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Maior potência do Brasil abre mão de olímpicos e usa Rio-16 para explicar cortes

Judoca Carlos Honorato em ação nos Jogos de Atenas; ele não renovou com o clube - AFP
Judoca Carlos Honorato em ação nos Jogos de Atenas; ele não renovou com o clube Imagem: AFP

Rodrigo Farah

Em São Paulo

25/02/2011 06h28

São Caetano do Sul se consolidou ao longo da década como a maior potência esportiva do Brasil. Apoiada por grandes investimentos, a cidade abrigou fatia considerável das equipes olímpicas do país nos últimos anos. Mas esta história deve mudar a partir de Londres-2012. Com orçamento reduzido, o município cortou ou diminuiu o subsídio de uma série de atletas de ponta no início da temporada. Ao mesmo tempo, a prefeitura justificou a aposta sem custo nas categorias de base como responsável pela repaginada na estrutura das modalidades.

“Cortamos uma verba do esporte e isso gerou uma repercussão negativa para nós, mas já é passado. Foi apenas uma reestruturação administrativa que toda cidade ou empresa às vezes é obrigada a passar”, afirmou o prefeito José Auricchio Júnior ao ser questionado pela reportagem do UOL Esporte.

Ao todo, São Caetano do Sul contava com investimento anual próximo dos R$ 9 milhões voltados para o esporte. De acordo com Auricchio Júnior, a cidade precisou diminuir os gastos gerais em 2011, e o orçamento das modalidades de alto rendimento sentiu o baque - o pouco mais de R$ 1 milhão voltado para a área foi cortado pela prefeitura no fim de janeiro.

Tal fato gerou a premissa de uma verdadeira debandada de atletas. No total, 720 dos 986 esportistas do alto rendimento que defendiam a cidade não tiveram seus contratos renovados no primeiro instante. Após uma repercussão negativa pelo ocorrido, a prefeitura mudou a postura e correu atrás da recontratação de boa parte desses atletas.

Surpreendidos pela notícia dada no fim janeiro, os esportistas não tiveram muitas opções além de aceitar a nova proposta feita pela prefeitura – grande parte das outras cidades ou clubes já havia fechado o elenco para a temporada. Desta forma, os atletas tiveram que aceitar a diminuição do salário – São Caetano anunciou a recontratação de 600 nomes. 

COB SE CALA SOBRE O TEMA

Procurado pela reportagem do UOL Esporte, o Comitê Olímpico Brasileiro não quis se pronunciar e disse por meio de assessoria que não tinha nada a comentar sobre as mudanças feitas por São Caetano no alto rendimento.

A prefeitura também disse que em nenhum momento foi contatada pelo COB para comentar o caso.

"O COB não nos procurou em nenhum instante. Nem para debater o corte dos atletas, para reclamar, para nada. É como se eles não se importassem", reclamou o secretário de esportes Mauro Chekin.

Alguns tiveram os ganhos reduzidos pela metade. Outros, como o campeão dos Jogos Pan-Americanos no taekwondo Diogo Silva, teve o salário cortado integralmente. “Ainda oferecemos uma ótima estrutura, com acompanhamento médico e centro de treinamento. Por isso, muitos continuaram conosco”, comentou o secretário de esportes, Mauro Chekin, antes de revelar que alguns nomes foram exceção à regra e contaram com aumento no salário.

Mas a verdade é que já existem atletas que visualizam São Caetano meramente como um trampolim para transferências no início de 2012, antes dos Jogos Olímpicos de Londres. “Não tivemos tempo de procurar outro lugar. Era aceitar ou ficar parado”, afirmou um dos esportistas recontratados com o salário pela metade, que preferiu manter o anonimato.

Além disso, outras modalidades foram simplesmente canceladas pela prefeitura. É o caso do boxe e do handebol. Atletas de seleção como o pugilista Paulo Carvalho não foram recontratados por opção da prefeitura. “O que eles fizeram não existe. Ficam procurando desculpas para se justificar, mas pegaram todos os atletas de surpresa. Ninguém esperava essa decisão”, ponderou o medalhista olímpico Servílio de Oliveira, que gerencia a carreira dos boxeadores dispensados. 

Vice-campeão olímpico em Sydney-2000, Carlos Honorato também não renovou o contrato, mesmo com a permanência do judô no quadro esportivo de São Caetano. “Achei melhor procurar outro rumo. Não penso mais em competir pela seleção, mas tenho grande interesse em continuar disputando os campeonatos regionais”, ressaltou o judoca.

SÃO CAETANO: FIM DA MÁQUINA DE CAMPEÕES

  • Folhapress

    Com esquadras de primeira linha em quase todas as modalidades olímpicas, São Caetano virou o maior polo esportivo do Brasil. Para se ter uma ideia, a cidade faturou o título geral em 13 dos últimos 14 Jogos Abertos do Interior.

    A competição é o principal torneio de cidades e maior foco dos munícipios de São Paulo em relação ao esporte. Porém, São Caetano já se prepara para dar adeus à hegemonia no campeonato com a diminuição dos investimentos.

    "Não podíamos ganhar sempre. Vai ser mais gostoso participar dos Jogos daqui para frente, pois a disputa será mais acirrada com certeza", ironizou o secretário de esportes.

A mudança no alto rendimento de São Caetano não está ligada somente ao corte no orçamento. Segundo a prefeitura, ela faz parte de uma reestruturação no esporte da cidade, que atuará principalmente como formadora de atletas.

Na última quinta-feira, José Auricchio Júnior lançou oficialmente o Centro de Detecção de Talentos, que tem como objetivo selecionar promessas do esporte entre 8 e 17 anos nas escolas da cidade para iniciar o treinamento com elas. Segundo o político, os gastos serão irrisórios, pois o programa terá parceria da Universidade Municipal de São Caetano e aproveitará a estrura já montada pelo município.

Além disso, a prefeitura tem outras duas parcerias voltadas para as categorias de base de basquete e vôlei. Nestes casos, a cidade conta com o apoio da Confederação Brasileira de Basquete e do Governo do Estado de São Paulo, além de outros patrocinadores.

“A questão orçamentária não foi o fator exclusivo que nos levou a essa decisão [corte e diminuição de salários]. Mudamos o modelo da cidade para um projeto de renovação, de olho no futuro. Era hora de renovar e queremos um projeto olímpico voltado para Rio 2016”, declarou Auricchio Júnior.

O curioso é que a prefeitura e a Secretaria de Esportes já esperam colher frutos a tempo das Olimpíadas no Rio de Janeiro. Para isso acontecer, os atletas teriam que ser selecionados na escola e realizar um treinamento intensivo para conquistar o nível olímpico a tempo de se classificarem. Tudo isso em até cinco anos.“

"É possível, se o menino tiver talento. É possível transformá-lo em um atleta olímpico com cinco anos de treinamentos”, defendeu o secretário de esportes.

“São Caetano não pode esquecer dos atletas que a fizeram chegar até onde está hoje. É importante investir e apostar na base, mas existem outros atletas que têm história na cidade que não podem ser esquecidos, como eu e o Carlos Honorato”, afirmou a judoca Edinanci Silva, que renovou contrato com a cidade mesmo após ter o salário reduzido.