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Esposa de velejador que sumiu no mar 1 mês atrás implora por avião de busca
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No início da tarde de 15 de janeiro passado, exato um mês atrás, o velejador Edison Gloeden, de 66 anos, mais conhecido como "Alemão", saiu sozinho com seu veleiro de uma marina na cidade de Santos, para testar um equipamento que havia instalado no barco, e disse que voltaria rápido.
Nunca mais retornou.
Desde então, lá se vão 30 dias, sua esposa, a ex-professora aposentada Maria de Fátima Calaca Alves, de 65 anos, vive um angustiante drama: o de tentar saber o que aconteceu com seu marido.
Indignação com a Marinha
Para aumentar ainda mais a angústia de Maria de Fátima, que se recusa a aceitar a possibilidade de que o marido tenha morrido vítima de algum acidente ou mal súbito, as buscas pelo velejador foram suspensas pela Marinha duas semanas atrás, o que a deixou inconformada e indignada.
"A Marinha diz que as buscas estão 'suspensas', e não 'encerradas'. E que 'está em alerta'. Mas o que é estar 'em alerta', se não fazem mais nada para tentar achar o meu marido?", revolta-se a esposa do velejador, que, desde então, já promoveu duas manifestações públicas diante da sede da Capitania dos Portos, em Santos, a fim de pressionar para que as buscas sejam retomadas.
Só este avião pode ajudar
A última destas manifestações aconteceu na tarde de sábado, debaixo de chuva, e teve um objetivo específico: pedir que a Marinha use um avião especial que o Ibama possui, capaz de rastrear com grande abrangência a superfície do mar, a fim de tentar localizar o barco do velejador — que ela acredita que esteja à deriva, mas já longe da costa brasileira, com seu marido dentro dele.
O avião em questão, um Bandeirantes equipado com o que há de mais avançado para vasculhamento marítimo, chamado de "Poseidon" ("Deus do Mar", na mitologia grega), é usado pelo Ibama para rastrear manchas de óleo nas áreas de plataformas de petróleo, e é o único do gênero na América do Sul.
Recentemente, ele foi usado pelo Ibama para monitorar o afundamento do porta-aviões São Paulo, pela Marinha do Brasil, no mar de Pernambuco, mas retornou — para muitos, precipitadamente —, à sua base, em São Paulo, logo no dia seguinte, antes que eventuais vazamentos de óleo do velho navio pudessem ser detectados na superfície — fato que gerou perplexidade em alguns ambientalistas.
Apelo ao Ibama
Além de manchas de óleo, o avião do Ibama é, também, o único capaz de detectar um pequeno barco, como o veleiro de Gloeden, de pouco mais de nove metros de comprimento, batizado Sufoco, na imensidão do mar aberto, para onde, imagina-se, ele possa ter seguido à deriva, após algum contratempo ter acometido o velejador.
"Eu apelo para o Ibama, para que ceda esse avião para uma varredura completa no mar, a fim de encontrar o barco. É uma questão humanitária. Uma vida está em jogo!", diz Maria de Fátima, que não poupa a Marinha de críticas.
'O Brasil precisa de uma Guarda Costeira'
"Se a Marinha não tem recursos para cumprir a contento a missão de proteger as pessoas no mar, que delegue isso a outra instituição", revolta-se a esposa do velejador desaparecido desde o mês passado.
"Está mais do que na hora de o Brasil ter uma Guarda Costeira, como existe na maioria dos países. Meu marido sempre falou isso. A Marinha é burocrática demais para ações que exigem urgência, como a busca imediata de um barco desaparecido. É o mesmo que o Exército tentar fazer o papel de Polícia. Não tem a mesma agilidade", conjectura a ex-professora.
Por que é tão importante achar o barco?
Embora quase ninguém mais acredite que, um mês depois de ter desaparecido, o velejador santista ainda esteja vivo, Maria de Fátima segue firme e determinada a encontrar o marido, com que está casada há 36 anos.
"Não aceito simples deduções de que ele tenha morrido", diz.
"Ainda tenho esperanças de que esteja vivo, dentro do barco, por isso é tão importante achá-lo".
"Só o barco poderá provar que meu marido não está mais entre nós. E só a análise dele poderá explicar o que, afinal, aconteceu".
'Um vazio no peito'
Enquanto isso não acontece — se é que, algum dia, irá acontecer —, Maria de Fátima vive a angústia típica dos desaparecimentos de pessoas.
