"Yesterday" da TV esportiva: E se o Galvão não existisse?
Em "Yesterday", novo filme em cartaz do diretor inglês Danny Boyle, ("Trainspotting", "Quem Quer Ser um Milionário"), um músico inexpressivo é atropelado por um ônibus no exato momento em que o mundo inteiro sofre um misterioso e repentino apagão. Ao sair do hospital, Jack Malik, personagem interpretado pelo britânico Himesh Patel, vai encontrar os amigos e começa a dedilhar os acordes do megahit composto por Paul McCartney que dá nome ao longa. Para espanto de Malik, nenhum dos seus amigos conhecia a música, um dos maiores sucessos dos Fab Four.
Intrigado, o músico faz o mesmo com outras canções do quarteto, igualmente ignoradas. Ao pesquisar no Google, Malik se dá conta que os Beatles simplesmente não existiram. Ele faz o mesmo com o Oasis, também sem sucesso — uma clara e irônica alfinetada de Boyle no grupo dos irmãos Gallagher, para muitos uma cópia desbotada dos garotos de Liverpool. O filme mexe com a imaginação e nos faz pensar como seria o mundo sem os ícones John, Paul, Jorge e Ringo.
No nosso universo de UOL Esporte Vê TV, a figura que mais se aproxima dos Beatles, guardadas as devidas e necessárias proporções, seria Galvão Bueno.
Então, como seriam as narrações esportivas sem o criador de bordões históricos como "Sai que é sua Taffarel", "É tetraaaa é tetraaaaa" e "Hajaaaa, Coração", entre tantos outros que fizeram a fama do principal nome da locução esportiva nas últimas décadas?
E se, a exemplo do músico do filme, colegas de ofício se "apropriassem" deles? Quem poderia assumir qual bordão?
Vamos viajar, então, com o "Yesterday" de Galvão Bueno.
"Bem Amigos da Rede Globo" (Luís Roberto)
Essa é fácil. Além de Galvão Bueno, só mesmo Luís Roberto seria capaz de criar esse bordão. Não há na TV brasileira um narrador tão simpático e gente boa quanto o primeiro nome da Globo no Rio de Janeiro. Às vezes ele até exagera e irrita na tentativa de ser o cara mais legal da turma. Passaria tranquilo pelo criador da expressão que virou até nome do programa que comanda desde 2003 nas noites de segunda-feira no SporTV.
"É tetraaaaaaaaa é tetraaaaaaaaaa é tetraaaaaaaa" (André Henning)
Esse se tornou o grito mais famoso da história recente da locução esportiva brasileira. É uma espécie de marca registrada do autor. Virou meme, piada, imitação, toque de celular. O próprio Galvão já disse que as brincadeiras e referências a ela são a maior homenagem que ele poderia receber. E olha que hoje ele até acha aquilo meio ridículo. Mas quando se pensa em narração com grito que nome imediatamente vem à cabeça? Quebre a primeira vidraça quem nunca imaginou o "é tetraaaaaa" na garganta de André Henning. É bem verdade que a estrela da TNT não é apenas grito. Mas grita. E bem!
"Pode isso, Arnaldo?" (Sílvio Luiz)
Arnaldo César Coelho foi um dos principais árbitros brasileiros nas décadas de 1970 e 80. O auge da carreira foi a final da Copa de 1982, entre Itália e Alemanha, na qual os carrascos da lendária seleção de Sócrates, Falcão e Zico conquistaram o tricampeonato mundial para a Squadra Azzura. Mas o que o fez famoso mesmo foi o célebre bordão criado por Galvão, sempre evocado a cada decisão polêmica da arbitragem em campo. Um dos mais antigos e criativos narradores brasileiros, Sílvio Luiz, foi juiz como Arnaldo. Uma expressão feita sob medida para o pai do "olho no lance. Ééééééé".
"Sai que é sua, Taffarel" (Gustavo Villani)
O goleiro costuma ser o grande vilão dos narradores. Até o surgimento do VAR, eles eram os únicos capazes de impedir o grande momento de um narrador em uma partida de futebol: o grito de gol. Isso até que Cláudio Taffarel virasse herói nacional nas disputas de pênalti contra a Itália na final da Copa do Mundo de 94. E muito da fama do ex-goleiro se deve a Galvão, que fez do "Sai que é sua, Taffarel" um de seus bordões mais célebres. O goleiro é também o personagem principal de uma das expressões mais conhecidas daquele que muitos apontam como o sucessor da estrela na Globo: Gustavo Villani. O "joga luva, goleirão" se tornou uma das marcas registradas da nova voz do esporte global.
"Virou passeio" (Cléber Machado)
Mesmo quem nunca viu uma corrida Fórmula 1 na vida já deve ter ouvido o fatídico e inesquecível "hoje não, hoje não. Hoje sim, hoje siiiimmm". Era Cleber Machado lamentando a ordem da Ferrari para que Rubens Barrichello trocasse de posição e desse a vitória do GP da Áustria de 2002 ao companheiro de equipe, o alemão Michael Schumacher. Foi uma espécie de 7 x 1 sobre rodas, numa referência à humilhação sofrida pelo Brasil para os compatriotas de Schumi na Copa de 2014. Duas inesquecíveis e tristes narrações que entraram para a história graças ao talento de Galvão e Cléber.
"Arytonnnn Sennnnaaaaa do Braaassillll" (João Guilherme)
Nada e nem ninguém é mais associado a Galvão Bueno que o piloto tricampeão morto no GP de San Marino de 1994. Com o passar dos anos, um parece ter se tornado sinônimo do outro. Cada vitória de Senna narrada por Galvão era acompanhada pelo indefectível "Tema da Vitória", música criada pelo maestro Eduardo Solto Neto para celebrar os triunfos dos pilotos brasileiros na F-1. Claramente inspirado em Galvão, João Guilherme pede "Toca a Música" a cada gol que narra na Fox. É a senha para que a emissora suba a musiquinha que embala os gritos de gol de Guilherme nos jogos dos times brasileiros na Libertadores.
"Eu já sabia, eu já sabia" (Regis Rösing)
Como tudo aqui é imaginação e viagem, abrimos espaço para uma "licença poética". Como todos sabem, Regis Rösing é repórter. Nunca narrou uma partida de futebol. Mas durante a carreira aprimorou um curioso dom. Rösing ficou famoso por "prever" os gols dos times nas reportagens de campo que fazia. Com isso passou a ser conhecido como o "profeta" ou o "bruxo da Globo". No GP do Japão de 1991, Galvão anunciou aos berros que sabia da intenção de Ayrton Senna de abrir passagem para Gerhard Berger e dar ao companheiro a vitória na prova em que conquistou seu tricampeonato mundial. Mas, ao contrário dos gols de Rösing, aquilo não teve nada de adivinhação. Galvão sabia da estratégia da McLaren e não contou isso aos espectadores. Pela omissão da informação ainda levou uma bronca do principal executivo da Globo na época, José Bonifácio Sobrinho, o Boni.
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