Investigação da PF suspende projeto olímpico de Guga e Larri Passos
Uma investigação promovida por PF (Polícia Federal), CGU (Controladoria Geral da União) e TCU (Tribunal de Contas da União) por suspeita de desvio e má gestão de dinheiro público fez com que o Ministério do Esporte não renovasse um convênio com a CBT (Confederação Brasileira de Tênis) para a continuidade do "Projeto Olímpico de Tênis Rio 2016".
O projeto, idealizado pelo maior campeão do tênis brasileiro, Gustavo Kuerten, o Guga, e com supervisão do técnico Larri Passos, foi lançado em agosto de 2011 com grande repercussão, mas descontinuado um ano depois, em agosto de 2012, após consumir R$ 2 milhões do governo federal, mas apenas agora a investigação e o fim do projeto veio a público.
O objetivo do programa, segundo o Ministério do Esporte e a CBT, era "promover um treinamento multidisciplinar visando a preparação de atletas para as Olimpíadas do Rio 2016". Na prática, a ideia era treinar e dar suporte a jovens tenistas brasileiros para que, em 2016, eles estivessem bem colocados no ranking mundial elaborado pela ITF (Federação Internacional de Tênis) com base no ranking mundial da ATP (masculino) e WTA (feminino) e, assim, conseguissem garantir participação nas Olimpíadas do Rio de Janeiro.
De acordo com a CBT, apenas os 56 tenistas melhores colocados no ranking da ITF garantem participação automática nos Jogos Olímpicos. São permitidos no máximo quatro tenistas individuais e duas duplas por país, dentre outras regras. A ITF convida oito atletas. Em 2012, o ranking se fechou em maio, logo após o torneio de Roland Garros, na França, cerca de dois meses antes do início dos Jogos Olímpicos de Londres.
Assim, o projeto foi encerrado quase quatro anos antes das Olimpíadas e sem atingir seus objetivos, já que a maioria dos 16 tenistas escolhidos para integrar esta equipe não está hoje entre os 56 primeiros colocados dos rankings mundiais masculino e feminino. Os atletas que foram a Londres não participaram do programa.
Sem apoio, os poucos que alcançaram as primeiras posições do ranking terão dificuldade para se manter no topo por mais de três anos até os jogos de 2016. Segundo a CBT, porém, eles contam com outros projetos de apoio e patrocínio.
Em nota, o Ministério do Esporte afirmou que "tem todo interesse em manter o projeto de preparação de tenistas para 2016, tanto que, no processo de chamada pública para entidades privadas aberto em agosto de 2012, havia aprovado um novo convênio com a CBT que embutia recursos para continuidade do projeto idealizado por Guga e supervisionado por Larri Passos".
Apesar disso, continua a nota, "no decorrer do processo da chamada, o Ministério recebeu requisições de informações para auditorias e investigações feitas pela CGU, o TCU e a Polícia Federal no convênio da confederação com o Ministério motivadas por denúncias de um ex-dirigente da entidade. O Ministério decidiu então suspender preventivamente a formalização do novo convênio até que sejam finalizadas as apurações em andamento".
Falta de compreensão
A CBT afirma que não há qualquer irregularidade no uso da verba federal de R$ 2 milhões destinada ao Projeto Olímpico em 2011. De acordo com a entidade, os recursos foram gastos em "passagens aéreas, hospedagens, contratação de recursos humanos especializados, ajuda de custo aos beneficiários e estrutura nos centros de treinamento Larri Passos Tênis Pro, em Balneário Camboriú (SC), e Itamirim Clube de Campo, em Itajaí (SC)".
Os gastos e as movimentações de compra e troca de passagens aéreas foi o que primeiro chamou a atenção da Controladoria Geral da União. Documentações referentes a esses negócios estão agora sob investigação da Polícia Federal, que afirma não poder comentar o assunto enquanto o processo investigativo estiver em curso.
