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Jogador recreativo, brasileiro ganha R$ 1,8 milhão em mundial de pôquer

Paulo Joanello beija bracelete após conquistar em Las Vegas etapa do WSOP - Diego Ribas/PxImages
Paulo Joanello beija bracelete após conquistar em Las Vegas etapa do WSOP Imagem: Diego Ribas/PxImages

Diego Ribas

Colaboração para o UOL, em Las Vegas (EUA)

20/11/2021 04h00

Depois de uma pausa forçada no ano passado devido à pandemia de Covid-19 - o torneio foi realizado integralmente de forma on-line —, a temporada 2021 da WSOP (World Series Of Poker) voltou a receber milhares de jogadores recreativos e profissionais na cidade de Las Vegas (EUA). Tradicionalmente sediada entre maio e julho, a competição foi disputada em outubro e novembro desta vez, mudança que também foi motivada pelas medidas de combate ao vírus.

Apesar do número menor de participantes brasileiros, que esbarram tanto nas restrições impostas para viagens aos Estados Unidos como na alta do preço do dólar, nossos representantes fizeram bonito nas mesas de pôquer montadas no Hotel & Cassino Rio, que carrega este nome justamente em homenagem à Cidade Maravilhosa.

No entanto, foi na figura de um empresário com sotaque paranaense que o Brasil alcançou o lugar mais alto do pôquer. Na última quarta-feira (17), Paulo Joanello levou a melhor em um torneio disputado por 1.500 competidores e, após dois dias de disputa, se sagrou o 17º brasileiro a levar para casa o bracelete do mundial de pôquer da WSOP - o sétimo a conquistá-lo em competições presenciais. Pela façanha, ele embolsou US$ 321 mil (cerca de R$ 1,8 milhão).

"Fiquei famoso da noite para o dia, não tive tempo de responder ninguém nas redes sociais (risos). Aqui o pessoal me reconhece e me cumprimenta nos corredores", se surpreendeu Paulo durante entrevista ao UOL Esporte no dia seguinte à conquista, no 'Salão Amazon', onde havia conquistado o torneio. "Ainda não consegui dormir", ressaltou.

Como ele mesmo deixa claro, Paulo é um competidor recreativo, ou seja, não é profissional e, portanto, não vive do pôquer. Fã da modalidade desde 2006, época em que ainda morava na Austrália, o empresário passou a investir mais tempo e dedicação ao estudo do jogo dois anos depois, quando retornou ao Brasil. Já em 2013, fez sua primeira viagem à cidade de Las Vegas para participar da WSOP e dar início à busca pelo sonhado bracelete.

"A primeira vez que vim foi em 2013, depois 2014", relembrou. "Depois casei, minha filha nasceu e voltei em 2018, 2019 e agora em 2021. Não vivo do pôquer, mas é meu grande hobby, minha grande paixão. Nunca dependi dele para pagar as contas, mas sempre levei muito a sério."

Paulo Joanello é abraçado por colegas após ganhar R$ 1,8 mi em etapa do World Series Of Poker - Diego Ribas/Diego Ribas/PxImages - Diego Ribas/Diego Ribas/PxImages
Paulo Joanello é abraçado por colegas após ganhar R$ 1,8 mi em etapa do World Series Of Poker
Imagem: Diego Ribas/Diego Ribas/PxImages

Para esta temporada, Paulo tinha uma meta clara, pouco tempo hábil e orçamento enxuto. Afinal, o empresário curitibano viu na recente mudança das exigências para a entrada nos EUA de viajantes vindos do Brasil a chance de participar do main event (torneio principal), que premiou o jovem alemão Koray Aldemir com US$ 8 milhões (cerca de R$ 44,9 milhões).

"Vim assim que o presidente dos EUA anunciou que abriria [a fronteira para turistas vacinados] no início de novembro. Compramos a passagem para o dia 1º, mas abriram a partir do dia 8. Mudamos a passagem e chegamos a tempo de nos inscrevemos no main event. A grana era para passagem, dez dias de estadia e para jogar main event. Mas estourei o orçamento (risos)", se divertiu o novo milionário, agora com a certeza do alto lucro alcançado com a viagem.

O torneio principal, cujo preço para participar é US$ 10 mil, é disputado ao longo de nove dias. Como Paulo perdeu no terceiro dia, ele aproveitou a ampla oferta de competições nos dias seguintes para se manter entretido. Ao todo, a WSOP realiza quase 100 torneios presenciais por ano e cada um deles premia o vencedor com uma quantia que varia de acordo com o número de inscritos e com o tão sonhado bracelete dourado.

Após ser eliminado sem direito a prêmio, tanto no main event como nas duas competições seguintes, o paranaense atingiu o ITM ('In The Money', algo como grupo de competidores que recebe bonificação pela posição alcançada) no quarto torneio disputado e ganhou o suficiente para custear a quinta e última tentativa rumo ao título: US$ 1,5 mil para participar do evento 77, 'No-Limit Hold'em'. E foi ali que o destino do jogador mudou com uma bela ajuda de seus amigos.

