Empresa caçadora de naufrágios promete achar navio com tesouro bilionário
No dia de hoje, 23 de setembro - só que de 1641, portanto, exatos 383 anos atrás -, o barco mercante inglês Royal Merchant afundou em algum ponto próximo à uma península da costa inglesa conhecida como Land´s End ("Fim da Terra", em português), na Cornualha, durante uma tempestade. E jamais foi encontrado.
Seria apenas mais uma antiga embarcação perdida para sempre no mar - algo corriqueiro séculos atrás -, não fosse o que aquele navio transportava: uma quantidade impressionante de ouro e outras preciosidades, que haviam sido extraídas das minas da América Central e estavam sendo levadas para a Inglaterra.
Uma carga que, em valores de hoje, estaria estimada em cerca de R$ 8.500.000.000,00.
Ou, simplificando, para não precisar contar tantos zeros, R$ 8,5 bilhões - bilhões, não simples milhões!
E tudo isso dentro de um único barco, que afundou e, até hoje, quase quatro séculos depois, nunca foi achado.
Mas pode ser que isso, agora, mude.
Uma nova tentativa
Uma empresa inglesa de resgate de naufrágios, a Multibeam Services, garante que encontrará os restos do Royal Merchant no fundo do mar da Cornualha, embora isso já tenha sido tentado antes, por outras empresas do setor. E todas falharam.
Uma delas foi a empresa americana Odyssey Marine Exploration, uma gigante do setor, que tentou encontrar o navio em duas oportunidades, em 2007 e 2009.
Na primeira vez, chegou a haver euforia entre os membros da equipe, quando muitas moedas de prata foram resgatadas dos escombros de uma velha nau naufragada na região, que, num primeiro momento, se supôs ser o Royal Merchant. Mas não era - e sim uma velha fragata espanhola, que pouco tinha de preciosa.
Já na segunda tentativa, dois anos depois, nada foi encontrado e a empresa desistiu da empreitada.
Uma âncora renovou as esperanças
Dez anos depois, o assunto voltou à tona - literalmente -, quando um barco pesqueiro inglês capturou, enganchado em suas redes, uma velha âncora no mar de Land´s End, do tipo que eram usadas pelas grandes embarcações no século 17.
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OLHAR APURADO
Uma curadoria diária com as opiniões dos colunistas do UOL sobre os principais assuntos do noticiário.
Quero receberNa época, a imprensa inglesa se apressou em afirmar que o Royal Merchant - logo apelidado pelos tablóides de "Eldorado dos Mares", em referência à mítica cidade dourada, tal a quantidade de ouro que transportava - havia sido, finalmente, encontrado.
Mas nunca foi comprovado se aquela âncora pertencera, de fato, ao cobiçado barco, nem tampouco foram encontrados restos de algum naufrágio no local do achado.
A localização do Royal Merchant continuou sendo um mistério. E segue sendo assim até hoje.
50 toneladas de ouro
De lá para cá, ninguém mais se predispôs a procurar os restos do navio afundado.
Até que, no início deste ano, a Multibeam Services anunciou que começaria uma nova busca.
"Nós vamos achá-lo", garante o dono da Multibeam, o ex-pescador e mergulhador inglês Nigel Hodge, que lidera uma equipe de 11 pessoas a bordo de um navio de pesquisas, que, segundo ele, está muito bem equipado para a missão.
"Temos equipamentos de ponta, um sonar especial e robôs submarinos capazes de varrer totalmente o fundo do mar. Hoje, a tecnologia já permite isso", diz Hodge, bastante confiante de que irá encontrar o que, até hoje, todo mundo procurou e ninguém achou.
"Em 35 anos de resgates marítimos, sempre encontramos o que buscávamos", garante o especialista.
"Só que, às vezes, isso demora um pouco para acontecer", diz Hodge, já antevendo que não será nada fácil encontrar os restos do barco, hoje reduzido a escombros, uma vez que seu casco, de madeira, como eram todas as embarcações da época, muito provavelmente já tenha apodrecido e desaparecido.
Mas não os metais, como o ouro e a prata que o Royal Merchant transportava, quando foi engolido pelo mar da Cornualha.
De acordo com registros da época, o Royal Merchant continha cerca de 400 barras de prata, perto de 500 000 moedas do mesmo metal e 50 toneladas de ouro.
"Se fosse fácil, alguém já teria encontrado"
A primeira dificuldade para a equipe, que começou a vasculhar a região no início de abril - até agora, sem nenhum resultado prático -, tem sido tentar identificar o ponto exato onde ocorreu o naufrágio, já que as informações de quase quatro séculos atrás não eram nada precisas.
