Olivinha explica como virou Flamengo e crê em legado: 'Orgulho absurdo'
"Fui muito mais feliz do que triste". Assim o agora ex-ala-pivô Olivinha resumiu a vitoriosa carreira que se encerrou na quinta-feira, após a derrota do Flamengo para Franca na final do NBB. O último capítulo diz praticamente nada sobre o que foram os 30 anos dedicados ao basquete.
Multicampeão, é um dos grandes reboteiros da história do NBB e fala com emoção no olhar e na voz sobre tudo que construiu no Fla, clube que aprendeu a amar desde a primeira vez que entrou no Maracanã.
Olivinha não nasceu Flamengo, mas se tornou. Carioca de Praça Seca, o atleta de 2,02 metros era Fluminense, mas viu a relação mudar a partir da terceira passagem pelo clube, que começou em 2012.
"Digo que o Flamengo me escolheu. Infelizmente, eu não nasci rubro-negro, mas o Flamengo se tornou a minha religião", disse em entrevista exclusiva ao UOL.
Sempre tive um carinho pelo Flamengo muito grande. Uma gratidão e uma lealdade gigante. Tive duas passagens anteriores no clube. Nessas duas, eu ganhei dois Cariocas e nunca tinha ido ao Maracanã ver um jogo do Flamengo. Em 2012, começo essa terceira passagem e fui convidado para ir. Me arrepio só de falar. Senti uma coisa que nunca tinha sentido na minha vida. Aquela energia da torcida rubro-negra, cantando, apoiando o time. Casou de a gente fazer uma temporada muito boa e ser campeão do NBB. A torcida começou a se identificar muito com o meu estilo de jogo, de garra, disposição, entrega. Começaram a cantar meu nome, apoiar. Foi mudando minha sensação e vontade. Vi que o torcedor tinha um carinho especial comigo. Digo que o Flamengo me escolheu. Fez com que eu me transformasse em um rubro-negro fanático.
Bicampeão mundial, tridecacampeão estadual, hexa brasileiro, tri da Copa Super 8, bi na Copa Intercontinental e campeão uma vez na Liga das Américas e da Champions League, o ídolo rubro-negro admite ainda não ter ideia do tamanho que tem. "Deus da Raça", assim como Rondinelli, ele ainda está assimilando o que representa ao clube.
Zero noção. Para ser bem sincero. Quando colocam na mesma frase Zico e Olivinha, pra mim, é uma coisa surreal. Eu fico até às vezes sem palavras, sabe? Sabemos da história do Zico, o que ele representa. O Zico é o maior da história do Flamengo e ninguém, na minha opinião, vai chegar perto. Só de estar ali próximo a ele, pelo que a torcida fala, isso aí já é a minha maior vitória.
Foi fácil para Olivinha definir o melhor momento da carreira. "Os títulos mundiais de 2014 e 2022", disse com um sorriso no rosto. No primeiro deles, foi carregado na Arena da Barra por uma multidão de rubro-negros que invadiram a quadra para celebrar uma das gerações mais marcantes da história do clube.
Hora de parar
A ideia de parar começou a passar pela cabeça de Olivinha faz tempo. Aos 41 anos, entendeu que as dores e o fato de não acompanhar mais os jovens pesavam. Uma conversa com a esposa o ajudou a tomar a decisão. Depois de três anos, ele finalmente comunicou ao Flamengo que era hora. O anúncio, porém, acabou sendo com um vídeo simples e emotivo publicado no perfil do jogador no Instagram após a derrota na Champions.
Vai ficando cada vez mais difícil, o tempo passa para todo mundo, comigo não é diferente.
Nomes como Filipe Luís e Vini Jr comentaram na publicação de Olivinha, mas foi um comentário simples que o fez desabar novamente em lágrimas. "Fiz um vídeo bem simples no meu quartinho que tenho minhas coisas do Flamengo. Coloquei no Instagram e o primeiro comentário era uma carinha de choro. Eu estava almoçando e comecei a chorar com a minha esposa. Minha filha sem entender nada."
É um mix de emoções. O basquete é a minha vida. Passei 30 anos jogando, não fiz mais nada da minha vida. Eu tenho 41 anos e já vou ser um aposentado. Fui muito feliz. Muito mais feliz do que triste.