A jornalistas, o presidente da CBT, Jorge Lacerda Rosa, declarou que o problema no projeto foi a falta de compreensão dos órgãos de controle sobre as especificidades dos gastos exigidos pelos tenistas profissionais. "A Confederação não quer mais fazer projetos onde constem compra de passagens”, afirma Rosa. “Imagina um atleta não poder retornar para casa ou seguir para outro torneio quando perde numa semana. Se tem mais pontos e quer jogar torneios mais fortes, não pode. A falta de conhecimento desses órgãos tornam impossível utilizar verba para essa finalidade. O Brasil vai chegando nas Olimpíadas e não consegue apoiar os atletas”, lamenta o dirigente.
Apesar disso, o presidente da CBT e diz satisfeito com os resultados do projeto, em nota enviada ao UOL Esporte. "O Projeto Olímpico Rio 2016 tinha a validade de um ano e foi cumprido. Solicitamos ao Ministério do Esporte que o projeto Rio 2016 fosse substituído por dois projetos de maior abrangência: o Rede Nacional e o Medalha Olímpica. Mas não dependemos apenas dos projetos com o Ministério do Esporte, temos outras fontes de recursos que serão alocadas, em valores menores, no incentivo aos atletas", diz o dirigente.
Lágrimas
Quando o projeto olímpico foi lançado em 2011, Larri Passos chegou a chorar de alegria durante a coletiva de imprensa que anunciou a iniciativa. "Nós precisamos dar tranquilidade para esse jogadores, o que nunca teve", afirmou entre lágrimas na ocasião. "Antes a gente tinha que jogar hoje para comer amanhã. É o coroamento de um esforço, eu podia só tirar os louros por ter feito o número 1 do mundo. Os técnicos me veem passando e me chamam de louco", complementou o ex-treinador de Guga. Larri possui um centro de treinamento em Santa Catarina onde os atletas escolhidos para participar do programa treinavam.
Procurado pelo UOL Esporte para falar sobre o fim do projeto, o supervisor técnico preferiu não comentar o assunto. Através de sua assessoria de imprensa, pelo telefone, Passos afirma que não tem nada a dizer sobre o fim do projeto. Afirma que, enquanto vigorou o convênio, as instalações de seu centro foram utilizadas e o treinamento aos atletas, aplicado. Guga e os outros atletas envolvidos não foram localizados pela reportagem para falar sobre o assunto.
No dia 6 de fevereiro, o UOL Esporte revelou outra suspeita de mau uso ou desvio de dinheiro público por parte da CBT: a entidade usou notas frias na prestação de contas sobre a organização do Grand Champions Brasil, em 2011.
Atletas promissores
Os tenistas Thomaz Bellucci, André Sá, Bruno Soares e Marcelo Melo, que participaram dos jogos de Londres em 2012, não fizeram parte do projeto olímpico de tênis. De acordo com a CBT, eles são apoiados com os recursos do patrocínio dos Correios à entidade.
Na lista do Projeto Rio 2016 foram contemplados tenistas como Tiago Fernandes (campeão do Australian Open juvenil em 2010), Guilherme Clezar (vice-campeão de duplas de Roland Garros juvenil em 2009), Thiago Monteiro (número 2 do mundo juvenil em janeiro de 2012), Beatriz Haddad Maia (vice-campeã de duplas de Roland Garros juvenil em 2012) e Bruno Sant’Anna (ex-top 20 do ranking mundial juvenil), entre outros.
Segundo a CBT, estes tenistas foram selecionados com base no desempenho e análise de um corpo técnico formado por Gustavo Kuerten, Larri Passos, Patricio Arnold e João Zwetsch. De acordo com a entidade, todos os atletas citados progrediram nos rankings mundiais durante o projeto e possuem chances reais de conseguirem vagas nos jogos de 2016.