Além disso, a região é de mar aberto e gigantesca, uma vez que fica adiante da última porção de terra firme do Reino Unido, não por acaso chamada Land´s End.
"Só o que a história registra é que o Royal Merchant afundou a cerca de '10 léguas' de Land´s End, o que equivale a uns 65 quilômetros da costa. Mas pode ter sido em qualquer direção, e isso amplia barbaramente a área de buscas. Nosso objetivo é vasculhar cerca de 500 quilômetros quadrados do fundo do mar do Canal da Mancha, o que não é pouco. Mas, se fosse fácil, alguém já teria encontrado", diz Hodge, consciente das dificuldades, mas convencido de que pode fazer isso.
Vão achar muitos outros barcos
Existe, contudo, outro complicador. A região onde ocorreu o naufrágio, nas proximidades do Canal da Mancha, que separa o Reino Unido do restante da Europa, sempre foi uma das mais movimentadas da história dos transportes marítimos, o que significa que esconde centenas - ou mesmo milhares - de outros naufrágios, acumulados ao longo de séculos.
O do Royal Merchant é apenas um deles. E caberá a equipe de Hodge tentar identificar, um por um, os escombros dos barcos que for encontrando, o que ninguém acredita que possa ser feito.
"Vamos trabalhar por eliminação", defende o especialista.
"Só dedicaremos tempo aos escombros que possam ser do Royal Merchant. Os demais, deixaremos para explorar mais tarde. Mas é certo que encontraremos muitos outros barcos afundados".
Como ele afundou?
O Royal Merchant afundou durante uma tempestade, quando navegava entre os portos de Cádiz, na Espanha, onde parou para fazer reparos após meses navegando, e Londres, para onde levaria as riquezas que havia coletado nas minas da América Central pertencente aos espanhóis, então aliados dos ingleses.
O navio chegou a Cádiz abarrotado de preciosidades, mas, ainda assim, lá recebeu outro carregamento igualmente valioso, composto por mais barras de ouro e 30 000 moedas de prata, destinadas à Antuérpia, que estavam em outro navio que pegara fogo no porto.
Pesado e sobrecarregado, o Royal Merchant partiu de Cádiz, mas não passou da costa da Cornualha, onde encontrou uma tempestade e afundou - ironicamente, talvez, pelo peso da absurda quantidade de ouro e prata que transportava.
Dos 58 marinheiros da tripulação, 40 foram resgatados pelo barco de apoio Marchant Dover, que escoltava a nau sinistrada. Mas 18 deles afundaram junto com o ouro.
Para a corte inglesa, o prejuízo causado pelo naufrágio do Royal Merchant foi tão grande que o Rei Charles I considerou como "a maior perda já sofrida por um navio". E fora mesmo. Pelo menos, até aquela data.
O tesouro mais valioso de todos
Mas, 67 anos depois, um naufrágio ainda mais bilionário ocorreu nos mares, desta vez provocado pelos próprios ingleses contra os ex-aliados espanhóis.
Em 8 de junho de 1708, uma fragata inglesa avistou uma frota de galeões espanhóis partindo da atual Colômbia, e abriu fogo.
Os disparos dos canhões ingleses atingiram os paióis de munição da principal nau da flotilha, o galeão San Jose, que explodiu e afundou, levando junto com ele a vida de quase 600 marinheiros e uma quantidade colossal de ouro, prata, esmeraldas e outras preciosidades, que estavam sendo levadas para a corte espanhola.
Até hoje, a carga que o San Jose transportava é considerada o mais valioso tesouro submerso do planeta, avaliado em cerca de 17 bilhões de dólares, ou quase R$ 100 bilhões - onze vezes mais que o do Royal Merchant, que é considerado o segundo mais rico do mundo.
Por isso mesmo, virou objeto de confronto até de governos de países como a Espanha e a Colômbia, depois que os restos do valioso galeão foram encontrados, no fundo do mar colombiano, sete anos atrás.
O achado gerou uma disputa legal que a cada dia aumenta ainda mais, com governantes, historiadores, empresas de resgates marítimos e até descendentes de povos originários das regiões de onde o ouro e a prata que o San Jose transportava foram extraídos, brigando entre si, pelos direitos sobre o que for encontrado no naufrágio.
Recentemente, o presidente da Colombia, Gustavo Petro, colocou ainda mais lenha na fogueira ao afirmar que o próprio governo colombiano irá financiar um expedição de resgate de "itens do naufrágio" (sem especificar que "itens" seriam estes), e que jamais abrirá mão dos direitos de posse sobre os restos dos galeão, a despeito do que dizem o governo da Espanha e todos os demais envolvidos - uma confusão jurídica do tamanho do próprio tesouro, como pode ser conferido clicando aqui.
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