Equipe de Bia e Stefani, Rede Tênis Brasil monta 'dream team' e vira motor do tênis brasileiro

O que as tenistas Beatriz Haddad Maia, Luisa Stefani e a adolescente Victoria Barros têm em comum, além do recente sucesso pelas quadras do mundo? O trio de tenistas brasileiras têm em suas trajetórias o apoio da equipe Rede Tênis Brasil (RTB), entidade sem fins lucrativos que só perde para a Confederação Brasileira de Tênis (CBT) em investimentos e apoio na modalidade nacional nos últimos anos.

Bia Haddad, semifinalista em Roland Garros, e Luisa, medalhista olímpica nos Jogos de Tóquio, foram incorporadas pelo projeto nos últimos anos. Foi na equipe do RTB que elas buscaram seus últimos treinadores. Um dos responsáveis pela grande fase de Bia, Rafael Paciaroni entrou na equipe da tenista quando ela foi integrada ao RTB. Luisa, por sua vez, atuou até o mês passado com Léo Azevedo, um dos maiores técnicos do Brasil e que foi promovido a head coach do grupo recentemente.

A atual número 11 do mundo e a medalhista olímpica são hoje a ponta do iceberg de uma das maiores entidades ligadas ao tênis brasileiro nos últimos anos. Atualmente, o RTB só perde para a CBT em termos de cifras, mas já supera a entidade em número de funcionários e atletas envolvidos diretamente na modalidade.

O orçamento deste ano deve passar de R$ 9 milhões, segundo o diretor do RTB, Raphael Barone. A expectativa é repetir a dose em 2024. "Esse valor é totalmente voltado para ações diretas ligadas ao tênis, não inclui gastos com parte administrativa. Apenas contratação de treinadores, aluguel de quadra, compra de material esportivo, apoio em competições", explica o diretor em entrevista ao Estadão.

Para efeito de comparação, a CBT tem orçamento de R$ 25,8 milhões para este ano, com recursos do governo federal e patrocinadores. No total, emprega 19 funcionários com vínculo CLT. No RTB, são cerca de 100 contratados, 80 somente voltados para o trabalho com tenistas e atletas em potencial. Estão aí também professores de português e matemática para reforços das crianças atendidas pelo projeto.

Na prática, o Rede Tênis Brasil atua nas duas pontas, da base até o tênis de alto rendimento. Na ponta inicial, atende 20 mil crianças ao longo do ano, em parcerias com escolas públicas. Trata-se do que Barone batizou como "massificação do tênis". O objetivo é dar apoio social a crianças de baixa renda e, ao mesmo tempo, criar oportunidades para que surjam futuros campeões no futuro.

Ele compara o tênis com o surfe, modalidade em que o Brasil se tornou dominante nos últimos anos. "Para termos uma 'brazillian storm' do surfe no tênis, precisamos passar pelo investimento na base, tem que ter o processo e uma metodologia. Precisamos começar pela base. E isso não se faz do dia para a noite. É um processo longo."

Um destes frutos do processo de massificação já começa a vingar. A brasileira Victoria Barros, de apenas 14 anos, fez parte do projeto em Natal (RN), quando era criança. No fim de 2022, se desligou do RTB para alçar voo mais alto. Hoje treina na academia de Patrick Mouratoglou, ex-técnico de Serena Williams, na França. Para Léo Azevedo, em recente entrevista ao Estadão, a menina já é uma das melhores do mundo em sua faixa etária.

O próximo passo do RTB é elevar o nível técnico tanto do seu time de elite, que tem Bia e Luisa como referências, quanto da massificação. Para tanto, vem contratando profissionais de peso no circuito. Um deles é o espanhol Jose Higueras, um dos treinadores mais consagrados do mundo. Foi técnico de lendas como o suíço Roger Federer, além do americano Michael Chang, Jim Courier e Carlos Moyá, todos campeões de Grand Slam.

"Já conheci vários projetos em diferentes países. E, em geral, o que vi foi pouca paciência e falta de tempo para desenvolver os jogadores. Neste projeto, temos um tempo maior para trabalhar", comentou Higueras à reportagem. "O importante é termos um programa que desenvolva bons jogadores e que forme uma base para aproveitar os talentos que vão sair. Com sorte, podemos ter um que venha a ganhar Grand Slam."

Na parte técnica, o RTB também incorporou os ex-tenistas Teliana Pereira e Thiago Alves, promoveu Paciaroni, técnico da Bia, a consultor estratégico. E contratou o pesquisador americano Mark Kovacs, um dos acadêmicos que mais produz estudos científicos sobre tênis no mundo - já atuou com o Cleveland Cavaliers na NBA e na federação de tênis dos EUA.

O time multidisciplinar buscou ainda reforços no Comitê Olímpico do Brasil (COB), como o médico Rodrigo Sasson e a psicóloga Carla Di Pierro, especialista em esportes e que já vinha trabalhando isoladamente com Bia Haddad.

APOIOS DE PESO

O RTB surgiu pouco antes do início da pandemia tendo como embrião o Instituto Tênis, entidade sem fins lucrativos lançada em 2002 que teve o empresário Jorge Paulo Lemann como um dos fundadores. O bilionário, ex-tenista que já defendeu Brasil e Suíça na Copa Davis, sempre foi entusiasta do tênis.

Com as mudanças no RTB, Lemann deixou as funções consultivas, mas continua próximo do grupo, principalmente abrindo portas e fazendo contatos em benefício da entidade. Não por acaso o Rede Tênis Brasil conta com patrocinadores de peso, caso de Itaú, Vale e Ambev. No total, são 30 apoiadores, quase todos através da Lei de Incentivo ao Esporte.

COMO ENTRAR NO TIME RTB?

O sucesso recente dos seus principais tenistas gerou um holofote sobre o grupo, que vê aumentar as demandas para ampliação. No momento, o seu time de elite tem 25 tenistas, a maioria menores de 18 anos. Os mais velhos são justamente os profissionais. Além de Bia e Luisa, há Matheus Puccinelli, Matheus Alves e João Lucas Reis, todos já com pontos no ranking da ATP.

"Seria ótimo se tivéssemos mais tenistas, quem sabe 40 ou 50, mas precisa de sustentabilidade econômica. O custo disso é alto. É melhor apoiar poucos e fazer isso bem feito do que tentar apoiar muitos e fazer muito pouco", explica Barone.

O chamado Time RTB começa a partir dos 13 anos e há critérios e metas para entrar e se manter no grupo. Os objetivos são trabalhados individualmente, sempre com avaliações trimestrais. "Nossas metas são sempre de longo prazo. E começam pela massificação. Com o projeto, as crianças têm acesso ao tênis desde cedo. Vamos formar uma base e dividimos tudo por fases", diz o diretor.

A fase 1 é a da escola pública, onde as crianças têm o primeiro contato com raquetes e bolinhas. Na número 2, é hora de levá-las para a quadra. A terceira é a pré-equipe, num processo de seleção, tanto do ponto de vista técnico quanto de comportamento. Se a criança ou adolescente cumprir estes itens, entra na fase 4, que é o pré-Time RTB, com tenistas de 11, 12 anos. Os garotos e garotas que se destacarem entram na elite, com chance até de virem a treinar e trocar experiências com Bia, Luisa e os demais profissionais.

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