Legado
Olivinha começou no futebol. No condomínio onde morava, em Praça Seca, Zona Norte do Rio de Janeiro, tentou entrar no time e imediatamente foi jogado para ser goleiro por conta da altura. "Fiquei dois, três anos jogando no time do condomínio, fazia alguns torneios, mas nada demais. Com 10 anos, comecei no basquete", contou.
O principal espelho para a entrada no basquete foi o irmão, Olívia, que jogou uma Copa do Mundo em 1994 e uma Olimpíada em 1996. Os dois são separados por nove anos e foi acompanhando o mais velho que Olivinha se apaixonou pelo esporte. De tanto acompanhar, o treinador, Miguel Ângelo da Luz, perguntou se ele queria começar a jogar. A partir daí não teve mais volta.
Quando perguntado sobre o legado que deseja deixar, parou e pensou:
Essa pergunta aí é difícil. Por todos esses anos que passei aqui, todas as conquistas, talvez o maior legado que deixo aqui seja de não desistir em nenhum momento. Me entreguei até o final. Não sou o melhor jogador, não sou o mais alto, não sou o mais forte, não sou o cara que pula mais alto, mas eu sou o cara que coloca mais disposição dentro da quadra. Isso é um legado que eu gostaria de deixar.
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Fica alguma frustração?
"A única coisa que eu não ganhei com o Flamengo foi uma Liga Sul-Americana. Batemos na trave. Mas não é nenhuma frustração nem nada. Tenho um orgulho absurdo da minha carreira aqui. Só tenho agradecimentos a fazer, uma gratidão gigante pelo clube ter me dado a oportunidade de começar a minha carreira aqui e terminar aqui."
Qual foi o pior momento da carreira?
"E as frustrações... não diria frustração, mas as lesões. Tive algumas lesões que me impossibilitaram de jogar. Quando a gente foi campeão da Champions, eu participei do campeonato todo, menos da fase final, por estar lesionado. Isso aí me machucou um pouquinho, mas, fora isso, zero arrependimento, zero frustração, só gratidão."
Flamengo passou por uma mudança grande nos seus anos. Como foi viver isso?
"Vivi todas as épocas do Flamengo. Das vacas magras eu estava aqui e agora a gente está em outro patamar, como diz o Bruno Henrique. Tenho muito orgulho do que a modalidade se tornou. O investimento que é feito não tem nem comparação com o de antigamente, toda a estrutura. Quando eu comecei, quase ninguém queria jogar no Flamengo. Hoje em dia, todos querem. Atletas inclusive da Europa, da NBA. Todo ano são oferecidos. Realmente, o projeto foi levado muito a sério. Sou um privilegiado."
Faltou alguma coisa na seleção?
"Fui convocado durante sete anos, de 2009 até 2016 eu estava sempre na lista. Cheguei no limite. Fiz o máximo. Tinha meus sonhos com a seleção brasileira, primeiro ser convocado. Realizei. Meu irmão jogou uma Olimpíada, isso aí era uma coisa que eu gostaria de ter realizado, mas não consegui, e nem jogar uma Copa do Mundo. Mas pude jogar com a camisa do Brasil, isso é um orgulho. Foram sete anos, pude conquistar uma Copa América e uma medalha de ouro no Pan-Americano, em Toronto, em 2015. Isso aí já me conforta."
E o futuro?
"Sendo bem sincero, eu ainda não parei para pensar realmente o que eu vou fazer. Tenho algumas opções na mesa, mas a minha cabeça e o meu foco está total dentro da quadra nesse momento [o Flamengo ainda faria o jogo 4 da final do NBB contra Franca]. Quando a temporada acabar vou tirar um tempinho, um mês para curtir com a minha família. Minha vida toda eu perdi muita coisa para me dedicar por completo ao basquete. Se eu puder ficar um pouco mais em casa, um pouco mais próximo da minha família e curtir muitos momentos com elas, é o que eu vou querer fazer nesse momento. Depois disso, vou sentar, conversar com eles, mostrar o que eu tenho e aí eu vou direcionar o que eu vou fazer. Mas nesse momento eu ainda não tenho nada definido."
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