A Premier League — liga inglesa de futebol — trocará o VAR (árbitro de vídeo ou video-assistant referee, na sigla em inglês) por um "time de iPhones" para a sua temporada 2024-2025 que começa nesta sexta (16). A informação é da revista de tecnologia "Wired", que teve acesso exclusivo ao novo sistema.
Para determinar impedimentos ou checar outros lances duvidosos, a liga usará uma série de câmeras de celulares em múltiplos ângulos que capturarão quadro a quadro o que acontece em campo.
Este sistema, conhecido como "Dragon", fornecerá as imagens a cerca de uma dúzia de smartphones.
Quem gerencia o novo sistema é a Genius Sports e sua subsidiária, a Second Spectrum, conhecidas pelo rastreamento ótico e análise de dados que oferecem à NBA (liga norte-americana de basquete).
Os iPhones serão equipados com o software do "Dragon", que deverá usar inteligência artificial para processar dados visuais coletados pelas câmeras.
Caso funcione, a mudança poderá ser adotada em outros esportes, em que seus árbitros, times e torcedores também se disseram frustrados com os atrasos e erros de processamento humano oferecidos pelo atual VAR — como ocorreu na Premier League.
Como funciona
O "Dragon", segundo a Genius, usará ao menos 28 câmeras de iPhone, inicialmente, em cada estádio dos jogos da Premier League.
Todo o sistema aproveitará as câmeras já existentes em modelos de iPhone 14 ou mais recentes, que estarão protegidos por capas à prova d'água customizadas com ventiladores para evitar o seu superaquecimento.
Os aparelhos estarão ligados a uma rede de energia — para que a bateria não acabe no meio do jogo.
Cada "estação" concebida pela Genius deverá acomodar até quatro telefones juntos.
Uma vez posicionados ao redor do campo, eles capturarão um fluxo contínuo de vídeos em múltiplos ângulos.
Estas estações poderão ser movidas para mudar as áreas de coberturas e se adaptar à estrutura do estádio, mas normalmente ficarão estáticas durante as jogadas para garantir boa cobertura ou evitar problemas de recalibração bem no momento do lance.
Assim, o sistema deverá oferecer capacidade de rastrear de sete a 10 mil pontos/posições de cada jogador, a todo momento.
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Quero receber"Você vai de 30, 40, 50 pontos de dados em um jogador para [a capacidade] de realmente rastrear os contornos do corpo", explicou à revista o vice-presidente executivo de parcerias de esporte e tecnologia da Genius, Mike D'Auria.
Ou seja, massa muscular, diferenças de estrutura esquelética e até o jeito de andar do jogador poderão ser usados para uma recriação virtual dos lances e tomadas de decisões mais precisas em campo.
Qual é o problema com o VAR
Durante uma disputa por bola, passe ou qualquer outro tipo de lance, é possível que jogadores se "amontoem" nas imagens capturadas — o que dificulta o trabalho atual do VAR.
O perrengue é conhecido por especialistas como "oclusão", ou seja, jogadas que não se encontram totalmente visíveis pelo árbitro de vídeo e que exigem que o time que opera o sistema acabe dando apenas palpites com base nos dados disponíveis.
O sistema utilizado na Copa do Mundo de 2022, por exemplo, usava entre 10 e 15 câmeras, além de um sensor dentro da bola para rastrear as jogadas.
Ou seja, a capacidade daquele VAR de eliminar ou limitar a oclusão seria, teoricamente, reduzida em relação ao novo Dragon.
"Apesar de todas as polêmicas, acredito que o VAR esteja sendo de extrema importância para a história e a cultura do futebol. Ele cruza a fronteira da subjetividade de decisões e nos sugere que possam ser objetivas. Se a gente não consegue resolver o que tanto nos angustia, pelo menos os esforços de melhorar o VAR vêm expondo o futebol a um aumento de transparência. Primeiro foi o próprio VAR em si. Depois, vieram os replays exibidos para os torcedores. Depois a necessidade de explicar pra todo o estádio. Veio também a liberação dos áudios dos árbitros", afirma Bruno Maia, CEO da Feel The Match, especialista em inovação e inovação e tecnologia no esporte, que complementa.
"Agora vemos na Premier League esse canal de acompanhamento quase em tempo real. A gente pode não estar vendo, mas isso afeta profundamente a cultura de quem consome o jogo. A exigência por essa transparência vai provocar muitas transformações a longo prazo no esporte, além das que já vemos. É muito bom ver que, em vez de abrir mão da tecnologia, a PL se debruçou sobre como melhorá-la e, assim, acaba melhorando o esporte e as formas de consumo", complementa.
Um 'gêmeo digital' do craque
A maior parte das transmissões hoje capturam 50 ou 60 quadros por segundo. Caso cumpra o que promete, o Dragon será capaz de capturar até 200 quadros por segundo.
Como você já leu até aqui, ele deverá reduzir os "pontos cegos" dos lances.
Mas a sua suposta vantagem não está apenas no uso dos relativamente baratos iPhones no lugar de caros cabos de fibra ótica: o sistema de inteligência artificial fornecerá uma malha de dados óticos, ou seja, não apenas entregará a imagem, mas a "traduzirá" em tempo real.
Ou seja, o programa da empresa deve "aprender" com as imagens coletadas para oferecer informações mais precisas de cada lance do jogo, uma tecnologia que já de foi aplicada ao basquete.
Ampliar a necessidade de cobertura pode ser feita de maneira mais simples, com mais telefones, o que possibilitaria a certa altura criar um "gêmeo digital" de cada jogador com imagens e informações sobre posição em cada movimento do corpo no campo.
Atualmente, esta tecnologia é utilizada por videogames e animações em Hollywood, mas pode se traduzir para o esporte em um futuro não tão distante.
Imagina só uma transmissão de jogo com óculos de realidade virtual ou o narrador dando estatísticas em tempo real da jogada?
Próximas jogadas
A Premier League e a próxima Genius se recusaram a entregar à revista Wired os dados de testes do sistema Dragon em comparação com o VAR.
A alegação seria que comparações com sistemas anteriores são complicadas devido à diferença nas quantidades e qualidade dos dados disponíveis de cada um.
No entanto, a Genius diz que testa o Dragon há anos, em diversos formatos, em estádios da Premier League e outros.
"Passamos por extensos testes. O sistema Dragon é validado pela Fifa. Eles fazem testes em que os jogadores usam um Vicon [sistema de captura de movimento] e nós os rastreamos e comparamos os dados procurando por erros. Passamos por cinco ou seis destes", afirmou Mike D'Auria.
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