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Reportagem

Entre focas, tubarões brancos e turistas: o dilema de uma cidade americana

Quando chega o verão na costa americana, como agora, as praias das pequenas cidades da região de Cape Cod, em Massachusetts, lotam de banhistas. Sempre foi assim.

Contudo, nos últimos tempos, outros visitantes estão tornando as temporadas de verão naquela famosa península em forma de cotovelo ainda mais agitadas: os tubarões brancos, a espécie mais feroz.

Só este ano, pesquisadores da Divisão de Pesca de Massachusetts já contabilizaram mais de 300 aparições de grandes tubarões brancos nas praias da região de Cape Cod, o que representa um aumento significativo em comparação com os números do ano passado, que, por sua vez, foram maiores que do no ano anterior.

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Imagem: Atlantic White Shark Conservancy

"Não restam dúvidas de que os brancos estão chegando cada vez mais", diz o chefe da Divisão de Pesca. "E isso exige atenção".

Em busca das focas

Por trás deste preocupante fenômeno, está o crescimento acelerado na região de outra espécie animal marinha que nada tem de perigosa para o homem - mas que explica o aumento na quantidade de grandes barbatanas que rondam as praias de Cape Cod: as focas cinzentas, um dos alimentos preferidos dos tubarões brancos.

No passado, por conta da caça abusiva, as focas cinzentas estiveram perto de serem extintas na região. Mas, com a proibição da captura, em 1972, as populações voltaram a crescer. Mas, junto com isso, veio o novo problema: o aumento na população flutuante de tubarões.

"Precisamos voltar a caçar focas, para diminuir a oferta de alimento para os tubarões brancos", defende o comissário do Condado de Barnstable, Ron Beaty Jr, um árduo defensor da captura, também, dos próprios tubarões. "Temos que diminuir esta superpopulação de focas e abater todos os tubarões que se aproximarem das praias", diz.

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Beaty Jr quer que a lei que proíbe a captura de focas em Massachusetts seja revogada, e que também sejam instaladas linhas de proteção com iscas e anzóis diante das praias mais movimentadas de Cape Cod, a fim de proteger os banhistas dos animais.

"Se os anzóis não forem suficientes para deter os tubarões, devemos abatê-los a tiros", defende o comissário. "O que não podemos é não fazer nada", argumenta, estimulando uma polêmica que, nos últimos tempos, vem tornando ainda mais famosas as praias de Cape Cod - justamente por causa dos tubarões.

Efeito contrário

Ao contrário do que se possa imaginar, desde que as aparições de grandes tubarões brancos começaram a se tornar frequentes, o movimento de turistas na região só tem feito aumentar - porque muita gente vai para lá para tentar ver de perto um dos mais violentos seres marinhos, embora ninguém tenha coragem de entrar no mar para isso.

A presença de grandes tubarões brancos rondando as praias de Cape Cod tem feito um bem danado para a economia local - e o comércio logo descobriu isso.

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Imagem: Atlantic White Shark Conservancy
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Em vez de minimizar a presença dos tubarões, muitas lojas e empresas locais passaram a fazer o oposto disso e enaltece-los, porque descobriram que os grandes tubarões brancos (pavorosamente famosos desde o clássico filme Tubarão, de Steven Spielberg, de 1975) atraem ainda mais os turistas, em uma estranha relação de atração e medo.

Assim sendo, imagens de assustadoras mandíbulas abertas e réplicas em fibra de vidro do temido peixe passaram a decorar tanto lojas de roupas quanto quiosques de venda de suvenires.

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Imagem: Atlantic White Shark Conservancy

De camisetas e bonés, a toalhas e roupas de praia - passando por toda sorte de chaveiros, imãs de geladeira e canecas -, as imagens de ameaçadores tubarões hoje dominam o comércio de Cape Cod.

Tubarões atraem os turistas

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Imagem: Atlantic White Shark Conservancy
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Uma das lojas de roupas mais famosas da região, no passado chamada apenas "Cape Cod", até mudou seu nome para "Cape Shark" ("Cabo Tubarão").

Também foi instituída a "Semana do Tubarão", em diversas cidades da região, com descontos e promoções no comércio.

Na pequena cidade de Chatham, bem no cotovelo da península, acontece, desde 2015, a exposição de arte popular ao ar livre "Sharks in the Park" ("Tubarões no Parque"), na qual os artistas usam recortes de tubarões para compor telas e designs. E as crianças são convidadas a interagir nas obras.

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Imagem: Atlantic White Shark Conservancy

Ao mesmo tempo, no vizinho Chatham Orpheum Theater, são exibidas nostálgicas sessões do filme de Spielberg que revelou os horrores dos grandes tubarões brancos para o mundo, dividindo ainda mais a opinião dos moradores locais sobre os benefícios e malefícios dos novos frequentadores das praias da região.

Quando o assunto são os tubarões brancos, as comunidades de Cape Cod estão um tanto divididas: ao mesmo tempo em que temem eventuais acidentes causados por eles, sabem que muitos turistas são atraídos para a região justamente por isso.

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Em defesa dos tubarões

Tempos atrás, a região ganhou até uma instituição de defesa dos tubarões brancos, a Atlantic White Shark Conservancy, que prega medidas bem menos drásticas do que as propostas pelo comissário Beaty Jr, para manter as pessoas seguras nas praias.

A entidade lançou um aplicativo, chamado "Sharktivity", que fornece informações atualizadas em tempo real sobre avistamentos de tubarões perto das praias mais populares de Cape Cod, e defende o aumento da sinalização e até mesmo o fechamento das praias, nos casos mais críticos, apesar do efeito negativo que isso teria sobre o comércio local.

Ao mesmo tempo, o governo de Massachusetts destinou cerca de US$ 400 mil (mais de R$ 2,2 milhões, na cotação atual) para as cidades da região equiparem suas praias com equipamentos de primeiros socorros, ambulâncias e cabines para salva-vidas.

Cartazes também foram espalhados pelas praias, recomendando não entrar no mar ao amanhecer ou anoitecer, não nadar, não ir além da profundidade do próprio corpo e, principalmente, sair imediatamente da água se houver focas por perto - porque elas são o principal chamariz para os tubarões.

Última vítima foi um brasileiro

Todas as recomendações fazem sentido, embora o último caso fatal de ataques de tubarões em Cape Cod tenha acontecido seis anos atrás.

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A vítima foi justamente um brasileiro: o jovem capixaba Arthur Medici, de 26 anos, que estudava engenharia nos Estados Unidos e havia viajado para Cape Cod para surfar, na companhia de um amigo.

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Imagem: Reprodução

Arthur, que na ocasião vestia uma roupa de borracha, o que o tornava perigosamente semelhante a uma foca no mar, foi mordido na perna, perdeu quase todo o sangue do corpo e já chegou morto ao hospital - clique aqui para ler esta triste história, que até hoje é lembrada pelos moradores da região.

"Não queremos novas tragédias como esta", prega o comissário Beaty Jr.

"Nem nós", concorda a presidenta da Atlantic White Shark Conservancy. "Mas a solução não é aniquilar os tubarões. É ensinar as pessoas a conviver com eles".

Enquanto isso, Cape Cod vive o dilema: afinal, tubarões são bons ou ruins para a região?

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Texto que relata acontecimentos, baseado em fatos e dados observados ou verificados diretamente pelo jornalista ou obtidos pelo acesso a fontes jornalísticas reconhecidas e confiáveis.

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