Alê Youssef

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Opinião

Divulgação do Carnaval de SP ignora blocos da cidade e vira piada nas redes

A comunicação do Carnaval de rua feita pela Prefeitura de São Paulo virou piada nas redes ao ignorar os blocos da própria cidade e entrar em uma polêmica desnecessária com outros grandes centros carnavalescos.

A arte postada apresenta uma foto do desfile do Galo da Madrugada — cortejo mega tradicional do Recife — que há alguns carnavais participa da folia paulistana na região do Parque do Ibirapuera. Com filtros que intensificam um céu azul e clareiam o asfalto, com dançarinos de frevo em primeiro plano, e a frase "Vai começar o maior Carnaval do Brasil". Veja só:

Uma das melhores características do Carnaval de São Paulo é receber de braços abertos diversos blocos do Brasil inteiro, e oferecer com isso uma diversidade muito interessante e gostosa.

Daniela Mercury, Baiana System, Bell Marques, Banda Eva — originais de Salvador —; Monobloco, Bangalafumenga, Sargento Pimenta, Orquestra Voadora, Fogo e Paixão, Bloco da Anita do Rio — tradicionais no Rio de Janeiro —; o próprio Galo, Bicho Maluco Beleza de Alceu Valença — expoentes do Recife — são apenas alguns exemplos de desfiles que acontecem na cidade todo ano.

Mas com todo e absoluto respeito por todos esses grandes blocos que aterrizam em São Paulo, simplesmente não da para entender porque os blocos originais da cidade — feitos por brasileiros de todos os cantos do país que vivem na pauliceia desvairada — não são valorizados e colocados em primeiro plano pela comunicação oficial.

Foram eles que, de fato, fizeram São Paulo se transformar. Antes do gigantesco e difuso movimento dos blocos paulistanos, que ocuparam na marra as ruas da cidade no Carnaval, São Paulo era outra. Sua cena cultural que sempre foi rica e diversa, se concentrava em espaços fechados, mas nas últimas décadas, ela se expandiu para o espaço público atrás dos trio elétricos desses blocos.

Por que não uma foto das maravilhosas percussionistas do Ilu Oba de Mim, das noivinhas do Casa Comigo, da gigantesca multidão do Baixo Augusta, da linda orquestra de metais da Charanga do França, do desbunde do Tarado ni Você, da capricho artístico do Explode Coração, do enorme fervo do Agrada Gregos, dos punks da periferia do Urubó, da tradição do Esfarrapado, da irreverência do Ritaleena, da rebeldia do Bastardo, da resistência do Jegue Elétrico, da força do Pagú ou da "montação" do Minhoqueens? São tantas imagens que poderiam estar ali no cartaz representando o incrível Carnaval paulistano.

Além disso, em vez de lacrar o "maior Carnaval do Brasil", gerando reações de cidades super tradicionais da folia e memes desagradáveis para quem luta e trabalha pelo Carnaval de São Paulo, a Prefeitura poderia sim se gabar de receber todos os carnavais do Brasil em uma única cidade.

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A festa é uma representação perfeita da capital cosmopolita e efervescente, que apesar de seus problemas crônicos, acolhe muita mais do que repudia quem decide passar a vida cruzando a Ipiranga com a São João.

A cidade que agora entende a importância cultural e econômica do Carnaval de rua, deveria valorizar — não apenas na sua comunicação mas em todos os sentidos — os verdadeiros protagonistas da festa e entender que em se tratando de Carnaval, não é necessário quantificar ou qualificar o melhor, o maior, mas, sim, exaltar as características de cada centro da folia.

Em São Paulo, com muito esforço e perseverança, com muita luta pelo direito à cidade e, claro, com muita coisa ainda para melhorar, foi construído pelos seus blocos, o Carnaval da diversidade.

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.