Psicólogos debatem 'freguesia' de Real e Federer contra maiores rivais e veem bloqueio mental
O mês de janeiro reforçou a tendência de resultados em duas das maiores rivalidades da atualidade. Rafael Nadal eliminou Roger Federer na semifinal do Aberto da Austrália de tênis, enquanto que o Barcelona passou pelo Real Madrid nas quartas de final da Copa do Rei da Espanha, em episódios que fazem do tenista suíço e do time do técnico José Mourinho os grandes "fregueses" de hoje em dia no universo esportivo de alto rendimento.
Mas como explicar o desequilíbrio de placares entre dois atletas de mesmo nível de excelência e entre equipes que teoricamente habitam o mesmo patamar técnico? A reportagem do UOL Esporte ouviu profissionais brasileiros da psicologia do esporte sobre o tema e recolheu impressões que fazem crer que o desempate em confrontos tão iguais como estes pode passar por dentro das cabeças destes personagens.
"É mais comum do que a gente pensa. Em determinados confrontos no esporte se cria uma história de derrotas que é difícil de cortar. No vôlei, antigamente, a seleção brasileira [feminina] não conseguia ganhar contra a Rússia. Não ganhava de jeito nenhum. Esses atletas carregam isso para dentro da quadra. É uma memória afetiva das situações de derrotas anteriores", opina Regina Brandão, psicóloga que trabalhou com a seleção pentacampeã de 2002 e com times de Felipão, Tite e Caio Jr.
REAL MADRID vs. BARCELONA: DERROTAS E "PITIS" DE MOURINHO
Desde que Mourinho assumiu o Real Madrid em 2010, chegando ao clube com o selo de técnico campeão europeu vigente, pela Internazionale, a equipe da capital espanhola enfrentou seu maior rival em dez oportunidades. Deste total, foram cinco vitórias do Barcelona [incluindo um 5 a 0 em casa e três êxitos no Santiago Bernabéu], quatro empates e apenas um triunfo dos "merengues".
Mas a análise se torna mais desequilibrada quando se vai além dos placares, em busca das consequências deles em competições. O Real Madrid conseguiu derrotar o Barça na final da Copa do Rei 2011, na prorrogação, mas depois disso foi batido pelo adversário em quatro outros torneios: Campeonato Espanhol, Liga dos Campeões, Supercopa da Espanha e Copa do Rei 2012.
OS NERVOSINHOS DO REAL MADRID
JOSÉ MOURINHO: Foi suspenso após agredir o auxiliar do Barcelona com uma "dedada" no olho, na Supercopa da Espanha de 2011. Neste ano, em jogo da Copa do Rei, criticou a arbitragem e se dirigiu à garagem do estádio para tirar satisfação do juiz da partida. "O Mourinho contamina o time para o bem e para o mau", diz o psicólogo Rodrigo Scialfa Falcão. | PEPE: Foi expulso na Liga dos Campeões 2011 após entrada em Daniel Alves. Em outro jogo, partiu para intimidar Messi. Por fim, virou alvo de polêmica após pisar na mão do argentino, em jogo pela Copa do Rei deste ano. "O Pepe é um cara que talvez não consiga lidar com essa pressão tão bem", comenta o psicólogo Rodrigo Scialfa Falcão. |
Depois do último embate entre as equipes em janeiro passado, com o triunfo do Barcelona sobre o Real nas quartas de final da Copa do Rei, a equipe de Messi já soma sete jogos de invencibilidade diante dos rivais de Madri.
Em todo este retrospecto favorável aos catalães, o Madrid ainda coleciona vexames individuais, como em jogadas violentas do brasileiro naturalizado português Pepe ou em atitudes destemperadas do técnico José Mourinho, seja em direção à arbitragem ou ao próprio adversário.
"O Pepe é um cara que talvez não consiga lidar com essa pressão tão bem. Comete faltas mais violentas, merecia ter sido expulso em alguns jogos. Alguns jogadores sentem mais, outros menos", comenta Rodrigo Scialfa Falcão, que trabalha em projetos de rúgbi e tênis e mantém um blog sobre a psicologia no esporte.
"Existem situações que apontam a necessidade do trabalho psicológico, em que essa questão é solicitada. Se um atleta ou treinador vai questionar a arbitragem, isso significa que ele não está totalmente concentrado naquilo que precisar fazer", diz Suzy Fleury, que fez trabalho com a seleção na época de Vanderlei Luxemburgo e em grandes clubes do país como Corinthians, Palmeiras e Santos.
Mas mesmo com tudo isso, o universo do futebol parece ainda entender que o Real Madrid segue como o time no planeta mais próximo de ameaçar o poderoso Barça de Pep Guardiola, tratado por muita gente como o melhor da história. Tanto que, apesar da derrota no confronto direito, a equipe de Mourinho atualmente lidera o Campeonato Espanhol sete pontos na frente dos rivais [resta um clássico até o final da liga].
