Londres 2012: Pressão por presença feminina na Olimpíada desafia países conservadores
O Comitê Olímpico Internacional (COI) está trabalhando para convencer países que nunca tiveram atletas mulheres em suas delegações olímpicas a incluí-las nos Jogos de Londres 2012.
A ideia é fazer com que a Olimpíada deste ano seja a primeira a contar com a presença feminina nas delegações esportivas de todos os 204 países participantes dos Jogos.
A questão é sensível para três países que nunca tiveram mulheres competindo em Olimpíadas – Arábia Saudita, Brunei e Catar.
No caso do Catar – que vai sediar a Copa do Mundo de 2022 e quer ser sede da Olimpíada de 2020 -, três mulheres já se qualificaram para os Jogos de Londres, nas modalidades de tiro, nado e corrida, o que foi louvado em comunicados oficiais do país. Este também prometeu construir um centro de treinamento de alta performance para atletas femininas em Doha.
A questão é mais sensível, porém, no que diz respeito à Arábia Saudita e a Brunei.
Nas últimas semanas, o chefe do comitê olímpico saudita, Nawaf Bin Faisal, afirmou em coletiva que, apesar dos apelos do COI, o país oficialmente não enviará atletas mulheres às Olimpíadas britânicas.
O comitê olímpico do país "não vai endossar a participação feminina no momento", afirmou Faisal.
Ressaltou, porém, que tampouco impedirá que atletas possam competir de maneira independente, mas que estas serão orientadas a "não violar a sharia (lei islâmica)".
Já Brunei ainda não deixou claro se levará atletas mulheres a Londres.
O presidente do COI, Jacques Rogge, afirmou no último fim de semana que o órgão está "em discussão" com o comitê saudita para pleitear pela participação de mulheres nos Jogos de Londres e que "ainda é cedo para chegar a conclusões".
Arábia Saudita
A posição da Arábia Saudita provocou uma grita entre ativistas, que citam o histórico ruim do ultraconservador país árabe na questão de direitos femininos - as mulheres sauditas são proibidas de estudar, trabalhar ou ter acesso a serviços de saúde sem a permissão de um "guardião masculino", critica a ONG Human Rights Watch.
A ONG preparou um relatório chamado "Let Them Play" (Deixem-nas competir, em tradução livre), dizendo que "não é suficiente" que a Arábia Saudita não impeça suas mulheres de competir de maneira independente em Londres 2012.
"O país não oferece educação física para meninas em escolas públicas, e apenas homens entram em clubes desportivos ou trabalham com treinadores profissionais. Na prática, as restrições do governo às mulheres as banem de todos os esportes", diz o relatório. "Negá-las a chance de competir contrasta com os princípios olímpicos, que afirmam que a prática do esporte é um direito humano."
Outra ONG britânica chegou a pedir a expulsão da Arábia Saudita do Comitê Olímpico Internacional, evocando decisão anterior do órgão, que excluiu o Afeganistão dos Jogos de Sydney-2000, entre outras razões, por conta da discriminação feminina promovida pelo regime do Talebã.
Do seu lado, o COI tem posição contemporizadora. Em e-mail à BBC Brasil, o órgão diz que os comitês políticos locais estão sendo "estimulados" a manter o espírito universal e não-discriminatório dos Jogos Olímpicos.
"O COI não dá ultimatos ou prazos (aos países), e sim acredita que muito pode ser conquistado por meio de diálogo", diz o organismo, agregando ter mandado à Arábia Saudita uma lista de potenciais atletas olímpicas locais que poderiam tentar obter índice olímpico. O COI também lembra que o país incluiu mulheres na delegação dos Jogos Olímpicos da Juventude, em Cingapura, no ano passado.
"As conversas com o comitê saudita estão em curso, e estamos todos trabalhando para garantir a participação das mulheres sauditas em Londres", informa o COI. Uma reunião a respeito será realizada em maio, no Canadá.
Estrutura
Dentro do país, segundo a imprensa local, a pressão internacional provocou reações diversas.
Artigo publicado no jornal Saudi Gazette defende que a Arábia Saudita "tem o direito de selecionar os atletas que quer que a represente, sem receber ordens".
Entrevistada pelo jornal, a cofundadora do grupo Jeddah United, que promove a prática desportiva entre mulheres sauditas, disse que a questão vai além da permissão governamental: sem estrutura, o esporte feminino não tem como florescer no país a ponto de se formarem atletas olímpicas.
"Precisamos de ações sérias para desenvolver atividades físicas em escolas de meninas e criar empregos para elas no comitê olímpico saudita, para preparar equipes profissionais", declarou Lina Al Maeena.
No momento, a atleta saudita mais cotada para uma eventual participação em Londres 2012 é a amazona Dalma Rushdi Malhas, medalhista nos Jogos da Juventude. Por enquanto, porém, ela só poderia participar das Olimpíadas por conta própria, sem o endosso de seu país.
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