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O misterioso caso do remador que não voltou para buscar o seu valioso barco
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Na madrugada do último dia 1º de abril, um moderno e tecnológico barco a remo, utilizado para grandes travessias oceânicas, chegou ao modesto porto pesqueiro de Guayaguayare, na ilha de Trinidad, uma das duas que dão forma a Trinidad e Tobago, um pequeno país entre a América do Sul e o Caribe.
Dele desembarcou um homem saudável e bem disposto, apesar de ter passado quase três meses no mar, remando sem parar, das Ilhas Canárias até lá — um percurso de quase 5.000 quilômetros, vencido apenas com a força dos braços.
Na ocasião, dois outros homens, aparentemente conhecidos do remador, o aguardavam no porto, portando câmeras filmadoras, para registrar o desembarque.
Em seguida, ele conversou rapidamente com um humilde morador local, entrou em um carro juntamente com os dois homens, e foi embora, deixando para trás o próprio barco e tudo o que havia nele — incluindo sofisticados equipamentos.
Desde então, o remador nunca mais voltou para reaver o seu barco, que vale um bom dinheiro. E ninguém sabe por quê?
Quem é ele?
Só o que se sabe é que o homem em questão é o polonês Pawel Lokaj, de 43 anos, um remador aventureiro, que ao chegar ao porto de Guayaguayare naquela noite, concluíra sua primeira travessia do Atlântico com um barco a remo — uma façanha e tanto, o que, inclusive, justificava a presença daqueles dois homens, com filmadoras em punho, para registrar o feito.
Mas, por que Pawel abandonou o seu barco naquela praia, e, até hoje, quase 50 dias depois, não voltou para buscá-lo?
Isso é o que mais intriga os moradores da ilha. E a própria Polícia.
Não deu entrada no país
A aparente pressa do polonês em deixar para trás o porto onde chegou, sem sequer recolher objetos do barco, é ainda mais enigmática quando se se sabe que, de acordo com o jornal local Trinidad Express, que vem investigando o caso, ele não compareceu ao órgão marítimo de Trinidad e Tobago para fazer sua entrada oficial no país — procedimento obrigatório em qualquer parte do mundo para quem chega do exterior a bordo de um barco.
Assim sendo, sem ter um registro oficial de entrada em Trinidad e Tobago, Pawel, tecnicamente, também não poderia sair do país pelos meios legais convencionais, como portos e aeroportos.
Isso pressupõe que o polonês, talvez, tenha deixado o país de forma igualmente clandestina, a bordo — quem sabe? — de outro barco, até a ilha mais próxima, uma vez que parece claro que em Trinidad ele não está mais, há bastante tempo.
Se estivesse, Pawel certamente teria retornado à Guayaguayare para reaver seu barco, uma vez que quase dois meses já se passaram.
Como, porém, o polonês desapareceu logo após pisar na ilha — e o morador com quem ele conversou rapidamente no desembarque não recebeu nenhum contato posterior a respeito do que fazer com o barco —, a embarcação acabou sendo vítima do seu próprio descaso.
Barco foi saqueado e afundou
Na semana passada, marginais invadiram o barco do polonês, retiraram tudo o que havia de valor (equipamentos de navegação, painéis solares, rádio comunicador, estação meteorológica portátil, dessalinizador, e até um valioso telefone móvel via satélite), e foram embora, deixando as portinholas dos dois compartimentos internos do barco abertas, o que fez com que ele enchesse de água e afundasse — felizmente, a baixa profundidade, o que permitiu que, no dia seguinte, fosse arrastado até a praia pelo morador encarregado de cuidar da embarcação, mas que nada pode fazer frente aos ladrões.
"Eu achei que alguém viria buscar o barco depois, mas ninguém nunca apareceu", disse o morador ao jornal local Trinidad Express, que, juntamente com a Polícia, vem tentando — em vão — localizar o polonês, através das redes sociais.
Desde então, ninguém na ilha sabe o paradeiro do remador que abandonou tudo e foi embora, sem nenhuma explicação.
Teria ido embora da ilha
De acordo com o jornal trinitário, há rumores de que após sua chegada à Guayaguayare, Pawel tenha seguido para a quase vizinha ilha de Santa Lucia, uma ex-colônia francesa não muito distante de Trinidad, e, de lá, não se sabe para onde — muito menos por que não voltou para recuperar o seu barco, que estava em perfeito estado, e, por suas peculiaridades, valia um bom dinheiro.
Até ser saqueado, na semana passada.
Um barco famoso e valioso
O barco de Pawel, batizado de Pianist`a, é uma embarcação particularmente famosa na Polônia.
Foi construído por um remador-aventureiro polonês chamado Romuald Kerposki, uma espécie de Amyr Klink da Polônia, que o utilizou em duas travessias oceânicas: uma no Oceano Pacífico, em 2013, que não chegou a ser concluída, e outra, bem-sucedida, no Atlântico, em 2017, pela mesma rota agora seguida por Pawel Lokaj.
Pawel comprou o barco após a morte de Kerposki, visando justamente repetir o feito do seu conterrâneo. E fez isso com bravura, como registrado pela Ocean Rowing Society, entidade dedicada aos remadores que fazem travessias oceânicas, logo no dia seguinte à sua chegada em Trinidad.
Travessia não virou notícia
No registro da entidade, consta que Pawel partiu de Tenerife, nas Ilhas Canárias, no dia 2 de janeiro deste ano, e, "após 89 dias e 10 horas", chegou à ilha de Trinidad, do outro lado do oceano — o segundo polonês a realizar tal façanha.
Estranhamente, porém, nenhum jornal da Polônia noticiou o feito de Pawel.
Para os moradores da ilha, no entanto, o mais intrigante é por que o remador não voltou para buscar o seu barco até hoje.
Outro barco abandonado no país
Curiosamente, não muito distante dali, outro barco que um dia já foi valioso — e que também pertenceu a um navegador polonês —, jaz abandonado em uma das praias da outra ilha que dá forma ao país, a de Tobago.
Trata-se do veleiro Vagant, com quase 15 metros de comprimento, que pertenceu ao casal polonês Stanislaw e Elizabeth Dabrowny, que ali chegou, à deriva, em novembro de 2017, sem ninguém a bordo, após uma tragédia que o levou a ser abandonado no mar.
Até hoje, cinco anos depois, o outrora valioso veleiro, avalizado na época em cerca de 1 milhão de dólares, permanece jogado na areia da praia de Lambeau, já devidamente saqueado e depredado, à espera de que alguém vá reclamá-lo — o que não deve mais acontecer.
"Aquele barco nos traz lembranças ruins", resume uma das filhas do casal, que não demonstra a menor intenção de resgatá-lo — veja aqui por quê.
Já o remador polonês Pawel Lokaj teve bem mais sorte: completou são e salvo, e sem sobressaltos, a sua jornada no oceano, e se acabou ficando sem o barco foi porque, aparentemente, assim o quis.
Resta saber apenas o que tanto intriga os moradores de Guayaguayare: por quê?
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