Sophia Kelmer driblou capacitismo para colecionar medalhas no tênis de mesa
Sophia Kelmer ainda está começando a vida, mas já tem uma certeza: sua atividade preferida é a prática de esportes. A jovem de 14 anos é daquelas que sempre esperou ansiosamente pela aula de educação física para poder jogar futebol e outras modalidades com os colegas. Mas não foi essa a realidade que a carioca encontrou quando iniciou sua trajetória na escola.
Ela sofre com uma paralisia cerebral, decorrente de um AVC intrauterino, que afetou o lado direito de seu corpo. A doença não impediu que Sophia vivesse próxima das práticas esportivas. Incentivada pelos pais, ela entrou para a natação e para o atletismo. As crianças que conviviam com ela, contudo, a impediam de participar das modalidades coletivas, o que fez com que a família decidisse procurar outra escola. O problema continuou, mas a mudança de ares fez com que Sophia conhecesse o tênis de mesa.
"Sempre curti vários esportes. O principal sempre foi o futebol. Só que tinha dificuldades para me encaixar com a deficiência. Os garotos não gostavam de jogar comigo por eu ser menina e deficiente. E aí encontrei uma mesa de tênis de mesa no meu novo colégio e passei a levar jeito. Aí acabou que eu ingressei numa escolinha. Passei a entender que aquilo só dependia de mim. Não precisava de outras pessoas", contou Sophia em entrevista ao UOL Esporte.
Sophia tem apenas 14 anos, mas demonstra muita maturidade. Segundo a jovem, ela aprendeu desde novinha a entender e enfrentar qualquer discriminação que sofresse. "Eu sempre tive a ciência de que sou deficiente e que haveria pessoas que não me ajudariam nessa caminhada. Ser deficiente é difícil, mas levo isso muito bem. Os meus pais me ensinaram que isso seria parte da minha vida, mas não poderia me abalar. Então eu consegui me desenvolver e me viro super bem com essas situações", disse.
A vida de Sophia mudou em uma velocidade muito alta. Quatro anos após o primeiro encontro com a raquete, ela se tornou paratleta profissional federada pelo Fluminense, conquistou três campeonatos brasileiros e é a oitava melhor jogadora de tênis de mesa do mundo na classe oito — atletas andantes com médio a bom nível de mobilidade.
"Ainda não caiu a ficha, para ser sincera, porque tudo aconteceu muito rápido. Eu entrei na escolinha de tênis de mesa no fim de 2018 e, no meio de 2019, eu já estava federada, jogando campeonato. Então, nossa, aconteceu muito rápido, não tive tempo de raciocinar e pensar que virei uma atleta profissional. Eu fui participando de competições amadoras, fui me destacando e quando eu vi já estava em campeonato nacional. Foi muito natural", exaltou Sophia.
Cada degrau conquistado no ranking mundial torna o sonho paraolímpico cada vez mais próximo. Fã de Hugo Calderano, Sophia disse que tenta segurar a ansiedade para Paris-2024 para focar ao máximo nas atuais competições que são importantes para a caminhada à capital da França.
"Esse ano, por exemplo, vai ter um campeonato muito importante, que é o mundial. Eu estou classificada para competir e esse é o grande foco no momento. As paralimpíadas são um grande sonho para mim e eu terei 16 anos em 2024... Então eu estou trabalhando muito para isso aconteça. A expectativa está alta, mas tento lidar passo a passo", disse a jovem, que pode se tornar a atleta brasileira mais nova a disputar Jogos Paraolímpicos.
Sophia é integrante do projeto "Diamantes do Futuro", da CBTM (Confederação Brasileira de Tênis de Mesa) e já alcançou a primeira convocação para a seleção brasileira em junho de 2022. Ela representou o Brasil na República Tcheca e conquistou três medalhas: uma de ouro, nas duplas femininas, e duas de prata (individual e duplas mistas).
A família é a base de Sophia. Os pais sempre a incentivaram a fazer o que a deixava feliz e, para acompanhar a filha, o pai Henrique Kelmer fez um curso de técnico de tênis de mesa.
"Sou um técnico internacional com especialização em paralímpico. Eu procuro não me meter tanto...Mas tem certos jogos que eu fico... Eles podem saber de tudo de tênis de mesa, de tática, técnica, bola, mas o psicológico, a Sophia vira a mão, vira o olho, eu já sei o que está acontecendo, já sei o que ela precisa. Se é um carinho ou até um berro de incentivo, eu estou lá", contou.
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