Rafael Tonon

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Criança aqui não? Restaurante multa pais por mau comportamento dos filhos

"Os pais trazem uma criança de 8 meses. Ela chora. Os clientes ficam loucos. Dizer às pessoas para não trazer crianças? Sujeitar outros clientes ao choro? As pessoas levam crianças ao teatro? A concertos? Odeio dizer não, mas…"

O texto acima foi publicado no perfil do chef americano Grant Achatz no X (antigo Twitter), em 2014. Dizia sobre um casal que levou um bebê para jantar no Alinea, o restaurante de alta gastronomia que ele mantém em Chicago.

A certa altura, desconfortável com o ambiente, a criança abriu um berreiro. As mesas do lado olharam torto; cochichos pelo salão. O chef resolveu se pronunciar.

A internet explodiu com comentários: uns defendiam que os bebês deveriam, sim, ser permitidos em restaurantes chiques: e se a babá falta? E se não há com quem deixar a criança?

Outros postaram que lugar de um bebê é em casa, não na mesa de um restaurante com três estrelas Michelin. Até um perfil foi criado na época (@AlineaBaby) para tirar sarro com o acontecido.

Passados dez anos, a discussão volta a tomar as redes de um caso também passado nos EUA: o Toccoa Riverside, um restaurante no estado da Geórgia, ganhou as notícias da semana passada por supostamente querer cobrar dos pais uma taxa pelo "mau comportamento" de seus filhos.

Segundo o cliente, "o proprietário apareceu e me disse que estava adicionando US$ 50 à minha conta por causa do comportamento dos meus filhos", escreveu ele em um review do Google.

De acordo com Kyle Landmann, seus filhos estavam distraídos com tablet até a comida chegar, comeram e sua esposa os levou para fora enquanto ele esperava e pagava a conta.

Ao que tudo indica, não há nenhuma política de proibição de crianças no Toccoa. Alguns restaurantes esclarecem, em seus sites, que não costumam representar ambientes muito propícios a elas —mas é difícil pensar em que alguém possa criar uma regra estipulada "crianças não entram" sem ser alvo de muitas críticas

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Entretanto, parece ser uma tendência atual: a companhia aérea turca Corendon Airlines recentemente anunciou áreas específicas para pais com crianças. Será preciso ter mais de 16 anos para sentar-se nas primeiras fileiras do voo que liga Amsterdã e Curaçao.

A medida, claro, causou alvoroço entre pais e conquistou uma fatia do mercado que não quer ter crianças por perto durante 10 horas a sobrevoar o Atlântico.

O que diferencia as coisas aqui é que viajar pode ser uma necessidade —se locomover de um lugar a outro— enquanto ir a um restaurante é sempre uma escolha.

É justificável —ao visitar um restaurante e gastar o dinheiro suado em uma boa refeição— que clientes possam ficar frustrados com crianças barulhentas ou mal comportadas.

Mas ainda assim, embora acredite que nem todo restaurante tem um ambiente favorável para as crianças se sentirem bem e confortáveis, parece um tanto segregador proibir bebês de acompanharem seus pais em um jantar.

Todos nós já fomos crianças e tivemos nossas birras em volta da mesa: muitos nem sequer tínhamos tablets ou espaços kids para nos distraímos. Quando muito, um papel e giz de cera para desenhar.

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Conviver em ambientes adultos é também o que ajuda a formar a personalidade de uma criança —entender os limites sociais, como se comportar na presença de outras pessoas

Os restaurantes sempre foram o palco da nossa vida moderna, onde acontecem os encontros, as paixões, as celebrações, as conversas profundas.

Para que ele seja a experiência coletiva que é, é preciso que todo mundo possa ser bem-vindo. E a decisão de saber se levam ou não o filho passa pelos pais, não pelos outros clientes — a não ser que o próprio restaurante adote uma regra explícita.

Em um recente artigo na New Yorker, a jornalista Helen Rosner escreveu sobre o Baby Hour: segundo ela, o melhor horário de levar o filho a um restaurante é bem cedo, quando poucos clientes estão por perto.

Para ela, há aqueles que transmitem uma vibração amigável para bebês e crianças, onde o barulho não se note tanto, ou onde haja espaço suficiente entre as mesas para acomodar um carrinho dobrado.

Ter um filho não pode significar reclusão social para os pais; é preciso saber buscar as refeições em que toda a família se sinta confortável, sem necessariamente ter que deixar a criança aos cuidados de um instrutor.

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Para Rosner, não há regras para o Baby Hour, além daquelas que são padrão do pacto consciencioso de se estar em um restaurante: "seja gentil com os garçons, peça desculpas por seu bagunça e dê boas gorjetas.

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Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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