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Ex-preparador fala após dispensa da seleção feminina de basquete: 'Censura'

Diego Falcão foi bicampeão pan-americano com a seleção brasileira feminina de basquete (2019 e 2023) Imagem: Reprodução/Instagram/diegomfalcao

Do UOL, em São Paulo

26/06/2024 13h38

Diego Falcão, agora ex-preparador físico da seleção feminina de basquete, falou pela primeira vez sobre sua dispensa após fazer posts antiaborto nas redes sociais.

O que aconteceu

Falcão disse que esperou ser comunicado pela CBB (Confederação Brasileira de Basquete) sobre seu desligamento. Ele não tinha vínculo com a entidade por não ser um funcionário, e sim prestava serviço durante os períodos de convocação.

O preparador físico afirmou que uma diretora o informou que ele não seria mais convocado pelo clima criado por ele. Relatou que Roseli Gustavo ligou para ele na noite do último sábado (22), após a repercussão da dispensa.

Ele citou intolerância religiosa e censura na medida tomada pela entidade. Falcão publicou um vídeo de dez minutos sobre o episódio nas redes sociais e se descreveu como um católico apostólico romano e "pró-vida".

Hoje sou eu, amanhã pode ser você a ser retirado por uma liberdade de expressão. E isso muito me preocupa porque é censura, vou saber e preciso saber quem é o responsável.

sei que existem pessoas responsáveis pela minha demissão, mas me calar, nunca. Censura não pode, Brasil é um país democrático. Fica aqui a minha tristeza, foi quebrado um objetivo, um sonho de medalha olímpica. A intolerância venceu o esporte, mas vamos seguir. Diego Falcão

O que ele disse

Posts sobre aborto: "Infelizmente, algumas atletas começaram a interpretar de forma completamente errada o entendimento dos posts e jogaram na internet o meu nome de forma negativa. Postei única e exclusivamente sobre o pró-vida de forma que eu sempre fui. Mesmo trabalhando na CBB esse tempo todo, nunca houve problema. Por que agora?"

Comunicado sobre a dispensa: "Fiquei sabendo [da dispensa] no sábado junto com todos vocês, pela internet, que eu não seria mais convocado. Fiquei sem entender e esperei alguém da CBB se pronunciar. À noite, a diretora Roseli Gustavo me ligou, ela trabalhava diretamente comigo. Fui perguntar o que estava acontecendo. Ela falou que eu estava fora da CBB pelo clima que eu criei. Eu perguntei qual clima. Ela falou que eu sabia. Perguntei se teria falhado profissionalmente, ela disse que não, perguntei se teria falhado de forma pessoal com alguma atleta, ela disse que não. Ela disse: 'As meninas não se sentem mais a vontade de trabalhar com você'. Eu disse que ir por esse lado é muito difícil porque a intolerância religiosa está vencendo o profissionalismo. Acho que nem no esporte nem no Brasil pode ser assim".

Trabalho na seleção: "Estamos desde 2019 organizando o basquete feminino do brasil de maneira reta e direta, metodologia desportiva. A Única variável que a gente convoca as atletas e de rendimento é a percepção da quadra. Nunca houve, nem no ambiente nem em qualquer lugar da CBB, no nosso trabalho, nenhuma divergência política, social ou religiosa. Até porque quando a gente fala de treino, de seleção brasileira, a gente coloca o uniforme pensando em uma coisa só: resultado esportivo. Nunca é levado em conta nada que não seja o resultado esportivo. Sabemos que no esporte existem todas essas divergências, culturais, sociais e religiosas, nós precisamos isentar isso. nosso trabalho há seis anos é de maneira reta, honesta e direta, evoluir o basquete feminino, que é o que acho que ficou à parte em toda essa confusão.

Posicionamento: "Nesses seis anos que trabalho com o basquete feminino, sempre fui católico apostólico romano. Tenho nas minhas redes sociais muitos posts falando pró-vida, sempre defendi essa causa, e isso nunca foi uma variável para eu tratar alguém bem ou mal. Pelo contrário, sempre respeitei opiniões diferentes da minha, mas eu sempre defendi, com unhas e dentes, a minha posição. Sempre tive uma ideologia pautada no Evangelho. Fico muito preocupado com o lado que o esporte está indo.

Censura e intolerância: "Hoje sou eu, amanhã pode ser você a ser retirado por uma liberdade de expressão. E isso muito me preocupa porque é censura, vou saber e preciso saber quem é o responsável. Ainda não consegui falar com o presidente da CBB, que é uma pessoa do bem, e não sei até que ponto ele conhece tudo o que está acontecendo. Mas sei que existem pessoas responsáveis pela minha demissão, mas me calar, nunca. Censura não pode, Brasil é um país democrático. Fica aqui a minha tristeza, foi quebrado um objetivo, um sonho de medalha olímpica. A intolerância venceu o esporte, mas vamos seguir".

Dispensa após polêmica

O profissional foi dispensado pela CBB (Confederação Brasileira de Basquete) após pedido do grupo de jogadoras. Ele foi informado de sua dispensa em projetos futuros. Falcão não era um funcionário da entidade, portanto não tinha vínculo, e prestava serviço durante as convocações da seleção feminina, mas agora não será mais chamado.

O UOL apurou que a entidade tomou a decisão não pelo preparador ter manifestado sua opinião, e sim por ter criado um "clima insustentável". Ele vinha trabalhando nos projetos da equipe desde 2019, quando José Neto assumiu como treinador, e participou da conquista do bicampeonato nos Jogos Pan-Americanos. Toda a comissão técnica da seleção é paga pelo COB nos períodos de treinos e competições, quando atua com as jogadoras.

As postagens do preparador causaram uma "quebra de confiança" com as atletas da seleção. As jogadoras pediram à direção do feminino a saída de Falcão, que não será mais parte da equipe técnica nas próximas convocações.

Algumas delas fizeram críticas públicas ao posicionamento de Falcão. Nas redes sociais, o profissional compartilhou mensagens de cunho religioso e contrárias ao aborto, inclusive em caso de estupro, além de um testemunho da mãe de Cristiano Ronaldo.

É inaceitável que um profissional que trabalha com o feminino demonstre esse tipo de posicionamento nas redes sociais. O estupro é um crime grave e é fundamental que as mulheres tenham o direito de decidir e expressar sua opinião sobre isso. Damiris Dantas

Uma coisa que fica muito difícil de engolir é que o post não estava falando sobre vida, mas sobre morte psicológica através de uma violência, que é o estupro. Morte psicológica pensando nas que sobrevivem, porque muitas morrem. É triste porque é difícil entender que tem pessoas desse tipo trabalhando com o basquete feminino. Clarissa dos Santos

A CBB não irá se manifestar sobre o caso. Na próxima convocação, um outro preparador físico será chamado no lugar de Falcão. A seleção feminina não se classificou para os Jogos Olímpicos de Paris e voltará à quadra somente em agosto, no pré-classificatório para a Copa do Mundo da modalidade, em 2026.

O UOL tentou contato com Diego Falcão, mas não teve retorno. O texto será atualizado em caso de resposta.

Quem é Diego Falcão. Nasceu em João Pessoa, na Paraíba. Deixou a paraíba em busca de ser campeão olímpico. Não conseguiu ser atleta por "não ter capacidade técnica", em suas palavras, e decidiu ir para o caminho dos estudos. Em São Paulo, começou sua carreira. Participou dos últimos cinco cilos olímpicos.

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