"O sentimento não é de tristeza", diz, chorando. "É um vazio que não cabe no peito".
"Mesmo que o meu marido tenha morrido, eu preciso saber como a vida do Edison terminou. É como parar de ler um livro na metade e jamais conhecer o final da história".
Um caso intrigante
"O desaparecimento do Alemão é um caso intrigante, e nenhum pedido de socorro ou ajuda pelo rádio ou celular foi feito", diz o capitão Herman Júnior, administrador do grupo de WhatsApp Mayday, que, desde o início, tem sido a principal ferramenta de coleta de informações sobre o misterioso sumiço do veleiro Sufoco.
Com base no seu conhecimento da região, Herman fez uma projeção da direção em que o barco seguiu, guiado apenas pelo piloto automático, equipamento que conduz um barco de maneira autônoma, que o velejador saíra justamente para testar no dia em que desapareceu.
Com isso, ele estimou até onde o barco pode ter avançado no mar aberto, antes de ficar sem combustível.
"O tanque cheio daria uma autonomia entre 25 e 30 horas de navegação, o que significa que o barco pode ter avançado mais de 200 quilômetros no mar, o que é bem longe. Depois, ele pode ter ficado à deriva, em uma região que sofre a ação de uma forte correnteza, que desce para o sul do país e vai se afastando cada vez mais da costa. E isso pode explicar por que o veleiro não foi encontrado nas buscas iniciais", avalia Herman.
O que pode ter acontecido?
A rigor, os especialistas indicam três possibilidades: naufrágio do barco, queda do velejador no mar ou mal súbito - ou uma coisa em decorrência da outra.
Das três hipóteses, a menos provável é o afundamento do barco, já que não apareceu nenhum vestígio boiando no mar, como costuma ocorrer nesses casos.
Já a suspeita de queda acidental do velejador no mar é a mais forte.
Teria caído no mar?
Como estava sozinho no barco, e com o motor sendo comandado pelo piloto automático, Edison Gloeden pode ter perdido o equilíbrio ao fazer alguma função no convés e caído no mar, enquanto o veleiro seguiu em frente, de maneira autônoma, sem que ele conseguisse alcançá-lo, a nado.
Além disso, ele pode ter caído na água desacordado, por conta da terceira hipótese aventada: a de mal súbito — embora, aparentemente, o velejador não tivesse nenhum problema mais sério de saúde.
"Nem covid ele pegou", diz Maria de Fátima.
Também a hipótese de suicídio foi logo descartada. E a de fuga, nem considerada.
"Ele não teria motivos para isso", garante o amigo de infância, e sócio de Gloeden em uma pequena empresa de serigrafias em Santos, Paulo Lichtner.
Esposa tem outra teoria
Já a esposa do velejador tem uma quarta teoria para o desaparecimento do marido: avaria no barco.
"Ele pode ter tido algum problema mecânico, elétrico ou nas velas, e não conseguiu voltar", avalia.
"Ou, por isso, ter passado mal e ficado desacordado".
Barco pode aparecer só na África
Caso o veleiro de Gloeden não tenha afundado, na época do sumiço ou depois disso, especialistas consideram que, com base nas correntes marítimas, ele poderá surgir em algum ponto da costa sul da África, dentro de alguns meses. Ou anos, dependendo da intensidade dos ventos.
E, talvez, ainda em bom estado, de forma que seja possível vistoriá-lo.
Se isso acontecer, não será a primeira vez que um barco navega sozinho no oceano, totalmente à deriva, e surge intacto, em outro ponto, bem distante.
1.300 km à deriva no mar
Um dos casos mais recentes do gênero aconteceu em 2013, mas só virou notícia dois meses atrás, quando o navegador americano Matt Rutherford finalmente decidiu postar na internet um vídeo que fez dez anos antes, ao encontrar um veleiro abandonado no mar, sem ninguém a bordo, no Atlântico Norte.
O vídeo bombou na internet e revelou o momento do achado do barco do velejador irlandês Alan McGettigan, que o havia abandonado no mar, meses antes.
O impressionante é que o barco estava a mais de 1.300 quilômetros do ponto onde havia sido dado como perdido, durante uma tempestade. E ainda em perfeito estado — clique aqui para ler esta interessante história.
"O barco do meu marido também é seguro e resistente. Ele pode estar lá dentro, à espera de socorro. Por isso, precisamos tanto deste avião, para procurá-lo", diz Maria de Fátima, entre esperançosa e desesperada.
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