Minotauro critica 'lutas clandestinas' após morte de jovem e explica riscos

Lenda viva do MMA, Rodrigo Minotauro criticou o evento amador que terminou com a morte de João Victor Penha, de 23 anos, em Jericoacoara (CE), na última semana. Em entrevista ao UOL após ver o vídeo da luta, o ex-atleta lamentou a morte do jovem e se disse triste por ver "organizações clandestinas" levarem o esporte para um lado "totalmente errado".

"Fico triste e desapontado porque são anos de trabalho para reconhecimento das federações de karatê, de boxe. Aí vem organizações clandestinas e irregulares e acabam levando o nome do esporte para o lado totalmente errado e contrário", afirma.

O ex-lutador alerta que lutas como a que aconteceu em Jericoacoara são arriscadas e acontecem em todo o país, o que prejudica o esporte.

"As lutas clandestinas, que acontecem em todo o país, são arriscadas. Para o MMA isso é terrível. Quero alertar mais para o lado humano do esporte, existe sempre um risco de morte. O esporte é intenso, extremo, não é para qualquer um", diz.

"A gente tenta há anos legalizar o esporte, tentando colocar regras, medidas mais rígidas e unificadas. Os grandes eventos nos Estados Unidos se uniram às comissões atléticas, trabalhos para profissionalizar e realmente legalizar o esporte. O atleta precisa fazer exames periódicos, precisa passar em comissões amadoras, antes de lutar profissionalmente, mas tudo dentro das regras", aponta.

Minotauro ainda explica que são necessários vários exames antes de saber se alguém está em condições de lutar.

"Vamos supor que um menino já tem uma doença cardíaca, problemas de saúde pré-existentes e não sabe? Precisa solicitar os exames físicos antes e depois, principalmente após lesões. Os exames devem ser cobrados, como ressonância da cabeça, exames de coração. Às vezes um lutador amador já tem pré-disposição a um derrame, por exemplo, e não sabe. Já vi casos de exames apontarem problemas pré-existentes no atleta, e ele não poder lutar de jeito nenhum. E, digo mais, se lutasse morreria", completa.

Em nota enviada à reportagem, o presidente da Confederação Brasileira de MMA Desportivo, Carlão Barreto, também se manifestou. O dirigente e ex-lutador lamentou a morte do jovem, cobrou educação para que os atletas não entrem neste tipo de evento e disse que a entidade "repudia qualquer evento que não siga os protocolos médicos e de arbitragem".

Morte em luta amadora

João Victor Penha, de 23 anos, morreu após sofrer um nocaute em um evento amador de luta em Jericoacoara, no Ceará, desabafou sobre o ocorrido. O jovem foi atingido por um soco na região da cabeça e sofreu traumatismo crânioencefálico. Ele ficou cinco dias internado em estado grave na Santa Casa de Sobral, mas não se recuperou da lesão e foi enterrado na tarde de ontem (12).

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Evento tinha estrutura precária

Segundo Lilia Maria da Penha, irmã do jovem que morreu, o evento não tinha nenhum tipo de estrutura. A mulher alega que o organizador ligava para as academias locais e convidava alunos para participarem do evento para "lutarem sem perder a amizade", bastando apenas passar o nome e a inscrição era feita. Nenhuma avaliação física ou examés prévios foram solicitados.

"Deveriam ter avaliado que ele não estava preparado para isso, ele estava treinando há pouco tempo. Meu irmão treinava muay thai e foi lutar boxe neste evento, totalmente sem equipamentos de proteção. Nem inscrição teve", alega Lilia Maria da Penha

A parente de João ainda afirma que ninguém ligado à organização do evento entrou em contato para falar sobre o ocorrido ou prestar solidariedade pela morte do atleta. No entanto, Lilia diz que a família ainda tem dúvidas sobre o caminho a seguir a partir de agora.

O que diz a organização do torneio

Em contato com a reportagem, a organização do evento, que se autointitula UFC-Jeri, diz que a competição foi autorizada pela prefeitura de Jijoca em um ofício. O evento ainda acrescenta que foi solicitado o apoio de uma ambulância e que havia enfermeiros presentes no local.

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Ainda segundo a organização, o campeonato foi realizado todo seguindo as regras de boxe para lutas "casadas e combinadas com antecedência" com professores e alunos. Os atletas estavam equipados com luvas tamanho 14, consideradas luvas grandes e de boa espessura para treinos, o que garantiria ainda mais a integridade do atleta.

A UFC-Jeri ainda alega que alterou a regra para dimunuir o tempo dos rounds de três para dois minutos e que os atletas foram orientados sobre a proibição de socos na região da nuca. A luta foi mediada por um árbitro central, além de dois árbitros de mesa.

A organização ainda diz ter um áudio enviado por Marcio Marcelo Santos, ex-secretário do Esporte, em que o evento era autorizado pelo executivo. No entanto, nenhum documento foi assinado ou firmado oficialmente.

O Ultimate Fighting Championship (UFC) foi procurado pela reportagem, mas ainda não se pronunciou sobre possíveis medidas pela utilização de sua sigla sem autorização.

O que diz a prefeitura de Jijoca e a polícia

Em nota, a prefeitura afirma que o secretário de Esporte, Marcio Marcelo Santos, foi exonerado no dia 02 de outubro, portanto não tinha mais autonomia em ter fornecido qualquer autorização em nome da prefeitura.

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O texto ainda diz que um processo administrativo será aberto para apuração dos fatos e das responsabilidades e que a prefeitura só tomou conhecimento do evento depois da fatalidade, reiterando que nenhuma licença ou autorização prévia foram emitidas para realização do evento, que ocorreu sem alvará de funcionamento.

Também em nota enviada à reportagem, a Polícia Civil do Estado do Ceará (PC-CE) afirma que investiga as circunstâncias da morte e que o caso está a cargo da Delegacia Municipal de Jijoca de Jericoacoara.

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