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Hambúrguer de leão, bife de mamute: em breve comeremos até bichos extintos?
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Na dieta hiperglobal que dominou nossos pratos em todos os cantos do mundo, a quantidade de espécies animais que comemos cotidianamente não passa de uma dúzia.
Vaca, porco, frango, peixe, alguns frutos do mar, de vez em quando um outro tipo de ave e já está. Da Ásia à América do Sul, da Oceania à Europa, nossa alimentação em relação às proteínas animais é muito mais parecida do que pensamos.
Claro, há tradições e hábitos distintos aqui e ali, que acabaram por adicionar alguma espécie menos comum a mesas do mundo — os cangurus para os australianos, os veados nos países nórdicos, alguma carne de baleia ainda consumida na Islândia.
Mas no decorrer dos séculos, nossa oferta foi radicalmente reduzida na mesma medida que ampliamos a nossa capacidade de domesticar e, depois, criar meios intensivos de produzir animais para alimentação.
Agora, porém, cientistas e novas startups de olho na produção de carnes sintéticas estão dispostos a tornar nossa dieta muito mais farta. E, no caso de uma delas, isso não é força de expressão.
Cientistas australianos acabam de criar uma almôndega gigante feita a partir de células de mamute-lanoso — sim, aquele dos filmes de "A Era do Gelo". O bolo de carne, maior que uma bola de beisebol, foi desenvolvido por uma empresa de carne cultivada (ou seja, feita em laboratório).
Batizada de Vow, o objetivo da companhia é misturar e combinar células de espécies não convencionais para criar novos tipos de carne — inclusive de animais já extintos, que não mais existem entre nós.
O projeto anunciado com a polpeta de mamute (que não foi, de fato, servida a ninguém) quer mostrar o potencial da carne cultivada a partir de células, sem o abate de animais.
Segundo a Vow, a produção a partir de tecnologia genômica é uma alternativa à pecuária em larga escala e à destruição da vida selvagem e à crise climática que os sistemas intensivos causam.
A empresa já investigou o potencial de mais de 50 espécies, entre elas alpaca, búfalo, crocodilo, canguru, pavão e diversos tipos de peixes que podem ser feitas em laboratório.
A escolha do mamute, no entanto, foi uma tentativa de criar um marketing mais agressivo por trás da tecnologia e mostrar que poderíamos ter nas nossas mesas carne proveniente de qualquer tipo de espécie animal — até mesmo um extinto há 4 mil anos.
Até mesmo de leão. Sim, outra empresa, a americana Primeval Foods, começou a produzir carne cultivada do maior felino da natureza em suas instalações no estado de Nova York.
Graças à tecnologia da carne cultivada, a startup afirma que não há limites para novas espécies na nossa dieta. No texto de apresentação da Primeval, diz-se:
Existem mais de um milhão de animais só na África, incluindo os mais pesados e os mais altos, dos mais rápidos aos mais antigos animais terrestres da Terra"
"E quem sabe quantas criaturas não descobertas existem intocadas pela civilização?", pergunta Yilmaz Bora, fundadora da empresa, mostrando que as possibilidades são infinitas — e vão muito além do nosso bife de vaca.
A tecnologia, diz ela, é simples: seleciona-se uma pequena amostra de tecido dos animais selvagens mais saudáveis — que, enquanto isso, continuam a aproveitar as suas vidas.
Depois, essa parte do animal é cultivada em tanques de inox, conhecidos como cultivadores, que são semelhantes aos recipientes usados para fazer iogurte ou cerveja. Ali, as células seguem seu processo natural de formação de carne, assim como fariam dentro do corpo do animal.
Para acelerar o processo, as células dentro dos cultivadores são alimentadas com macronutrientes essenciais (aminoácidos, carboidratos e gorduras) e micronutrientes (vitaminas e minerais) que as ajudam a crescer.
O método é 100% natural: não envolve o uso de hormônios de crescimento, antibióticos ou organismos geneticamente modificados. Apenas tanques de formação para a carne que, depois de algumas semanas, está pronta para ser grelhada ou cozida.
Bora afirma que os grandes felinos, pelo seu padrão de mobilidade distinto de caça a outros animais, possuem um perfil único de aminoácidos e proteínas na sua carne. Já os elefantes, gigantes herbívoros que viajam longas distâncias, têm mais gordura em seu tecido muscular, o que permite à carne uma concentração excepcional de umami.
As novas tecnologias de "cultivo" de carne em laboratório podem nos permitir uma maior variedade de proteínas animais na nossa dieta, principalmente se considerarmos que hoje comemos muito mais carne do que nossos ancestrais — ainda que exista um movimento crescente do vegetarianismo.
Carnes de animais "exóticos" ou silvestres podem estar mais próximos do nosso prato do que nunca, criando uma nova dieta que ainda nem sequer conhecemos, com possibilidades ilimitadas.
Para Bora, o método de cultivo permite que não haja barreiras psicológicas para experimentá-las. Mas talvez seja ainda cedo preconizar que as pessoas vão aos supermercados e, diante das dos freezers da seção de congelados, ficarão em dúvida se levam o hambúrguer de tigre ou os nuggets de elefante para o almoço.
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