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Comer dentro do mar? Restaurantes em lugares inusitados são destinos-desejo
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Para comer ali são necessários dois voos e duas horas pela estrada em um 4x4? Ótimo! O lugar é tão remoto que é preciso se programar com meses de antecedência para conseguir uma reserva? Maravilha.
Sim, parece que quanto mais longe — e difícil chegar! —, melhor. Vivemos a era dos restaurantes-destino, aqueles que ficam afastados de tudo e que, por isso mesmo, se tornaram tão cobiçados pelos amantes da gastronomia.
São pessoas ao redor de todo mundo capazes de criar itinerários inteiros em torno de uma única refeição. Planejam voos, alugam carros, contratam barcos: tudo para ter um almoço inesquecível.
Em tempos de superexposição nas redes sociais e de uma comoditização das experiências (em que quase todo mundo serve as mesmas coisas mais ou menos do mesmo jeito), os restaurantes-destino se tornaram uma espécie de Santo Graal gastronômico.
As pessoas querem aquilo que não lhes é familiar. Querem estar entusiasmadas com algo novo e diferente que terão a chance de viver e depois partilhar", defende a chef Kristen Kish.
Kish sabe do que fala: ela é apresentadora do programa "Restaurantes no Fim do Mundo" (Disney+), para o qual viaja aos locais mais recônditos do planeta para comer e beber — e depois mostrar.
São restaurantes localizados em lugares inóspitos, como o Ártico norueguês ou o vale do vulcão Baru, no Panamá. Mas também experiências nada convencionais, como almoçar em um barco-restaurante que navega pela baía de Paraty, no Rio de Janeiro.
Na cidade fluminense, ela ainda percorreu a Mata Atlântica para mostrar ingredientes pouco convencionais a seu espectador mais globalizado: coco selvagem, cana-do-brejo, muitos tipos de PANCs.
A comida também é uma forma de viajarmos para o desconhecido, de saber mais sobre uma nova cultura, ter algum sentimento de deslumbramento que falta nas nossas vidas cotidianas", ela diz.
Mergulho basco
Não é pouco: um restaurante de frente para os fiordes escandinavos ou escondido nos vales de uma pequena vila do País Basco realmente têm maior apelo do que cruzar um sinal na Quinta Avenida de Nova York para jantar.
Falo de exemplos reais: o Asador Etxebarri é dos restaurantes mais celebrados do mundo. É ali que o chef Vitor Arguingoniz acorda todos os dias cedo para recolher os galhos que vão se transformar na lenha que cozinha das entradas à sobremesa de seu menu — tudo é feito na brasa.
Em Axpe, a pouco menos de uma hora de Bilbao, ele criou um lugar de culto: há quem tente por mais de um ano até conseguir uma mesa. Outros acabam comprando passagens de avião só para aproveitar a disponibilidade de uma reserva que caiu de última hora.
O trabalho de Arguingoniz é único porque está diretamente ligado ao entorno em que ele vive (a poucos metros do restaurante): o leite vem dos animais que pastam ali, assim como os vegetais e as carnes, que chegam quase todos os dias vindos de outros vilarejos da região.
Da janela do casarão austero onde o Etxebarri está instalado, vê-se as nuvens estacionadas entre as montanhas, a grama verde recém-comida pelos animais, os poucos moradores a caminhar para suas casas de pedra.
Mesmo que o chef estivesse no melhor espaço de Madrid, com tudo o que pudesse imaginar em equipamentos para sua cozinha, ainda assim não poderia reproduzir nem metade do que consegue na vila basca. Comida é localidade, sabemos disso.
War da gastronomia
Até os mais prestigiosos guias do mundo surgiram com esse intuito de mostrar que "turismo gastronômico" é algo com grande importância. O Michelin, talvez o mais famoso deles, criou uma escala que, literalmente, move muita gente em torno de refeições.
A cotação máxima do guia vermelho são as três estrelas que, segundo seus inspetores, significam que um restaurante "vale a viagem" ao destino. Não é só um "desvio": vale a pena sair da sua casa e embarcar em quantos transportes forem necessários para sentar-se ali.
Com tantos rankings no mundo de hoje, entretanto, os "food trotters" (ou caçadores de refeições, como prefiro chamar) ficaram em polvorosa: muitos são aqueles que têm como objetivo colecionar restaurantes eleitos para sua lista (e posts nas redes sociais).
Uma espécie de gincana gourmet que mexe com os bolsos de governos por todo mundo (quantos mais turistas, mais grana) e cria competições entre países e localidades para saber quem é capaz de atrair mais e mais pessoas.
Nesse jogo, os restaurantes no "fim do mundo" são as cartas mais valiosas: um trunfo de quem consegue uma mesa para comer.
Por isso, eles se esforçam: constroem edifícios monolíticos metade submersos no Atlântico Norte; se instalam em antigas casas de agricultores no meio das Ilhas Faroé; abrem no meio de uma fazenda de ostras em um vilarejo de 400 habitantes em North Haven, ilha no estado norte-americano do Maine.
Assim, chamam a atenção de inspetores e críticos, que são a melhor isca para os comensais que veem o mundo como um verdadeiro War da gastronomia. Conquistar novos territórios é imperativo, um restaurante por vez.
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