Fisiculturismo estreia como esporte no Pan com direito a marmita do Brasil
Carla Lobo e Juscelino Santos vivem pela primeira vez a sensação de estar numa vila de atletas, onde ficam as delegações de todos os países participantes dos Jogos Pan-Americanos de Lima. Fisiculturistas, os dois formam a delegação brasileira que estreará o novo esporte do torneio amanhã (10) na competição. A presença nos jogos consolida para quem ainda tinha dúvidas que a modalidade é, sim, esporte.
Carla, 48, e Juscelino, 46, aproveitam para curtir o sonho de conviver com atletas olímpicos, mas sem tirar o foco do próprio objetivo, uma medalha. Para isso, treinos pesados e alimentação balanceada. Tão balanceada que os dois trouxeram um estoque próprio do Brasil.
Juscelino um pouco menos, trouxe apenas para o primeiro dia, mas Carla, organizadíssima, vai logo explicando que na sua bagagem veio 600g de peito de frango e 800g de tilápia. "A gente tem um checklist, um treinador e nutricionista. Eu trouxe tilápia congelada e peito de frango porque nos restaurantes vem com o sal e a gente dosa o sal, a água. Geralmente eu venho com a minha panelinha de arroz e quando não tem a comida eu faço. Mas aqui temos o privilégio de termos. Algumas coisas acrescentamos apenas", explica Carla.
Os dois competirão amanhã (10), no penúltimo dia do Pan. Carla fará uma apresentação de 1min30 para demonstrar flexibilidade em uma coreografia e depois desfilará de biquíni para que os juízes avaliem a forma física. Juscelino posa para os árbitros avaliarem definição, volume e simetria.
Os dois atletas e o chefe de equipe Rafael Pinheiro se emocionam por trazer a modalidade para o Pan. É como se isso fosse a prova para quem diz que fisiculturismo não é esporte. "Eu sonho desde criança ser uma atleta olímpica. Eu me sinto uma atleta, eu sou uma atleta. Eu vivo o esporte. Estamos muito honrados porque somos muito discriminados pelos próprios colegas. Falam que seria impossível vir natural [sem doping], da gente conseguir. Ninguém sabe o apoio que Comitê Olímpico Brasil está dando pra gente. Tem a descrença. Fui tachada de velha e não atleta", lembra a fisiculturista que já foi ginasta e maratonista.
Carla compete como fisiculturista desde 2015 e se divide entre a rotina de personal trainer e mãe de três filhos. Juscelino também é pai e ainda trabalha à noite em um bar. "Sou um atleta que tem um bar. O que não falta é ovo!", brinca.
O chefe de equipe Rafael Pinheiro exalta os dois atletas. "O Pan é diferente de tudo que já participei. É uma competição olímpica oficial. Eu virei o treinador do Juscelino há um ano e pouco e ele vai entrar com o maior físico da vida dele. Como a Carla vai fazer bom trabalho. Estamos fazendo história e vamos fazer jus ao investimento".
Juscelino descobriu doença de chagas há 23 anos
Juscelino é um veterano do esporte e atleta há 30 anos. Os quase 20 títulos vieram com outro desafio: a doença de chagas. O atleta descobriu ser portador aos 23 anos e convive com a patologia sem cura.
A descoberta veio depois de tentar doar sangue em um hospital em São Paulo. Juscelino achou que nunca mais seria atleta.
"Eu nasci na Bahia e acho que fui picado por esse bichinho e coça. O protozoário entra na corrente sanguínea e fica circulando no corpo. Meu caso nunca se manifestou nos órgãos. Geralmente é coração, esôfago e pâncreas. Se a pessoa não fizer tratamento, os órgãos vão crescendo e tem problema", explica.
"No começo a cabeça fica biruta. Eu era recém-casado, não tem cura. E tive medo. Não sabem por que não se manifestou. Se é porque eu sempre tive vida saudável... Eu sou normal", ressalta Juscelino, que explica o doping no caso dele como algo impossível se ele quiser viver.
"Por isso que eu digo. Não tem como eu tomar nada. O meu médico fala que eu vou antecipar minha morte se eu tomar algo, vai ter complicações por causa da doença. Como vou usar algo? Eu não quero morrer", completa.
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