Após a vitória dos Warriors no Jogo 5 das Finais, que coloca a equipe da Califórnia a um triunfo do título da NBA, o Boston Celtics se encontra em um lugar estranhamente familiar: à beira da eliminação.
Foi assim contra o Milwaukee Bucks, quando a equipe de Wisconsin abriu 3-2 de vantagem na série após um colapso do Boston no quarto período. Foi assim contra Miami, que teve um Jogo 7 diante de sua torcida para eliminar os celtas. E, se quiserem ser campeões, os Celtics terão que fazer de novo aquilo que vêm fazendo o ano todo: reagir diante da adversidade. Boston acumula 3-0 nos jogos eliminatórios nesses playoffs, incluindo 2-0 jogando fora de casa; é um time extremamente irregular, mas que joga seu melhor nos momentos de maior pressão. É nisso que Boston vai se fiar no Jogo 6.
Um bom ponto para começar é um de enorme discussão ao longo das Finais: a forma como os Celtics e sua defesa tentam parar o ataque dos Warriors Durante a maior parte da série, Boston manteve seu plano defensivo em linha com o que foi o ano inteiro: usar muitas trocas mas manter os pivôs na chamada cobertura "drop", quando ele recua para o garrafão a fim de tirar a infiltração adversária e aposta na capacidade dos seus defensores na bola de recuperarem a posição. Foi assim que os Celtics tiveram a defesa mais dominante da liga, então fazia sentido repetir a estratégia nas Finais.
Mas os Warriors tem Stephen Curry.
Curry tem dominado as Finais da NBA com esses arremessos, tendo médias de 31 pontos por jogo e 42% nas bolas longas. Isso tem criado a impressão - ou pelo menos a narrativa - de que Boston está mantendo uma defesa condenada à derrota no jogo, se recusando a adaptar, e deixando Curry jogar como quer.
No entanto, isso não é verdade, porque a defesa em drop dos Celtics tem um propósito. Golden State, ao longo da sua dinastia, está no seu mais perigoso quando usa a atenção sem precedentes que Curry comanda na defesa para forçar dois jogadores a marcarem Steph, liberando o resto da equipe para jogar 4-contra-3. Mas Boston tem confiança de que seus excelentes defensores conseguem minimizar esse espaço e dificultar o suficiente as bolas de Steph, de forma que o time aceita a possibilidade de Curry possa explodir para conter o resto da equipe. De fato, se você prestar atenção, vai ver que muitos dos chutes de Steph são muito bem contestados; ele simplesmente está acertando porque é o que grandes jogadores fazem.
Boston inclusive vem colocando seus pivôs cada vez mais alto contra Curry ao longo da série, para tirar o espaço do chute e tentar encontrar melhor esse equilíbrio de não deixar Golden State jogar 4 vs 3, mas também não dar tanto espaço para o arremesso. Veja onde Horford está nesse lance; ele está com os dois pés FORA da linha de três para impedir o chute. Steph acerta porque ele é Steph.
Mas, no Jogo 5, os Celtics finalmente fizeram uma mudança drástica: ao invés de forçar Curry a vencer o jogo e minimizar o impacto dos seus companheiros, Boston decidiu que iria obrigar Golden State a vencer com qualquer outro jogador, menos Curry. Boston individualizou a defesa no armador a níveis extremos, chegando até mesmo a colocar seus marcadores de frente para Steph no meio da quadra e acompanhando ele para sequer deixar o armador receber a bola.
Foi uma excelente defesa e Curry teve sua pior atuação na série, anotando apenas 16 pontos e errando todas as bolas longas que tentou. Mas o reverso da moeda também apareceu: com a atenção dedicada a Curry, Golden State aproveitou o espaço extra que isso gerava para rodar a bola e acionar todos seus coadjuvantes. Era exatamente o que Boston tentava evitar nos primeiros jogos; não é por acaso que Curry brilhou como passador e facilitador, e que Thompson, Wiggins, Poole e até Gary Payton tiveram seus melhores jogos na série contra uma defesa que tinha menos capacidade de marcá-los de perto.
Não existe resposta certa aqui, mas no geral eu acredito que Boston prefere assim: uma coisa é ter um plano para defender Curry, outro é executar, e Boston fez o que fez por ser uma defesa historicamente dominante. Wiggins, Payton e Poole acertaram arremessos difíceis para vencer o Jogo 5, mas o desafio é repetir isso várias vezes. Boston mostrou que consegue trazer o jogo para seus termos nesse lado da quadra, e vai precisar fazer isso de novo no Jogo 6. E se Curry mesmo assim pegar fogo e vencer o jogo sozinho, paciência; faz parte de enfrentar jogadores desse nível.
