Momentos olímpicos: Bronze fez Vanderlei Cordeiro esquecer momento inusitado em 2004
Ao entrar no Estádio Olímpico de Atenas em 2004, ovacionado por milhares de torcedores, e ganhar a medalha de bronze, o maratonista brasileiro Vanderlei Cordeiro de Lima tinha deixado para trás um dos episódios mais inusitados da história das Olimpíadas modernas.
No 36º quilômetro dos 42 da maratona, Vanderlei foi atrapalhado pelo ex-padre irlandês Cornelius Horan, que jogou-o ao chão e o fez perder uma vantagem de cerca de 30 segundos sobre os demais maratonistas. Mas a memória mais marcante de Vanderlei naquele 29 de agosto de 2004 não é o instante surreal em que foi derrubado pelo irlandês.
"Não tenho uma lembrança forte do episódio. A maior memória daquele dia foi a entrada no estádio olímpico. A conquista foi tão importante que esqueci que tinha sido atrapalhado lá atrás", diz Vanderlei à BBC Brasil. "Mesmo com aquilo, eu era a pessoa mais feliz do mundo."
A entrevista faz parte da série Momentos Olímpicos, em que a BBC Brasil vai relembrar os fatos mais marcantes da história brasileira em Olimpíadas.
Após o "ataque irlandês", Vanderlei passou de líder da prova a terceiro colocado. Perdeu a maratona para o italiano Stefano Baldini e para o eritreu naturalizado americano Meb Keflezighi.
Mesmo assim, sua medalha de bronze ainda é a melhor colocação do Brasil na história das maratonas olímpicas – e o atleta paranaense acabou sendo mais aplaudido, naquele dia, do que qualquer um de seus adversários.
‘Por que você não bateu no cara?’
Relembrando o momento, Vanderlei lamenta que o lado negativo da prova tenha ganhado mais destaque que o lado positivo. E diz que revidar contra o padre irlandês nunca foi uma opção.
"As pessoas lembram do fato de eu ter sido atrapalhado, não o meu mérito de estar liderando a prova", afirma. "Quando me abordam na rua, ainda me cobram: 'Por que você não bateu no cara?', como se eu tivesse que ter esse comportamento. Mas isso nunca passou pela minha cabeça."
Ele agrega que sua história de vida já o havia preparado "para lidar com mais uma provação" – em referência a seu passado de boia-fria no interior do Paraná.
Seu "espírito olímpico" – o fato de ter retomado a corrida após ter sido atrapalhado, além de sua épica entrada, de braços abertos, no estádio olímpico, para completar a prova – lhe rendeu uma medalha especial do Comitê Olímpico Internacional.
A condecoração, porém, não é mais importante do que o bronze que ele conquistou em 29 de agosto de 2004. "O bronze (simboliza) o que eu vivi ali, a emoção. A conquista você vive no momento."
‘Faltou humildade’
Vanderlei e o Comitê Olímpico Brasileiro chegaram a pleitear que ele também recebesse uma medalha de ouro, mas isso foi negado.
"O recurso não era para tirar o mérito (de Stefano Baldini), mas para que houvesse um reconhecimento de que faltou segurança na prova, que era responsabilidade deles (COI)", justifica Vanderlei.
Após a maratona, Stefano Baldini disse achar que teria vencido mesmo sem o incidente, já que Vanderlei vinha perdendo ritmo e sua diferença em relação ao segundo colocado vinha diminuindo. Mas, para o brasileiro, "faltou humildade" de seus adversários vencedores.
"Poderia ter acontecido com eles o que aconteceu comigo. E aí? Acho que eles subestimaram os concorrentes", disse.
Depois de Atenas-2004, Vanderlei se lesionou e não pôde competir para tentar o índice para Pequim-2008. No mesmo ano, anunciou sua aposentadora.
Hoje, aos 42 anos, o paranaense de Cruzeiro do Oeste ainda treina entre 8 km e 10 km por dia e apadrinha projetos sociais de formação de jovens atletas nos Estados de São Paulo e Paraná.
Em 31 de maio ele voltará a ficar sob os holofotes olímpicos, quando participará de uma das etapas do revezamento de 70 dias da tocha de Londres-2012 pela Grã-Bretanha.
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