Amigos do peito

No último dia dos dois disputados no torneio, Paulo chegou à mesa final e, enquanto enfrentava outros sete competidores, dividia as atenções dos presentes justamente com os momentos decisivos do evento principal, que era realizado ao mesmo tempo a poucos metros de distância, e que contava com transmissão da TV americana. Em uma área menos imponente no pavilhão Amazon, o brasileiro, porém, fez muito mais barulho.

E a razão dele roubar a cena naquela noite foi a presença do seu grupo de cerca de dez amigos, uma mistura de jogadores profissionais e recreativos que acompanharam lado a lado cada uma das mãos disputadas e vibraram cada conquista, como se um gol fosse feito em uma partida importante de futebol. O apoio, fundamental na visão do mais novo campeão da WSOP, deixou marcas.

"O apoio ajuda muito. Me perguntaram se estavam atrapalhando, mas eu estava tão focado, ficava apenas olhando para o bracelete. Para eu ter outra chance de passar por mais de mil adversários e chegar aqui, levaria no mínimo outros dez anos (risos)", relembrou, olhando para o teto enquanto buscava em sua memória os momentos de vibração dos colegas.

"Vi que o adversário estava tremendo, sentiu o baque. Foram mais de duas horas de heads up [quando apenas dois jogadores competem na mesa]. Se perguntar para os profissionais, eles vão falar que falei besteira, mas esse ambiente, a energia em volta… Eu acredito que ajuda", cravou.

Deixando de lado a eficácia ou não da barulhenta torcida no lado psicológico do americano Toby Price, vice-campeão do evento 77, um detalhe curioso ficou marcado durante a reta final da competição. Daniel, um dos dealers responsáveis por coordenar a mesa final, se tornou xodó dos brasileiros a ponto de bater foto com Paulo e seu bracelete após a conquista. E tudo começou de forma despretensiosa.

Paulo Joanello ao lado do dealer ao posar com o bracelete que conquistou em etapa do mundial de pôquer - Diego Ribas/Diego Ribas/PxImages - Diego Ribas/Diego Ribas/PxImages
Paulo ao lado do dealer ao posar com o bracelete que conquistou em etapa do mundial de pôquer
Imagem: Diego Ribas/Diego Ribas/PxImages

Ao perder algumas rodadas de fichas em sequência, o jogador brasileiro ouviu dos amigos mais uma dentre tantas outras brincadeiras proferidas naquela noite: "Troca o dealer [pessoa que distribui as cartas aos competidores], essa está dando azar".

Minutos depois, quando chegou a vez de Daniel assumir o comando da mesa, a sorte virou e Paulo engrenou uma boa fase. A partir daí, o americano se tornou o amuleto que faltava.

A cada vitória anotada, mesmo nas que rendiam menos fichas, o nome de Daniel era ecoado como se ele fosse um ídolo nacional. Aplausos, risos e gritos ditaram o ritmo das ações por outras duas trocas de dealers até que, curiosamente, coube ao mesmo Daniel ser o responsável por distribuir as cartas nos momentos finais do torneio, que terminaram com um abraço coletivo dos amigos no mais novo campeão mundial.

"Vendo o vídeo, acho até que fui muito agressivo na comemoração. Normalmente a primeira coisa que a gente faz é apertar a mão do adversário. Até pediria desculpas se tivesse oportunidade, mas não me culpo por reagir a um momento que busquei minha vida inteira", destacou, já com semblante mais sério.

Caixa único + impostos

Com 15 anos de experiência no pôquer, Paulo nunca havia passado perto de conquistar um prêmio tão grande. Em 2019, em uma competição nacional, ele estabeleceu seu recorde pessoal, até então, de R$ 120 mil. Agora, com cerca de 15 vezes este valor, o empresário revelou detalhes que terminaram por encurtar a quantia de forma substancial.

O primeiro deles é bastante conhecido por quem recebe quantias em dinheiro no exterior. A taxa de 30% cobrada direto na fonte 'mordeu' US$ 96 mil do total logo no caixa. A seguir, os US$ 225 mil restantes foram divididos entre Paulo e seu amigo Fernando Karam, com quem o empresário faz uma espécie de caixa único durante viagens para torneios internacionais.

"Eu e meu amigo dividimos tudo, despesas e prêmios", destacou. "Em 2019, ele ficou em segundo lugar em um torneio e ganhou US$ 460 mil, e dividimos. A gente vem e joga, vê quanto gastou e ganhou e divide em dois, inclusive esse prêmio de agora já foi pago. Temos bastante sorte na WSOP", encerrou, antes de usar a calculadora para, enfim, calcular o valor que de fato chegará à sua conta bancária no Brasil: US$ 112 mil (cerca de R$ 620 mil).