Ainda assim, por toda a conversa dedicada à defesa de Boston, ela tem segurado bem o suficiente as pontas. Boston não está perdendo essa série na defesa, e sim no ataque. E de novo eu preciso trazer a estatística fundamental, os turnovers: nas suas duas vitórias nas Finais, Boston cometeu 12 turnovers em cada; nas derrotas, está cometendo 17 por jogo. Alguns são inevitáveis, especialmente enfrentando uma defesa agressiva como de Golden State, mas vários deles são simplesmente decisões péssimas que levam a erros bobos e cestas fáceis do outro lado.
Eu separei essa jogada do Brown porque ela resume exatamente o que tem sido o problema: jogadores tentando fazer demais. A pressão defensiva dos Warriors está tão sufocante que os Celtics estão se precipitando em qualquer espaço aberto e atacando mesmo sem ter um plano do que fazer, o que leva a erros.
O ataque dos Celtics floresceu ao longo do ano com uma característica simples, mas que tem desaparecido nas Finais: atacar o elo mais fraco do adversário, forçar reação da defesa, e rodar a bola até encontrar um arremesso livre. Parece banal, mas Boston mostrou um refinado arsenal de jogadas e movimentações destinados para colocar esse elo mais fraco na situação que ELES querem, e atacar a partir disso. Nas Finais, Boston entrou visando Curry para esse papel, mas na prática não tem funcionado: é a terceira série seguida que os adversários de GS tentam atacar Steph, mas só conseguiram anotar míseros 108 pontos por 100 posses de bola - equivalente ao terceiro pior ataque (OKC) da temporada regular. Curry tem sido brilhante defensivamente nos playoffs, e os Warriors sabem contra-atacar quem tenta jogar assim.
E a impressão é que, na falta do seu modelo padrão de atacar, Boston está sem saber o que fazer. O quinteto inicial dos Warriors não tem outros elos fracos, o que tira a jogada mais básica dos Celtics: se atacam Curry, o ataque não tem sucesso, mas sem esse elo a ser quebrado o time tem dificuldade em iniciar as ações, perdendo tempo e levando a esses lances onde um jogador tenta fazer demais. E pior, isso acaba levando Boston em excesso ao outro extremo, ao ponto de que o time para por completo de caçar os piores defensores dos Warriors de maneira inteligente. Jordan Poole, por exemplo, tem passado minutos demais em quadra sem ser um alvo na defesa, enquanto muitas posses envolvem Brown ou Marcus Smart atacando defensores de elite como Draymond ou Gary Payton a partir do drible.
É claro, não é que os jogadores estejam intencionalmente abandonando o que deu certo, ou tomando decisões ruins porque querem. Mas, a essa altura do ano, todo o desgaste físico e emocional se acumula (e Boston, vindo de duas séries de 7 jogos contra times extremamente físicos, certamente está sentindo o peso) e torna mais difícil executar. No fundo, nesse ponto das séries os ajustes táticos são mínimos; Boston sabe o que tem que fazer, mas ir lá e efetivamente fazer direito é mais difícil.
E isso é ainda mais verdade para um time como os Celtics, que não tem ataque no seu DNA, que precisam pensar em excesso e jogar com disciplina a mais para fazer o ataque funcionar. Quando cada reação demora um segundo a mais por causa do cansaço e pela falta do plano de costume, quando falta perna para a disciplina se destacar, a margem para erro diminui exponencialmente, e isso até aqui tem sido o grande problema. Udoka sabe o que o time precisa fazer, os jogadores sabem, mas efetivamente fazer isso no tempo limitado de cada posse de bola é muito mais difícil do que parece quando assistimos sentados ao sofá. Golden State já esteve aqui e fez isso várias vezes; eles tem uma experiência que falta aos Celtics, e que tem feito a diferença em uma Final tão equilibrada.
O que Boston precisa fazer é, no papel, ridiculamente simples: manter a defesa feroz do Jogo 5 sobre Curry, minimizar os erros, executar seu ataque ao invés de atacar sem pensar, rodar a bola, e acertar os chutes livres. Os Celtics são capazes de fazer isso, e provaram repetidas vezes nos playoffs. Mas, mais importante, eles precisam encontrar as últimas reservas de força, de energia e de concentração que ainda tiverem guardadas, como aconteceu tantas vezes antes. A irregularidade de Boston, os famosos "apagões", não são novidade das Finais; e, mesmo assim, Boston conseguiu superar isso para chegar nas Finais.
Resta ver se os Celtics ainda tem uma última arrancada no tanque.
ID: {{comments.info.id}}
URL: {{comments.info.url}}
Ocorreu um erro ao carregar os comentários.
Por favor, tente novamente mais tarde.
{{comments.total}} Comentário
{{comments.total}} Comentários
Seja o primeiro a comentar
Essa discussão está encerrada
Não é possivel enviar novos comentários.
Essa área é exclusiva para você, assinante, ler e comentar.
Só assinantes do UOL podem comentar
Ainda não é assinante? Assine já.
Se você já é assinante do UOL, faça seu login.
O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Reserve um tempo para ler as Regras de Uso para comentários.