Mariana Becker conta como lidou com machismo após 'choque tardio'
"Fingir que não entendia cantada para fazer o que você estava a fim". Foi essa maneira que a jornalista Mariana Becker, repórter de Fórmula 1 da Bandeirantes, utilizou para lidar com o machismo. Criada "sem limites por ser mulher", a gaúcha afirma só ter entendido o preconceito que sofria depois de adulta, quando se aventurou mundo afora e iniciou a carreira profissional.
Mariana conta ter herdado o espírito desbravador de seu pai, o médico José Alberto Becker. Acostumada com a liberdade que tinha em casa, a jornalista levou um susto quando se deparou com o mundo. Estranhou os "nãos" para matérias mirabolantes, assim como cantadas, ameaças e mãos bobas enquanto tentava fazer o seu trabalho. E o choque fez com que Mariana, assim como tantas outras profissionais, adotasse a postura de "super-humano" para não ser desvalorizada.
"Meu pai sempre foi um cara muito aventureiro e sempre me estimulou a ser quem eu sou. Meus pais nunca me botaram limite por ser mulher. Fui saber que isso existia quando comecei a trabalhar e fui morar fora. Até então, eu ouvia, mas nunca tinha batido algo como: não vai porque é mulher", iniciou Mariana Becker, que recentemente lançou um livro, em entrevista ao UOL Esporte.
"O mundo vai apresentando para a gente. Eu sabia que existia, mas nunca tinha tocado em mim. Quando as coisas aconteciam comigo, achava que era pessoal entre mim e aquele cara, seja colega, amigo, namorado. Depois fui entendendo que era uma coisa muito maior, que tinha profundidade e força maior; o quanto que aquilo pode limitar o que você quer fazer, e por essa questão, eu fiquei muito chocada quando começou", completou.
Desconfiança, cantadas, descrédito. Mariana Becker enfrentou tudo isso até se tornar uma profissional renomada na principal categoria de automobilismo do país, e em uma época em que, segundo ela, "não se falava de assédio, nem moral, nem sexual".
"Aconteceu de eu entrevistar um cara de certo poder e ele ter uma postura desrespeitosa comigo. Era uma época que você tinha que fingir que aquilo não estava acontecendo. Aconteceu comigo de a pessoa botar a mão e eu cortar. No resto, você fingia que não entendia a ameaça, a cantada, para poder continuar fazendo o que estava a fim", relatou a repórter de 51 anos.
Mariana conquistou prestígio ao longo da carreira. Cobriu a Fórmula 1 na TV Globo e hoje trabalha com a principal categoria do automobilismo na Band. A experiência ao longo da vida fez com que ela entendesse que precisaria escolher quais batalhas iria travar.
"Eu aprendi a ter paciência e (entender) o tempo que eu dedico a quem me enche o saco. Quando é uma coisa muito boba, falo que estou sem tempo para discutir, ensinar e vou embora. Eu tive e tenho grandes amigos e parceiros, porque fui criada por um homem incrível, que me ensinou a ter grandes amigos e parceiros desde sempre. Eu me botava na posição oposta quando tinha agressão e limite. Fora isso, tive, tenho e sempre terei grandes amigos", falou.
E o pai da jornalista — que morreu em março deste ano — teve importante papel também no desenvolvimento de Mariana como uma exploradora do mundo. Becker cavalgou no interior do Marrocos, quase encontrou com ursos no Japão e passou um dia observando lobos no sul da França, e essa sede pela vida deve-se a José Alberto, diz ela. Algumas dessas aventuras estão no livro "Não inventa, Mariana" (Editora Labrador, 272 páginas), lançado este mês.
"Essa coisa de viajar sozinha era ele total, de encarar roubadas, de acampar com frio monstruoso, e ele me dava a maior força. Eu tinha um namorado, quis viajar sozinha nas férias e ele ficou bravo. Meu pai falou para ir sozinha. Eu atravessei o deserto da Patagônia de carro com ele no final dos anos 1980", disse a repórter.
E a Fórmula 1?
Mariana Becker ganhou prestígio e relevância por seu trabalho na cobertura da principal categoria do automobilismo mundial. Mas preferiu que seu primeiro livro deixasse o esporte de lado. O material de contos possui apenas suaves pinceladas sobre a Fórmula 1, sempre como um simples plano de fundo para as reflexões da jornalista sobre suas aventuras e vida. O motivo? A grande quantidade de histórias contadas ao vivo, seja na tela da Band ou nas redes sociais.
"Questionam quando eu vou fazer um livro de histórias da Fórmula 1. Estou começando a ficar com vontade de contar. Quando me contam que gostariam de saber o brigadeiro do Daniel Ricciardo, penso que poderia contar essa história. Não quero contar histórias que já contei, o que todo o mundo está vendo. Dá vontade de contar o que não está visto, as impressões, mas coisas muito particulares que eu não mostro são raras. Tenho a impressão que sobra pouca coisa", explicou Becker.
Além disso, a jornalista diz esbarrar em sua ética profissional. Nem tudo que acontece pode ser dito publicamente.
"Talvez até tenha que fazer um levantamento para ver o que pode render, mas, por compromisso profissional, não poderei contar coisas que não pude contar ao vivo. Aconteceram coisas no bastidor que se eu não revelei na TV ou no Instagram, eu não posso revelar. (Mas) Entendo a curiosidade e teria também", completou.
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