Larri desmente CBT e aumenta suspeita sobre projeto olímpico
Ex-coordenador do "Projeto Olímpico de Tênis Rio 2016", o técnico Larri Passos afirma que treinou apenas oito tenistas em seu CT (Centro de Treinamento) no programa da CBT (Confederação Brasileira de Tênis), que captou R$ 2 milhões junto ao governo federal para treinar 14 atletas no local. Já a entidade afirma, em sua prestação de contas ao Ministério do Esporte, que os 14 tenistas participaram do projeto olímpico e que deve ter "havido um equívoco" de Larri.
As versões conflitantes trazem mais suspeitas sobre o convênio, que teve duração de um ano e deixou de ser renovado ou substituído por outro de igual alcance por suspeitas de irregularidades, conforme revelou o UOL Esporte.
Além da diferença no número de atletas contemplados, o Ministério Público Federal e a Polícia Federal investigam indícios de irregularidades e desvio de verbas públicas que teriam ocorrido na aquisição das passagens aéreas utilizadas pelos atletas em treinamento e na concorrência feita para a escolha do CT de Larri Passos, que serviu ao projeto, entre outras suspeitas.
Financiado com recursos do Ministério do Esporte em seu primeiro ano, o projeto olímpico foi cancelado quase quatro anos antes das Olimpíadas. Idealizado pelo maior campeão do tênis brasileiro, Gustavo Kuerten, o Guga, e com supervisão técnica de Larri Passos, o programa foi lançado em agosto de 2011 com grande repercussão, mas duspenso um ano depois, em agosto de 2012. Guga apenas emprestou seu prestígio e seu nome, e não participou do dia a dia da equipe olímpica, dizem todos os envolvidos no caso.
Já Larri Passos recebeu um salário mensal, segundo prestação de contas da CBT, de R$ 30 mil. Além disso, seu CT (Larri Passos Tênis Pro) foi contratado por R$ 130 mil para receber os atletas em treinamento. "A minha academia atendeu e deu suporte de treinamento e infraestrutura para oito tenistas do Projeto Olímpico: Thiago Monteiro, Tiago Fernandes, Bia Haddad, Rogério Silva, João Walendowsky, Silas Cerqueira (participava no início do Projeto), Ingrid Martins e Teliana Pereira", diz Larri, em nota enviada ao UOL Esporte. O Larri Passos Tênis Pro fica em Camboriú (SC).
"Deixei as portas abertas para os tenistas brasileiros. Em agosto de 2012, quando o projeto finalizou, fiquei sem aporte financeiro e 'herdei' a equipe olímpica. Alguns tenistas não tinham como pagar para treinar em minha academia. Mesmo assim, mantive a mesma rotina de treinamentos com eles até o final do ano, sem receber um centavo", desabafa ainda o ex-treinador de Guga, que participa de uma turnê por campeonatos na Europa com a tenista Bia Haddad e retorna ao Brasil apenas em julho.
Em fevereiro de 2012, seis meses após o início do projeto olímpico, segundo análise nas contas do convênio feita pela CGU (Controladoria Geral da União) a que o UOL Esporte teve acesso mostrava, apenas sete tenistas treinavam no projeto. Apesar disso, a CBT afirmou por meio de nota, na semana passada, ao UOL Esporte: "Os 14 atletas inicialmente planejados para serem contemplados no projeto foram atendidos desde o início do mesmo".
De acordo com a entidade, o que ocorreu na época da fiscalização da CGU foi um problema técnico. A explicação da entidade: os termos de compromisso dos atletas com o projeto não estavam na sede física da CBT quando a CGU solicitou esses documentos. "A comprovação (da presença dos atletas no projeto olímpico) se dá pela participação dos mesmos nos torneios, o que foi devidamente demonstrado pela CBT" argumenta a confederação.
Na última segunda-feira, porém, confrontada com a afirmação categórica da Larri Passos sobre a participação de apenas oito atletas no CT, a CBT informou algo que não havia mencionado até então na descrição do projeto, na prestação de contas à CGU ou nas notas e respostas ao UOL Esporte: os seis atletas que Larri não se recorda de terem frequentado seu CT, na realidade, teriam treinado em outros lugares, ou seja, fora do centro de treinamento contratado para este fim. A entidade não explica se esses outros locais de treinamento representaram custo adicional ou o motivo desta informação não ter sido trazida à luz até Larri Passos contar que treinou apenas oito atletas.
