Casal brasileiro sobe Everest e Lhotse em 24h após presenciar acidente
Júlia Castanha
Do UOL, em São Paulo
05/06/2024 13h02
Carlos Santalena e Olivia Bonfim se tornaram o primeiro casal do mundo a completar o "Double Head" juntos: escalar o Everest e o Lhotse, a primeira e quarta montanhas mais altas do mundo, em 24 horas.
Eu cheguei exausta, emocionalmente impactada com o que tínhamos visto. Teve um acidente na montanha enquanto a gente estava escalando o Everest, duas pessoas chegaram a falecer. Esse acidente foi a poucos metros de onde estávamos. Então, paramos a nossa expedição naquele momento pra entender tudo o que estava acontecendo Olívia Bonfim ao UOL
Na história
Eles chegaram ao cume do Everest por volta das 10h30 (horário do Nepal), da terça-feira (21), e às 10h05 (horário do Nepal), da quarta-feira (22), estavam no Lhotse.
"Foi uma escalada linda em parceria com o Carlos. A sensação é realmente de muita felicidade, de muita realização. E eu fico muito feliz de poder abrir esse novo caminho, essa nova possibilidade", afirmou Olívia ao UOL.
Ela se tornou a primeira mulher sul-americana a conseguir o feito, e ele o segundo brasileiro. Era a primeira vez, também, que Olívia escalava o Everest. Carlos, que é guia, estava em sua quarta subida.
Quebra-cabeça de muitas peças
Encarar o Everest (8.848 metros) e o Lhotse (8.516 metros) exigiu dois anos de preparação de Olívia. Primeiro, ela precisou melhorar seu desempenho físico, realizando corridas semanais de 40 quilômetros, mesclando com natação e bicicleta, musculação de quatro a cinco vezes e trilhas longas ao fim de semana com carga.
Enquanto isso, juntou dinheiro. Os treinos acompanhavam um emprego formal em uma multinacional, do qual ela abriu mão par viajar e passar cerca de dois meses no Nepal. A expedição ao Everest custa US$ 55 mil e os montanhistas precisam ainda de equipamentos e treinamento em outras montanhas.
Um dia de cada vez
O ataque ao cume do Everest é dividido em etapas. Além do Base Camp (Acampamento Base), eles passam por outros quatro acampamentos. Chegar a cada um deles oferece um desafio diferente.
No Base Camp, eles ficam por cerca de 40 dias, sem muito o que fazer —o que aumenta ansiedade. Olívia disse que o fato de estar com Carlos ajudou os dias a passarem rápido: "Eu estava com o Carlos, então não tinha essa variável da saudade da família. Tem o restante da família, claro, mas era um facilitador para a gente", contou.
No acampamento três, eles tiveram que enfrentar uma tempestade de vento muito forte, o que os levou a ficar mais uma noite por lá.
Se você pensa no todo, é um todo tão grande que desespera. Então, quando eu estava lá, eu sempre pensava no que vinha primeiro. E tentava evitar pensar no que vinha pela frente. Olívia Bonfim ao UOL
No dia seguinte, após dez horas de caminhada, chegaram ao quarto e último acampamento. Lá, eles já precisavam de oxigênio para respirar; a água para beber era de degelo, cheia de partículas, engordurada da panela usada para descongelar e com eletrólitos que eles adicionavam para ter minerais.
O tempo inteiro a gente fica com uma sensação de sede. Quando eu desci para o acampamento base e peguei uma água mineral, foi um dos momentos mais felizes para mim. Olívia Bonfim ao UOL
Maior desafio
E se subir o Everest já é uma missão difícil, Olívia fez isso passando mal: ela relatou desconforto durante cinco das dezessete horas escalando.
"Eu estava muito mal do estômago nas primeiras cinco horas da escalada. A comida no acampamento 4 é liofilizada, que a gente coloca água quente para cozinhar. E isso caiu super mal para mim", contou Olívia.
Você vê muita vida humana, mas também muita morte e situações muito complexas que realmente te deixam frustrado com o ser humano, com o egoísmo. É impossível você passar, ver alguém precisando de ajuda e não parar para ajudar, e lá você vê muita gente fazendo isso Olívia Bonfim ao UOL
"Primeira de muitas"
Olívia agora quer inspirar outras mulheres. Minoria ("Somos cerca de 20%), ela conta que, no acampamento, foi alvo de olhares preconceituosos. Poucas pessoas acreditavam que ela iria conseguir concluir o projeto.
Estar à frente nessa vertente, mostrar que uma mulher também está ali, páreo a páreo com os homens, abrindo novos caminhos, estou muito feliz, realizada. E espero que continuemos vendo vários outros exemplos assim, que eu seja a primeira de muitas Olívia Bonfim ao UOL