após a partida, quase em uma espécie de transe. Especialistas da fisiologia dizem que a reação é explicável pela medicina esportiva. 

"Existe toda uma química cerebral, que compartilha dessa situação. A endorfina é liberada através do exercício prolongado e da euforia da vitória. A endorfina também age na tolerância maior a dor e ao desconforto", diz Turíbio de Barros.