Doceira completa terceira São Silvestre após dois anos de quimioterapia
"Tanta coisa mudou; o cabelo cresceu, as corridas aumentaram. Agora, inventei de fazer doces, acredita?", sorri a doceira Ana Carolina Godói, de 38 anos, que acaba de concluir sua terceira São Silvestre. Essa conclusão, entretanto, tem outro gosto: o da cura e do renascimento.
Carol descobriu um câncer de mama em estágio avançado em 2018, ano em que se inscreveu para a São Silvestre pela primeira vez. Ela já havia pago a taxa quando obteve o diagnóstico e, mesmo sob relutância da médica que a acompanhava, percorreu os 15 km sob os efeitos colaterais da quimioterapia.
"Chorei durante todo o percurso e, mesmo com muita dificuldade, concluí a prova -muito agradecida a Deus pela minha vida. Foi a corrida que me deu força para lutar contra essa doença, que destrói a mente da gente. Hoje, faço quimioterapia via oral. Sinto efeitos colaterais, mas nada comparado ao tratamento físico", diz.
A cada dois meses, Carol faz imunoterapia. No último retorno ao médico, soube que o câncer havia desaparecido -e que não tinha qualquer sinal de reincidência. "O her2 positivo é um tipo de câncer que se alimenta do hormônio feminino, por isso a reincidência é muito grande nos primeiros anos de tratamento. Mas não reincidiu em mim. A imunoterapia bloqueia esses hormônios".
A descoberta do câncer aconteceu quando Carol tinha 35 anos, em um exame de autotoque. Na primeira ida ao médico, soube que havia quase 80% de chance de o caroço que ela encontrou no seio fosse um câncer. Entretanto, foi preciso quase um ano e meio para que o diagnóstico correto viesse. "Precisava fazer um exame específico para saber o tipo de tumor e como tratá-lo. O valor dele é muito alto, e o convênio demorou demais para liberar".
Assim que teve o diagnóstico, descobriu que o câncer já estava chegando no último estágio, o quarto, que é onde as chances de cura são raríssimas. "Começaram as quimioterapias, e eu comecei a correr. Não podia parar, porque enlouqueceria. O esporte me salvou e, agora, essa São Silvestre é a consagração dessa vitória. Vou para essa São Silvestre mais treinada. Em 2019, estava quase careca, e senti muita vergonha de tirar o boné durante a corrida. Agora, vou balançar meus cachos".
"As mulheres precisam saber como é importante praticar esporte mesmo durante o tratamento. As pessoas nos aterrorizam muito, mas a gente é capaz. A gente consegue."
Durante a pandemia, a médica de Carol pediu que ela não parasse de se exercitar. Como não podia correr na rua, por risco de contaminação, passou a subir e descer as escadas do prédio em que mora. "Também comprei uma bicicleta ergométrica. Percebi que alguns corredores começaram a treinar na rua em horários bem atípicos, e comecei a ir também. Bem cedinho, ou de madrugada, mas sempre sozinha. Parei de correr em equipe", afirma.
"Correr por uma hora na rua não estava suficiente para que minha cabeça ficasse tranquila. Comecei a pensar muita besteira, a desacreditar da cura. Achava que se eu pegasse covid-19, morreria, porque já estava debilitada. Então, passava o dia todo em casa. Minha médica sugeriu que eu desenvolvesse outra atividade, foi quando comecei a fazer doces para vender".
Carol dividiu o dia entre a produção de doces e o esporte, o que fez com que se preparasse bastante para a São Silvestre. "Nosso corpo sabe tudo o que o cérebro pensa. Se a gente pensa besteira, que não vai conseguir, o corpo acredita. O câncer volta, as dores voltam. O esporte alivia as dores, os efeitos colaterais e ainda distrai a nossa mente. Correr é minha paixão e, hoje, posso dizer com muita alegria: corri mais uma São Silvestre, e desta vez, curada".
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