O que aprendemos no curso de técnicas de comunicação do Galvão Bueno?
O narrador esportivo e apresentador Galvão Bueno acaba de atacar em mais uma frente. Com 47 anos de carreira, o profissional estreia como professor ao ensinar técnicas de comunicação, em um curso em parceria com a Curseria, plataforma online de educação.
O UOL assistiu à primeira das 11 aulas do curso "O Jogo da Comunicação: Técnicas de Comunicação, Conexão com o Público e Persuasão". Na aula inaugural, que tem duração de 37 minutos, o narrador explica como se tornou um dos grandes profissionais da área no Brasil, passeia pela própria trajetória —de vida e profissional— e explica o nascimento de grandes bordões, como "Bem, amigos" e "Olha o que ele fez".
A primeira lição do "vendedor de emoções", como o próprio se autodenomina, é justamente equilibrar esse sentimento e a narração dos fatos. Ele chama esse ponto de "receita de bolo, a mistura de paixão, emoção, informação com entretenimento".
"Eu narro como se o torcedor estivesse do meu lado. Eu narro muito conversando com as pessoas do meu lado. Eu procuro narrar os acontecimentos, mas me meto nos comentários, discordo, concordo, opino. Sei que sou polêmico e sei que muitas vezes passo do ponto. Mas tudo faz parte da comunicação."
O esporte é basicamente emoção, drama, adrenalina —para quem atua ou para quem assiste—, e o narrador tem que passar esse clima para sua audiência. O narrador esportivo não pode só relatar friamente o acontecimento e nem gritar que nem um louco para comunicar com eficácia o que está acontecendo. É preciso construir uma história para que seu ouvinte entenda a importância e a urgência das coisas. É preciso vender tudo isso a partir da voz, da emoção. Nunca posso me imaginar mais importante que a imagem, mas também não posso me achar insignificante a ponto de ser dispensável."
Outra lição do "coach" Galvão Bueno é a importância da competitividade, mesmo fora das arenas esportivas. "Eu sou doentiamente competitivo. O ser humano é competitivo por natureza. Ser competitivo é uma das características do bom comunicador. Ser competitivo lhe faz querer ser o melhor, ter ao seu lado os melhores profissionais, buscar a excelência sempre".
E isso aprendeu sendo ele próprio um esportista. "Eu queria muito ser esportista. Eu fui esportista, sim, a vida inteira. E não importava a modalidade. Entre os 10 e 22 anos, eu joguei futebol, eu fiz atletismo, eu fiz natação, eu joguei handebol, joguei voleibol, joguei campeonatos brasileiros de vários esportes. Até no hipismo, me aventurei. Amo os cavalos, amo montar a cavalo até hoje. Mas eu me dei um pouquinho melhor mesmo no basquete. Eu fui profissional de basquete. Assim, meia-boca, né? Mas deu para ajudar a pagar a faculdade, comprar um carro, botar gasolina no carro. Eu disputei campeonatos, fui da seleção de Brasília durante muito tempo, juvenil, principal... Mas chega um momento que eu vi que ganhar a vida como jogador não ia dar. Então tinha que achar um caminho".
Esse caminho já estava sendo trilhado desde a mais tenra infância. Nascido em 1950, na Tijuca, bairro do Rio de Janeiro perto do Maracanã, ele diz que aprendeu a gritar "é campeão" com apenas cinco anos, levado pelos tios às arquibancadas do estádio. E justamente com esses parentes teve as primeiras experiências como "comunicador".
"O meu amor pelos esportes fazia a festa entre os meus tios. Nas brincadeiras em casa, meus tios me escalavam como comentarista para jogo de botão. E dizem que inventava, me posicionava na frente de qualquer bugiganga, que, para mim, seria um microfone e não parava de falar. E não parei até hoje. Estava ali o embrião do comunicador, do profissional que encontraria um jeito de ganhar a vida falando de esporte."
O DNA do comunicador e a estreia profissional
Filho da atriz Mildred dos Santos, uma das pioneiras da TV brasileira, e de Aldo Viana Galvão Bueno, que foi comentarista, narrador de futebol na era do rádio, diretor e produtor de TV, Galvão diz nasceu com "o DNA da comunicação".
Mas a estreia profissional só aconteceu em 1974, quando tinha 23 anos. Galvão, que já estava casado e aguardava a chegada da primeira filha, trabalhava como vendedor de embalagens plásticas para uma empresa de Santo André, na Grande São Paulo. Na ocasião, a Rádio Gazeta abriu um concurso para buscar um "comentarista esportivo eclético", e um amigo de trabalho, sabendo da aptidão do jovem Galvão, o inscreveu, sem que ele soubesse.
"Gelei. Era um tremendo desafio, mas não me fiz de vencido, não. Não se faça de vencido jamais. Lute sempre por aquilo que você acredita", diz Galvão atacando de coach.
"Eu fui lá e me aventurei. Era a oportunidade de realizar um sonho, então, encarei três dias de teste no auditório gigante. Eu nunca tinha falado num microfone de verdade. Naqueles três dias, eu confirmei que a minha vocação era mesmo aquela. Era o que eu queria fazer na vida. Acreditei no meu potencial e fui aprovado como comentarista de esportes."
Foi ali que Carlos Eduardo dos Santos Galvão Bueno se transformou em Galvão Bueno. Até então ele era Carlos Eduardo, mas a troca do nome era necessária pois já havia um homônimo trabalhando na TV Cultura na época. Por sugestão de um operador de câmera, optaram por usar o sobrenome.
