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Histórias do Mar

REPORTAGEM

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O dia em que uma simples privada afundou um submarino alemão, 77 anos atrás

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Imagem: Reprodução

Colunista do UOL

18/06/2022 04h00

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Até a Segunda Guerra Mundial, um dos maiores problemas dos submarinos eram os banheiros.

Mais especificamente a descarga dos vasos sanitários, já que não passava pela cabeça dos projetistas da época fazer buracos em um casco feito para ser hermeticamente fechado.

Até então, todos os dejetos eram mantidos a bordo dos próprios submarinos, acondicionados em pesados tanques, que ocupavam um espaço considerável — e espaço sempre foi algo precioso demais em qualquer submarino, sobretudo para ser gasto como simples depósito de... bem, você sabe o quê.

O que fazer com o cocô?

Foi então que os alemães inventaram um sistema de válvulas, que permitiria a entrada e saída de água do mar para os vasos sanitários dos submarinos, desde que eles estivessem próximos à superfície, onde a pressão externa era pequena.

Era uma boa saída — literalmente. Mas a limitação da profundidade deixava os submarinos da Alemanha nazista perigosamente expostos aos ataques inimigos, durante os procedimentos de esvaziar os tanques de dejetos no mar.

Descarga revolucionária

Até que, quase ao final da guerra, os alemães aperfeiçoaram o sistema de descarga dos vasos sanitários dos Uboats, para uso, também, em grandes profundidades.

Histórias do Mar :: submario alemão, Karl Adolf Schlitt - Reprodução - Reprodução
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Foi uma revolução no setor e o primeiro submarino a ser equipado com o inédito sistema — que consistia em uma complicada combinação de válvulas internas e externas, que deveriam ser manuseadas praticamente ao mesmo tempo — foi o U-1206, lançado ao mar no final de 1944.

Histórias do Mar :: submarino alemão, Karl Adolf Schlitt - Reprodução - Reprodução
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Mas, só meses depois, em abril de 1945, a poucos dias do final da guerra, ele, finalmente, partiu para a sua primeira missão no Atlântico Norte, sob o comando do jovem capitão Karl Adolf Schlitt, que, até então, nunca comandara um submarino.

Histórias do Mar :: submarino alemão, Karl Adolf Schlitt - Reprodução - Reprodução
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E foi quando tudo aconteceu.

O comandante não sabia usar

A tripulação do U-1206 consistia em meia centena de homens, mas só alguns sabiam como manusear corretamente as válvulas do novo sistema de descarga do banheiro — e o capitão Schlitt não era um deles.

Histórias do Mar :: submarino alemão, Karl Adolf Schlitt - Reprodução - Reprodução
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Tudo transcorreu bem, até que, quando navegavam submersos, ao largo da costa da Escócia, a mais de 60 metros de profundidade, o comandante do submarino alemão precisou ir ao banheiro.

Mas ele só descobriu que era incapaz de operar as complexas válvulas da descarga da privada após ter feito suas necessidades.

Pediu ajuda e...

Apesar da constrangedora situação para um oficial da sua patente, o comandante Schlitt abriu a porta do banheiro e pediu ajuda a tripulação.

Um dos marinheiros, que conhecia bem o sistema, se prontificou a ajudar.

Mas, na pressa em atender ao capitão, o prestativo marinheiro se atrapalhou com os comandos, e abriu a válvula externa, que injetava água do mar no vaso sanitário, antes de fechar a interna, que evitava a inundação do banheiro, gerando uma inundação parcial daquela parte do submarino, que, no entanto, foi logo estancada.

Gases letais

Teria sido apenas um contratempo, não fosse outra característica do projeto daquela nova classe de submarinos: as baterias dos motores elétricos ficavam bem ao lado do banheiro que fora inundado. E, em contato com a água salgada, elas passaram a liberar um gás altamente letal, ainda mais em um ambiente sem ventilação, como são os submarinos.

Sabedor do grande risco que todos a bordo corriam, o comandante Schlitt não teve alternativa: deu ordem para emergir imediatamente, tirando assim o submarino da proteção das profundezas contra os inimigos, que sabidamente patrulhavam o mar da região.

Mas o pior ainda estava por vir.

Mandou abandonar o submarino

Ao chegar à superfície, o U-1206 foi rapidamente avistado por aviões ingleses e passou a ser duramente bombardeado.

Como não podia voltar à segurança do fundo do mar, por conta do gás que seguia emanando das baterias, Schlitt ordenou que toda a tripulação passasse para os botes salva-vidas, e tomou a mais difícil decisão que um comandante poderia tomar: afundou o próprio submarino, para que ele não caísse nas mãos dos inimigos, o que revelaria alguns segredos daquela nova classe de Uboats — entre eles, o próprio sistema revolucionário de ejeção pressurizada dos dejetos dos banheiros, que, involuntariamente, causara aquela confusão toda.

Schlitt, desta vez, abriu as válvulas certas e o submarino deslizou para o fundo do mar, de onde nunca mais saiu.

Mas o pior de tudo mesmo, viria em seguida.

Ficou famoso pelo vexame

Nos ataques dos aviões ingleses, quatro dos 50 tripulantes do U-1206 morreram. Outros dez conseguiram chegar à costa, com um dos botes, mas foram rapidamente capturados — mesmo destino dos demais 36 ocupantes do submarino, logo detidos no mar pelos navios dos Aliados.

Entre os que foram capturados e presos ainda no mar, estava o próprio capitão Schlitt, que foi enviado, junto com seus homens, a um campo de prisioneiros, onde chegou particularmente famoso, como o primeiro comandante da história a provocar um naufrágio só porque foi ao banheiro.

Uma verdadeira cag...

Outro submarino alemão amaldiçoado

Embora tenha se tornado um caso quase folclórico — embora verídico — entre os homens do mar daquela época, o U-1206 não foi o único submarino militar da Alemanha que entrou para a História pela porta errada.

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Antes dele, ainda na Primeira Guerra Mundial, outro submarino alemão, o U-65 protagonizou um episódio ainda mais constrangedor para os rígidos e pragmáticos padrões da Marinha da Alemanha, quando passou a ser acometido por uma série de supostos fenômenos paranormais que, de tão frequentes e apavorantes, acabaram por levar o Alto Comando alemão a tomar uma decisão inédita: mandar exorcizar o submarino — clique aqui para conhecer também esta interessante história, que, tal qual a do infeliz comandante Schlitt, os orgulhosos oficiais da Marinha Alemã de Guerra prefeririam esquecer.