"Primeiramente, é preciso deixar claro que o Larri Passos não era apenas um treinador do Projeto Olímpico, e sim um coordenador geral onde também participava um comitê de treinadores composto por João Zwetsch, Patricio Arnold, Roberto Carvalho e Marcus Vinicius Barbosa. Mesmo os tenistas que não treinaram full-time no Centro de Treinamento Larri Passos tiveram acompanhamento dos técnicos do projeto, que por sua vez foram coordenados por Larri Passos", tenta explicar a assessoria de imprensa da CBT.
Como Larri Passos pode desconhecer a existência de atletas na equipe que ele mesmo comandava, mesmo que não passassem o tempo todo no CT, é uma situação que pode ser explicada, segundo a CBT, por um lapso de memória de Larri, que teria se "equivocado e esquecido" os nomes (e as presenças) de alguns tenistas.
De acordo com a CBT, os tenistas que não treinaram no CT de Larri estavam em atividade em outros locais. Os atletas João Acioly e Cristian Lindell teriam treinado pelo projeto olímpico em um CT no Rio de Janeiro, Bruno Santanna em Itajaí (SC), Ana Clara Duarte em Porto Alegre, Guilherme Clezar em São Leopoldo (RS) e João Pedro Sorgi em Ribeirão Preto (SP). A reportagem não conseguiu entrar em contato com os atletas nesta segunda-feira e nem no final da semana passada. A CBT informa ainda que os tenistas Christian Lindell e Teliana Pereira saíram durante o projeto, quando foram substituídos por Bruno Sant’Anna e Vivian Segnini.
Escolha de CT sob suspeita
Guga e Larri lamentam encerramento de projeto
Guga e Larri Passos manifestaram frustração e desapontamento quando o encerramento do projeto olímpico foi revelado, no início deste ano. O projeto havia acabado em agosto de 2012, mas ninguém havia falado sobre o assunto até a revelação do UOL Esporte.
"Acreditei e apostei num projeto que visava dar tranquilidade e qualidade de treinamentos aos jogadores. Quem esteve comigo e me viu nos torneios sabe o quanto eu me dediquei de corpo e alma para melhorar as condições dos jogadores que trabalharam comigo e em minha academia. Cumpri a minha missão para qual fui chamado. O projeto olímpico encerrou um ciclo", afirmou o coordenador técnico no início deste ano.
"O término do projeto Rio Tênis 2016 causou-me uma extrema desilusão. Foi a primeira vez na história do Tênis Brasileiro que se formou uma equipe nacional de treinadores e jogadores, juvenis e profissionais, com uma safra excelente de tenistas, num momento oportuno, obtendo resultados imediatos e relevantes", disse Guga.
"Além disso, a oportunidade de envolver o Larri nesse processo era uma chance de futuramente transformar a realidade do Tênis Brasileiro num novo patamar de conquistas. É decepcionante que um projeto desse porte, elaborado para um período de 5 a10 anos, acabe em menos de um ano. Essa iniciativa representava um momento único, uma oportunidade incrível para o nosso tênis, uma ideia que parecia até um sonho, e que na realidade não passou muito disso. O fim do projeto é um verdadeiro banho de água fria e uma frustração enorme para mim e para quem torce pelo tênis e esporte brasileiro", lamentou o ex-número 1 do tênis na ocasião.
Considerando as explicações da CBT, resta entender o motivo para a descentralização no treinamento da equipe olímpica de tênis brasileira, já que o projeto previa uma sede centralizada no Larri Passos Tênis Pro, contratado por R$ 130 mil naquele ano para este fim. O projeto previa, inclusive, verba para aluguel de casas ou apartamentos para que tenistas de fora de Camboriú pudessem se mudar para lá durante os treinamentos.