Dois dias depois, Galvão estreou como comentarista esportivo em um torneio de tênis em São Paulo. "Eu comecei como comentarista porque naquela época narrador de rádio e televisão tinha que ter vozeirão. Meu negócio era ser comentarista mesmo. Analisar tudo aquilo que eu tinha feito como atleta e tinha aprendido na faculdade de educação física. Naquela época, se usava um linguajar rebuscado. Eu não tinha vozerão, mas eu dominava o idioma e o meu linguajar de vendedor. Vendedor é o quê? É comunicador. O meu destino parecia se direcionar para as reportagens e comentários".
Naquele momento eu diria que era absolutamente improvável eu ser narrador, mas não desisti. Superei as aparentes barreiras, busquei ser diferente na coleta das informações, na preparação das transmissões, no modo de envolver o ouvinte, o telespectador, fui conquistando meu espaço, isso é comunicação, até chegar à narração esportiva."
Quando foi contratado para trabalhar no Grupo Bandeirantes, no final de 1977, teve a primeira oportunidade como narrador. "Na verdade, eu estava indo para ser comentarista de rádio. Vinha a Copa do Mundo de 78 logo depois, o Mauro Pinheiro [comentarista, que morreu em 1982] ia se aposentar, e eu ia ser o comentarista para trabalhar com Fiori Gigliotti [radialista e locutor esportivo]. Cara, isso era um negócio espetacular, e o Darcy [Reis, locutor] falou 'vamos experimentar. Você vai fazer um jogo. Eu vou ser seu comentarista, e nós vamos gravar.' Era um jogo da seleção brasileira. Uma vergonha. Vocês não têm ideia da vergonha que eu senti quando gritei o primeiro gol", conta Galvão.
Aprendendo com os mestres
Se Darcy Reis foi o primeiro a lhe dar a oportunidade de gritar "gol" ao microfone, outros profissionais o ajudaram a ser o que ele é hoje. "Eu costurei minha carreira de narrador aprendendo com os exemplos de grandes colegas narradores, de empreendedores da comunicação, principalmente o doutor Roberto Marinho, e de mestres da televisão, como o maior de todos: José Bonifácio de Oliveira Sobrinho, Boni".
"Além dos ensinamentos técnicos, o Boni me ensinou que sempre se pode fazer melhor. Isso serve para mim e para vocês. [...] Quando eu termino uma transmissão, eu tenho a noção exata: 'Fiz bem, que alegria', 'não foi legal'. Mas mesmo quando você pensa 'fiz bem', você tem que se lembrar que você pode fazer melhor. Isso o Boni me ensinou. E por isso, com ele, as cobranças eram constantes, as exigências eram altas. O sarrafo era lá em cima."
Além disso, aprendeu "o segredo do sucesso" com o jornalista e cronista esportivo Armando Nogueira (1927-2010).
O segredo do sucesso tem um pouco de sorte, tem inspiração, mas tem muito de transpiração. Transpiração é trabalho, trabalho, trabalho. Eu sei que a sorte ajuda quem cedo madruga, quem trabalha".
O poder dos bordões
Famoso pelos seus bordões, Galvão explica a origem de alguns e a importância dessas "bengalas", que se transformaram em uma marca registrada.
O bordão é uma bengala que a gente usa para ajudar a comunicar. Se você se pega sem saber o que falar em um determinado momento, se socorre no bordão e todos vão entender o que está se passando, sem lhe acusar de estar repetindo sempre a mesma coisa. Nenhum bordão meu foi pré-concebido. Eles acontecem normalmente no decorrer da transmissão".
O "Bem, amigos", por exemplo, nasceu em uma transmissão de um Grande Prêmio da Fórmula 1 na Austrália. Sem saber se iniciaria com "boa tarde, bom dia ou boa madrugada", em função do fuso horário para o Brasil, ele improvisou.
"Eu não queria já, na abertura da transmissão ficar me explicando. Então eu travei. O que eu faço? Mas, assim na travada, veio sem mais nem menos 'Bem, amigos da Rede Globo'. Pronto. Bem, amigos, é de manhã, de tarde, de noite, de madrugada, serve para tudo. Na hora eu nem pensei muito se tinha ficado bom ou não tinha ficado bom. Depois me falaram que tinha sido legal. Então, eu passei a usar. Deve fazer mais ou menos uns 35 anos que tenho essa bengalinha, não largo dela e não preciso me preocupar como abrir a transmissão", diz sobre o bordão que virou até nome do programa apresentado por ele na SporTV.
Outro bordão famoso também nasceu naturalmente. O "Olha o que ele fez" marcou a narração do golaço de Ronaldinho Gaúcho, o primeiro dele pela seleção brasileira, na Copa América de 1999, em um jogo contra a Venezuela.
"Ele [Ronaldinho] certamente ficou tão admirado quanto eu e deve ter falado 'olha o que ele fez, olha o que ele fez'. Uma pintura de gol, ele esbanjou categoria com os pés e eu tentei reproduzir essa beleza com a minha voz, com a emoção genuína do torcedor. Naquele momento, eu era um torcedor. Eu sou um narrador, um comunicador, mas sempre fui um torcedor da seleção brasileira. É nisso que eu acredito: acreditar naquilo que você está falando. Isso torna sua comunicação muito mais eficaz", diz Galvão marcando uma de suas muitas lições.
O curso custa R$ 497 e é composto por 11 aulas gravadas —com a primeira disponível gratuitamente aqui. De acordo com a Curseria, as aulas contam com linguagem audiovisual cinematográfica para proporcionar uma experiência de imersão e são indicadas para admiradores do narrador e "pessoas que querem se aprofundar nas técnicas de comunicação e fortalecer as relações pessoais e profissionais".
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