Sobre Maria e sua raquete: as façanhas de quem conquistou até a realeza
Há 60 anos, a desconhecida Maria Esther Bueno pegou sua raquete e começou a viajar pelo mundo, para escrever seu nome na história do tênis. Era uma raquete só, mesmo, e não as dezenas que qualquer tenista profissional tem hoje. Também não existiam patrocínios milionários, nem estafe numeroso. Era Maria e sua raquete, para viver o esporte na sua essência.
Eu jogava pela honra, pela vontade de ser a melhor e de ser reconhecida!”
Quem a acompanhava de perto sabia, desde o começo, que a menina tinha um talento natural em uma modalidade pouquíssimo praticada no país – ainda mais entre as mulheres.
“Eu sentia bastante confiança em mim mesma. Achava que eu era diferente”.
Em 1954, Maria, com 14 para 15 anos, foi campeã brasileira. Três anos depois, conquistou o seu primeiro título internacional, o Orange Bowl, nos Estados Unidos.
As coisas melhoraram, e ela conseguiu uma segunda raquete.
Aí encontrou o seu local preferido para desfilar sua habilidade e técnica: a grama de Wimbledon, a catedral do tênis.
Entre os homens, a nossa grande referência no tênis é Gustavo Kuerten, o Guga, três vezes campeão em Roland Garros, um feito absurdo para um brasileiro.
Maria ganhou muito mais. Só em Wimbledon, foram oito títulos: três em simples (1959, 60 e 64) e cinco nas duplas (58, 60, 63, 65 e 66). Ela também se sagrou campeã na Austrália, nos Estados Unidos e em Roland Garros - foram 19 títulos de Grand Slam, no total.
Foi considerada a melhor tenista do mundo durante quatro temporadas.
Mas não pense que Maria ficou rica. "O prêmio de Wimbledon foram 15 libras em vouchers, para trocar por meia e munhequeira porque era totalmente amador. Não podia ter prêmio em dinheiro”, revela.
Reconhecimento até da realeza britânica
Aquele prestígio que Maria buscou ao sair de casa tão jovem para jogar tênis veio antes mesmo de ela completar 20 anos. No Rio de Janeiro, recebeu das mãos do presidente Juscelino Kubitschek a Medalha de Mérito Esportivo, logo após o primeiro título individual em Wimbledon, em 1959. Em São Paulo, desfilou em carro aberto do Corpo de Bombeiros. Também foi homenageada em Recife e Salvador.
Na Inglaterra, ficou conhecida como Maria Bueno. Também era chamada de Estherzinha pelos mais próximos. Ganhou o respeito da família real britânica e bateu bola com a princesa Diana e os príncipes William e Harry.
"Através do esporte, consegui muitas coisas que dinheiro não compra. Fui recepcionada pelo papa, meus aluninhos foram a princesa Diana e os dois príncipes. Estou na Enciclopédia Britânica, meu nome sempre foi mencionado nos melhores livros de tênis..."
Final foi tão rápida que o irmão não viu
Entre as histórias mais legais de Maria está uma peça que ela pregou no seu irmão Pedro. Foi sem querer, e o final foi feliz.
Pedro, dois anos mais velho, era seu grande companheiro nas aventuras pelo mundo do tênis. Na final do Aberto dos Estados Unidos, em 1964, estava lá para torcer pela irmã. Só que demorou para chegar ao local em que ficaria sentado e acabou não vendo o jogo.
Na verdade, não foi Pedro que demorou. Foi Maria que liquidou a partida em tempo recorde. Recorde literalmente, não força de expressão.
“Teve uma final que eu ganhei em 19 minutos. Está no livro dos recordes. Quando meu irmão chegou ao topo do estádio, depois de pegar a credencial, já tinha acabado. Foi 6-0 e 6-1, e esse 1 foi meio 'esquisitinho', senão teria sido 6-0 e 6-0. Foram 19 minutos, mas poderia ter sido 18”, sorri, ao lembrar do feito. Detalhe: a vítima foi uma norte-americana, que jogava em casa.
Por todas essas façanhas, pelos 589 títulos conquistados (em todas as categorias, desde o infantil), dá para dizer, sim, que Maria Esther Bueno foi a maior esportista brasileira de todos os tempos.
Pra mim é uma vitória pessoal muito grande, por ser mulher, principalmente, porque é mais difícil pra mulher. E por ser brasileira. Tenho muito orgulho de todas as minhas vitórias e dos meus 589 títulos”.
Maria Esther Bueno virou fã de Michael Phelps. Veja a entrevista na íntegra, gravada em agosto de 2015:
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