Ela largou a aposentadoria e, aos 50 anos, lidera ranking do tênis de mesa
Valesca Maranhão já havia aposentado as raquetes quando aceitou o convite para ser comentarista do Grupo Globo nos Jogos Olímpicos de Tóquio. Em meio ao desafio que surgiu em seu horizonte, acompanhou os jogos do outrora pupilo Hugo Calderano — principal nome da modalidade atualmente —, e viu reacender uma chama. Ela voltou à mesa e às competições. Hoje, aos 50 anos, tornou-se a atleta mais velha a liderar o ranking nacional.
A mesa-tenista ficou sete anos longe, e o retorno aconteceu em 2022. Na atual temporada, conquistou cinco torneios "Challenge" no Absoluto A, principal categoria da modalidade.
Fiquei sete anos parada. Quando você vê que conseguiu realizar uma coisa que sonhava, é muito bacana. Vê que uma pessoa da minha idade é extremamente ativa e consegue estar no alto rendimento, saber que posso ser espelho de muitas outras mulheres, até na questão de saúde mental, é muito importante.
Valesca Maranhão
Em abril, no TMB Challenge Plus do Rio de Janeiro, Valesca venceu, por exemplo, Laura Watanabe, de 20 anos e que integrou a seleção brasileira nos Jogos Olímpicos de Paris.
Valesca havia tomado a decisão de "pendurar a raquete" em 2015, mas o cenário mudou em 2021. A vontade de sentir novamente a adrenalina das competições surgiu enquanto atuava em outra função, mas também ligada ao tênis de mesa.
Eu comentei as Olimpíadas de Tóquio e assisti a muitos jogos. Fiquei ali imersa em uma competição muito grande, de alto rendimento, que bateu aquele friozinho, a vontadezinha de voltar. Pensei: 'Será?'. Comecei a analisar e conversar sobre isso.
A atleta, que é filiada ao Faspar Niterói, tem um projeto social no Parque Esportivo do Caramujo, em Niterói, e foi a partir daí que encontrou o apoio para voltar. "Eles me abraçaram de tal forma que eu fiquei muito feliz. A Secretaria de Esporte me ajudou e, então, resolvi voltar".
Retomar a rotina de competições aos 48 anos, logicamente, gerou dúvidas. "Será que o corpo vai responder?", Valesca se questionou, mas, aos poucos, quebrou barreiras. Alguns meses depois, estava preparada física e mentalmente.
É difícil estar muito tempo parada e tem a questão da idade, de você ter a paciência de voltar. Foi uma imersão muito grande para eu poder voltar a ficar, realmente, apta. Demorou uns seis meses para fazer novamente todos os treinamentos. Muitas questões passaram pela minha cabeça. Eu, realmente, tinha muitas dúvidas, mas eu fui me preparando mentalmente, o trabalho foi sendo feito e fui vendo que podia.
Valesca fez parte de uma geração que teve ícones do tênis de mesa brasileiro, como Cláudio Kano — de quem era admiradora e se tornou amiga — e Hugo Hoyama. Em uma época que as mulheres não tinham tanto espaço, e investimento, no esporte, deu passos como a disputa do Pan-Americano de Mar del Plata, em 1995, e do Mundial na China, no mesmo ano.
Na caminhada no tênis de mesa, assumiu a função de técnica, e foi uma das primeiras treinadoras de Hugo Calderano, que já foi terceiro melhor do mundo — atualmente é o sétimo — e detentor da melhor marca brasileira em Jogos Olímpicos, com a semifinal em Paris.
Nos Jogos de Tóquio, ela conta que teve de se conter ao comentar os jogos do antigo aprendiz. E, agora, foi ele quem a inspirou. "No estúdio, comentando um atleta que você treinou, é até meio complicado conseguir manter o profissionalismo (risos), Mas ver o Hugo atuando naquele nível foi, realmente, uma grande inspiração para voltar a jogar".
O que mais ela falou?
Quais os próximos objetivos? Pensa em ir a competições como Pan e Olimpíadas? "Ainda vou pensar no que eu vou fazer. Acredito que ainda jogue no ano que vem, mas a confederação poderia ser um pouquinho mais inclusiva nessa questão dos atletas mais velhos. Repensar algumas coisas [vagas disputadas em seletivas, como era anteriormente]. Tenho vontade de, de repente, voltar à seleção. Vamos ver".
Você foi treinadora do Hugo Calderano. Ele já demonstrava ser muito diferente. "Fizemos um trabalho de dois anos juntos, e sempre percebi essa diferença, era fora da curva. Ele tinha um aprendizado muito diferenciado, e sabia que ele iria ser um dos tops mundiais. Eu nunca tinha visto isso em um jogador de tênis de mesa brasileiro, até então. Ele sempre foi muito obstinado, tanto na parte mental quanto na parte física. Sempre queria um treino a mais, e também da parte talentosa, intelectual. Era um jogador que tinha um 'efeito esponja', às vezes, viajava para outros lugares e vinha com coisa nova. Acho que ele tem muita coisa ainda para apresentar e muitas alegrias para dar para o Brasil".
O que mudou no tênis de mesa em sete anos? "Houve algumas mudanças de materiais, por exemplo, mas eu vinha acompanhando bastante. Até por causa das aulas que eu dou [no projeto social], conversas. Nunca me afastei totalmente do tênis de mesa. Até mesmo para ser comentarista, você tem de estar bastante por dentro do que está acontecendo no esporte. O que eu senti muita diferença foi nas mídias sociais. Essa questão de acontecer uma coisa aqui e rapidamente já está todo mundo sabendo, essa visibilidade, patrocinador... Isso, realmente, acho que melhorou muito para o esporte e para os atletas".
Esperava resultados tão breves neste retorno? "Quando voltei a jogar e tive o apoio do meu estafe, conversávamos muito sobre resultado. Eu sou uma pessoa que quero resultado 'para ontem', mas, realmente, foi muito rápido. Não esperava que fosse assim. O treino requer tempo e o tênis mesa do Brasil tem muitas jogadoras talentosas. É difícil de jogar porque são muitos estilos diferentes, então você tem que estudar bastante. Não esperava que fosse tão rápido, mas estou muito feliz".
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