CBT envia comunicado; leia íntegra
Sobre o Projeto Olímpico Rio 2016, a Confederação Brasileira de Tênis esclarece que:
O Projeto Olímpico Rio 2016 foi assinado com duração de um ano e efetivamente teve a duração de um ano. O que ocorreu foi a verificação na prestação de contas da falta de flexibilidade para mudanças no decorrer da execução do mesmo, pois como foi conferido na prática, os atletas precisaram modificar as suas programações de treinamentos, as competições que participariam, as datas em que viajariam, o tempo que permaneceriam em determinados lugares, os locais onde ficariam hospedados, situações essas que foram comprovadas pela CBT na prestação de contas que já foi realizada. Projetos com o mesmo mecanismo do Projeto Olímpico Rio 2016 não poderão ser feitos, por falta de flexibilidade na adequação da realidade da modalidade tênis. A CBT possui dois novos projetos, o Medalha Olímpica e o Rede Nacional, já pensados para a realidade operacional do tênis, que dependem exclusivamente de aprovação do Ministério do Esporte;
Importante salientar que a CGU, após fiscalização por uma semana na sede da CBT e avaliação de documentos e prestações de contas, emitiu um parecer técnico, intitulado de Relatório de Demandas Especiais, especificamente sobre o Projeto Olímpico Rio 2016. A conclusão do parecer do CGU em relação ao inquérito de investigação conclui que há "FALHAS sem danos ao erário". A conclusão é clara: não há em nenhum momento dano ao erário, ou seja, aos cofres públicos.
Todas as falhas dizem respeito à falta de conhecimento da fiscalização vigente sobre a realidade da modalidade. No caso da emissão de passagens, por exemplo, considerada uma falha na prestação de contas, explicamos: um tenista de alto rendimento, quando perde em alguma das rodadas de um torneio, já decide se vai participar de outro torneio em seguida ou se retorna ao Brasil para treinamento. Ele jamais fica parado esperando um torneio terminar, se ele já se desclassificou naquele torneio. Por isso as passagens não podem ser 100% planejadas com antecedência e sofrem alterações frequentes. Elas dependem diretamente do resultado dos atletas em cada torneio.
Em razão de um ex-dirigente da entidade ingressar com uma maldosa denúncia em diferentes órgãos federais (Ministério Público Federal, Ministério do Esporte e Tribunal de Contas da União) e como, por cautela, estes entes públicos possuem o dever de investigar todas as acusações que recebem, foram instaurados procedimentos administrativos. A CBT já prestou todos os esclarecimentos sobre as acusações que foram equivocadamente lançadas e aguarda a conclusão dos procedimentos supra citados;
Por fim, a CBT não fornece qualquer espécie de apoio financeiro ao Guga. Aliás, cabe ressaltar que o Guga por inúmeras vezes atendeu os pedidos da CBT e participou de maneira voluntária (sem cobrança de qualquer contrapartida financeira) de eventos e treinamentos com atletas brasileiros, de todas as idades, inclusive com as equipes que participaram da Copa Davis, não sendo justo que notícias inverídicas ao seu respeito sejam veiculadas na imprensa;
Replicamos as importantes considerações de dois importantes profissionais do nosso esporte sobre esta lamentável realidade.
"O término do projeto Rio Tênis 2016 causou-me uma extrema desilusão. Foi a primeira vez na história do Tênis Brasileiro que se formou uma equipe nacional de treinadores e jogadores, juvenis e profissionais, com uma safra excelente de tenistas, num momento oportuno, obtendo resultados imediatos e relevantes. Além disso, a oportunidade de envolver o Larri nesse processo era uma chance de futuramente transformar a realidade do Tênis Brasileiro num novo patamar de conquistas. É decepcionante que um projeto desse porte, elaborado para um período de 5 a10 anos, acabe em menos de um ano. Essa iniciativa representava um momento único, uma oportunidade incrível para o nosso tênis, uma ideia que parecia até um sonho, e que na realidade não passou muito disso. O fim do projeto é um verdadeiro banho de água fria e uma frustração enorme para mim e para quem torce pelo tênis e esporte brasileiro", lamentou Gustavo Kuerten, integrante do projeto Olímpico Rio 2016.
"Acreditei e apostei num projeto que visava dar tranquilidade e qualidade de treinamentos aos jogadores. Quem esteve comigo e me viu nos torneios sabe o quanto eu me dediquei de corpo e alma para melhorar as condições dos jogadores que trabalharam comigo e em minha academia. Cumpri a minha missão para qual fui chamado. O projeto olímpico encerrou um ciclo", falou Larri Passos, também integrante do projeto.
*Atualizada em 04/04/2013, às 17h53
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