Como brasileiro quer mudar a realidade amadora do futebol feminino do Peru
Amador, o futebol feminino peruano ainda é duro com as mulheres do país. A seleção principal que disputa os Jogos Pan-Americanos é composta por contadoras, professoras, trabalhadoras da área de logística, mães de família, universitárias... Treinar? Só depois do expediente.
O brasileiro Doriva Bueno assumiu o desafio de transformar o futebol feminino no Peru. Ele iniciou o trabalho no final de 2018, acredita que no futuro conseguirá formar jogadoras que possam seguir profissão no futebol, mas não esconde a realidade.
As atletas trabalham diariamente em seus empregos formais, têm formação universitária, filhos e quando são convocadas para os períodos de treinamentos com a seleção, deixam o trabalho direto para o Centro de Treinamento de Videna, em Lima, mesmo endereço dos jogadores do masculino. Não recebem dinheiro para isso, só um vale-transporte. Por volta de 20h começa o treino de Doriva, mas nem sempre é possível trabalhar no local destinado a elas.
"A gente tem um campo sintético, que não tem iluminação pra treinar à noite ainda. À noite é o único período que conseguimos juntá-las, porque precisam trabalhar. Muitas vezes por não ter a luz, precisa sair para outros campos. Às vezes demora mais de uma hora pra chegar no outro campo por causa do trânsito. O treinamento é das 20h às 22h. Só em sábado e domingo que treinamos na Videna, porque dá pra treinar de manhã e à tarde. O presidente prometeu as luzes pra gente e isso vai nos dar uma estrutura melhor de treinamento", contou Doriva ao UOL Esporte.
Doriva Bueno trabalhou no futebol masculino até 2015. Passou por Corinthians e XV de Jaú antes de comandar a seleção brasileira sub-20 feminina por quatro anos. Ele se ofereceu para trabalhar no Peru quando soube que havia uma vaga. Um desafio. O treinador se surpreendeu com o que viu. As atletas eram amadoras, comiam mal e não se cuidavam como quem compete em alto rendimento. Duas delas também precisam cuidar de filhos de 9 e 6 anos.
"Elas precisam treinar e se dedicar à casa, seleção. Imagine que foram mães aos 25 anos mais ou menos, idade que uma jogadora profissional está começando a jogar bem", analisou.
A ajuda de custo em seus clubes é pequena e treinam de 3 a 4 vezes por semana. "Tem uma dificuldade estrutural, mas eu estou tentando colocar uma forma de jogar, fazer com que entendam melhor o jogo. Melhorem a consciência como atleta, comportamento, parte física, se cuidar mais", disse.
A ofensa de Paco Bazán
O Pan de Lima é a maior competição já jogada pelas peruanas e começou com um terremoto. O ex-goleiro peruano Paco Bazán e atualmente apresentador da ATV atacou as jogadoras do seu país que competem no Pan de Lima e as mandando parar de reclamar e vencer. "Meu Deus, elas são uma lástima", falou. Doriva precisou assumir as rédeas e direcionar suas jogadoras após o episódio.
"Para nós não muda, porque na verdade o que a gente quer é que sejam reconhecidas. Elas querem que Lima saiba que existe uma seleção, que disputa competição da Conmebol e tem como ir pra mundiais. Eu não sei por que essa pessoa falou isso. Eu falo pra elas deixarem de lado e não se importarem o que as pessoas falam. Eu falo pra não entrarem em polêmica", ressaltou.
Não vencem no Peru desde 1996
Hoje a equipe terá a segunda oportunidade de vencer pela primeira vez em 23 anos no território peruano uma partida oficial. A partida será contra a Costa Rica, às 22h30 (de Brasília). O primeiro jogo foi 3 a 0 para a Argentina.
"Até outro dia tinha estatística era que não ganhava um jogo contra seleção desde 2006. Nós ganhamos da Bolívia e aí esse tabu foi quebrado. As pessoas se assustam de uma seleção não ganhar nem amistoso e ganhamos de 4 a 0. Falta praticar mais, sair da América do Sul, pegar equipes da Europa para que viverem dificuldades no dia a dia de jogo pra ter experiencia e que em jogo assim não se assuste. Elas ficam tristes por perder porque envolve família, tudo que querem mudar", completou.
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