Em prestação de contas preliminar feita no início de 2012, a CBT teve que explicar à CGU o motivo de não ter alugado esses apartamentos, já que havia pleiteado e obtido verbas públicas para este fim. A entidade poderia ter alegado o que alega agora - que seis dos 14 tenistas estavam treinando em outras localidades, mas não o fez.
A explicação da entidade foi que o projeto atrasou, tendo começado só em agosto, quando deveria ter tido início em maio de 2012. Por causa disso, todos os 14 atletas já ocupavam os imóveis, que tinham sido alugados em maio pela CBT. "Com o atraso no início do projeto, os atletas já haviam ocupado os imóveis desde o mês de maio e os contratos já estavam em andamento, não podendo serem inseridos no projeto, conforme planejado anteriormente", diz nota da CBT enviada ao UOL Esporte antes de a entidade tomar conhecimento das declarações de Larri Passos sobre a frequência de apenas oito atletas no CT.
Após denúncias de um ex-dirigente, diversos projetos da CBT com dinheiro público e privado são investigados pela PF (Polícia Federal), MPF (Ministério Público Federal), TCU (Tribunal de Contas da União) e CGU. Os convênios da entidade com o Ministério do Esporte estão suspensos. A CBT alega ser vitima de perseguição por um grupo de oposição ao atual presidente da entidade, Jorge Lacerda.
Há indícios de irregularidades na forma como foi feita a escolha do local para os treinamentos da equipe olímpica, o CT Larri Passos Tênis Pro, de propriedade do coordenador técnico da equipe.
Participaram da "concorrência" para a escolha do local, além do CT de Larri (que ofereceu o menor orçamento), apenas dois outros locais: um clube que informava o CNPJ de uma empresa de ramo diverso (atividades náuticas) no interior do Paraná, e um outro que possuía em seu quadro de diretores um dos dirigentes da CBT.
A situação contraria o que é previsto em lei e nas regras para o convênio: "adotar, na contratação de serviços ou aquisição de bens vinculados à execução deste convênio, os procedimentos estipulados para a licitação na modalidade pregão eletrônico, o que, se inviável, deverá ser devidamente justificado pelo dirigente ou autoridade competente e, nesse caso, adotar-se-á o pregão presencial".
Ao invés de realizar um pregão eletrônico, onde qualquer clube ou instituição esportiva poderia concorrer a ser sede de treinamento da equipe olímpica de tênis brasileira, a CBT achou por bem executar uma concorrência por carta-convite, convidando ao certame quem julgou conveniente.
Apesar disso, a CBT entende não haver irregularidades no processo. A confederação afirma que buscou "diversas propostas", ainda que informe, na prestação de contas, ter realizado uma concorrência com apenas três competidores, sendo um deles desclassificado por trazer membro da diretoria da própria CBT entre seus proprietários e o outro por informar um CNPJ incorreto.
Sobre a mesma questão, Larri Passos pondera: "Fui nomeado pela Confederação Brasileira de Tênis para contribuir com o desenvolvimento do tênis brasileiro por conta da minha comprovada experiência e reconhecimento profissional. Se alguém participou ou não da concorrência, em nenhum momento tomei conhecimento disso. Não me envolvi na administração do Projeto Olímpico. Minhas obrigações eram outras: exclusivamente técnicas".
"O meu Centro de Treinamento (Larri Passos Tênis Pro) foi indicado como a referência e sede dos locais dos treinamentos, uma vez que muitos tenistas, considerados promessas olímpicas, já treinavam ali, como Thiago Monteiro, Tiago Fernandes, João Walendowsky, Bia Haddad, Silas Cerqueira e Rogério Silva. Também não tive acesso e nem conhecimento das outras propostas", completa o técnico.
Procurado pela reportagem, o Ministério do Esporte afirma que a prestação de contas sobre o projeto segue sob análise. "Quando a análise for encerrada, será emitido parecer conclusivo", informa a pasta, através de sua assessoria de imprensa.
O TCU, também através de sua assessoria de imprensa, afirma que o caso corre sob segredo de Justiça, e que não pode revelar nenhuma informação sobre a análise desta prestação de contas.
* Atualizado às 17h51.
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