FEDERER vs. NADAL: LÁGRIMAS E INFERIORIDADE ALÉM DO SAIBRO
Roger Federer e Rafael Nadal são os maiores jogadores de seu tempo e certamente estão entre os grandes da história. No entanto, apesar de os dois viverem seu auge em momentos simultâneos dentro do circuito profissional, o espanhol domina completamente o retrospecto de enfrentamentos diante do suíço.
Hoje, o placar do embate aponta para o dobro de vitórias de Nadal: 18 a 9. A supremacia do tenista de Mallorca é mais aguda especificamente nos duelos em torneios de Grand Slam, os principais do circuito, com 8 triunfos contra 2 do adversário. Dos últimos dez jogos, o espanhol saiu vencedor de quadra em sete.
VELHA E NOVA FREGUESIA
Rafael Nadal tem supremacia sobre Roger Federer: sete vitórias a três nos últimos dez confrontos
Nadal saiu de quadra derrotado nos últimos sete jogos contra o número 1 do mundo Djokovic
Assim, por mais que soe contraditório, Federer escreveu uma história de inferioridade no embate direto com o seu maior adversário no circuito ao mesmo tempo em que construía seu impressionante recorde de títulos em Grand Slam (16 taças) e a consequente reputação de melhor de todos os tempos.
A cena mais emblemática da inferioridade de Federer nesta rivalidade aconteceu na final da Austrália de 2009, quando o suíço caiu no choro após perder para Nadal. "Deus, isso está me matando", desabafou o tenista na cerimônia de premiação, contendo as lágrimas, diante de microfones e de 15 mil pessoas na Arena Rod Laver.
"No tênis, quando essas séries acontecem, às vezes as derrotas acontecem pelo mesmo placar, contra os mesmos adversários", destaca a psicóloga Regina Brandão, sobre a sina em embates específicos.
Quem de alguma forma acompanha a história deste confronto interpreta que existe algum fator psicológico envolvido na supremacia de "Rafa" sobre o maior vencedor de títulos Grand Slam, não importa em qual superfície, até mesmo na grama onde Federer costumava reinar absoluto. No entanto, nos últimos tempos parece que também o espanhol ganhou uma espécie de "Nadal próprio".
Desde 2011 Novak Djokovic quebrou a sequência vencedora da dupla Federer-Nadal no circuito, passou a ser o número 1 do mundo e, de quebra, virou a maior frustração no caminho do espanhol. Neste período, são sete vitórias do tenista sérvio sobre o canhoto de Mallorca, três delas em partidas de Grand Slam (no geral o placar ainda aponta 16 a 14 a favor do ex-líder da ATP).
MELIGENI: PSICÓLOGO DAS QUADRAS MESMO SEM DIPLOMA NA PAREDE
O brasileiro Fernando Meligeni não tem diploma de psicologia pendurado na parede, mas conhece como poucos as questões mentais vividas dentro de quadra. O blogueiro do UOL Esporte relativiza um possível bloqueio mental de Federer, mas avalia que tecnicamente o jogo do suíço não encaixa com o estilo de Nadal.
NÚMEROS DE NADAL x FEDERER
CONFRONTO DIRETO | 18 vitórias a 9 a favor de Rafael Nadal |
DUELOS EM TORNEIOS DE GRAND SLAM | 8 vitórias a 2 a favor de Rafael Nadal |
ÚLTIMOS DEZ JOGOS | 7 vitórias a 3 a favor de Rafael Nadal |
"Sempre tem psicológico, o tênis é psicológico. No nível em que esses caras jogam, não é mais apenas técnico. Entra o lado psicológico, a fase de cada um deles. Teve a fase do Federer, a fase do Nadal e agora estamos vivendo a fase do Djokovic. Tudo dá certo para o cara. Vai para um 5 a 5 no quinto set, e a bola vai para ele. É pelo excesso de confiança que tem", afirma Fernando Meligeni.
"O jogo não encaixa para o Federer. O Nadal é o rival mais complicado para o Federer. Mas ele não deixa de ser o melhor de todos os tempos por causa disso", acrescenta.
De toda sua vivência no circuito profissional, Meligeni cita o duelo entre os norte-americanos Pete Sampras e Andre Agassi como um caso semelhante de desequilíbrio entre "monstros" teoricamente no mesmo degrau de talento.
"O que existe de mais próximo no passado é o confronto entre o Agassi e o Sampras. O Agassi tinha muita dificuldade, principalmente nos grandes campeonatos. E eles jogaram muitas finais [histórico total de 20 a 14 para Sampras]", recorda Meligeni.
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