Comida brasileira está no mundo: chegou a hora de mostrarmos nosso valor
Chegou a hora dessa gente bronzeada mostrar seu valor. E mostrar, sobretudo, que a nossa gastronomia tem tudo para ser uma das mais relevantes do mundo.
Longe de discursos ufanistas, nós talvez estejamos vivendo a era mais importante da gastronomia brasileira aos olhos do mundo.
E as premiações, talvez a ponta mais visível desse movimento -são uma prova incontestável disso.
Depois de receber pela primeira vez a edição latino-americana dos 50 Best, a mais influente lista da indústria dos restaurantes (que volta este ano à mesma cidade), o Brasil voltou a contar, nesta segunda (20), com sua cerimônia do Michelin.
O guia francês, conhecido como o mais respeitado do mundo da cozinha, teve um hiato de 4 anos desde a última edição, mas agora voltou ao país com o melhor reconhecimento de sempre — é o maior número de estrelas já conquistadas, 21, no total.
Além disso, a melhor Chef Mulher do Mundo de 2024 é uma brasileira: Janaína Torres (Bar da Dona onça e A Casa do Porco) voltou a colocar o país no holofote da gastronomia global dez anos depois de outra conterrânea, a chef Helena Rizzo, ter alcançado o posto em 2014.
Isso depois de ter recebido, no ano passado, o prêmio de Melhor Chef Mulher do continente e ter sido eleita Ícone em 2020.
De lá para cá, muitas coisas mudaram. O Brasil ganhou mais representação nas listas, que na sua história contava com a presença recorrente apenas do D.O.M., o restaurante pioneiro de Alex Atala, fundamental para nos abrir os caminhos.
Chegamos a ter 10 restaurantes na lista, em 2022, e depois 8, em 2023. Com a visita de muitos votantes ao país no ano passado (por conta da celebração que recebemos), a estimativa é que talvez tenhamos a melhor representação da história neste ano: é aguardar e ver.
"Embaixadas" pelo mundo
Mas muito além de listas e prêmios, a gastronomia nacional tem feito um movimento interessante diante dos olhos do mundo — também para ir além da ideia de feijoada, rodízio e caipirinha que nos fizeram famosos dentro dos clichês (que também importam!).
Depois de anunciar há alguns anos, a chef Manu Buffara finalmente deve abrir seu restaurante em Nova York no final deste ano, levando sua interpretação da nossa cozinha para a maior cidade dos EUA.
Antes, porém, ela leva uma versão do seu premiado Manu, em Curitiba, à Austrália para um pop-up que tomará o Ace Hotel de Sidney entre o dia 24 de maio e 11 de junho, o que significa que toda a equipe vai para o país para tocar a operação.
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Quero receberMais e mais chefs brasileiros também têm despontado na cena internacional: Rafael Cagali, no Da Terra e no Elis, em Londres; Marcelo Ballardin en seu Oak, em Gent; Ivan Brehm, no Nouri, em Singapura; Raphaël Régo, com seu OKA, em Paris, e a lista continua?
Nascida no Vidigal, a chef Alessandra Montagne também foi escolhida para conduzir um restaurante no maior museu de arte do mundo, o Louvre, depois de abrir três outros negócios gastronômicos em Paris.
Ainda sem nome divulgado, o espaço deverá abrir depois das Olimpíadas de Paris e vai mostrar temperos e sabores brasileiros além do que conhecem os parisienses — e turistas, claro.
Brasil tipo exportação
Mas muito além do trabalho de cozinheiros que representam o Brasil nos restaurantes e nos prêmios, em celebrações e eventos por todo mundo, a própria comida do Brasil já passa a ganhar mais espaço — seja nos cardápios, seja nos supermercados.
Graças a bartenders curiosos, a cachaça, por exemplo, tem feito um interessante caminho sendo cada vez mais adotada como base para coquetéis dos EUA à Europa.
Está presente nas cartas de alguns dos melhores bares do mundo — ou do melhor, no caso do Sips, em Barcelona, que tem uma versão de caipirinha feita com o destilado nacional.
O açaí, a tapioca, o pão de queijo, entre outros sabores tão nossos, seguem bons caminhos de sucesso semelhantes. Mas há muitos produtos que ainda podem seguir trajetórias de êxito: vinhos, azeites, queijos, o nosso café especial, ainda pouco reconhecido se pensamos que somos o maior produtor do mundo.
Falar da extensão continental do Brasil já seria uma razão para mostrar por que a gastronomia brasileira é uma das mais ricas do continente americano — e do mundo. E porque, talvez, tenhamos ainda tanto por onde crescer.
Trata-se do país com a maior biodiversidade do planeta (15% a 20% de todas as espécies que habitam a Terra), o que se reflete em uma abrangência única de produtos e receitas.
São frutas exóticas que não brotam em outros lugares, peixes gigantes que nadam pelos nossos extensos rios amazônicos, técnicas tradicionais que seguram preservadas por povos nativos.
Muito Brasil no Brasil
Mas além de todas estas camadas, o Brasil foi um país que esteve no centro de muitos fluxos imigratórios: a maior colônia japonesa do mundo fora do Japão está em São Paulo.
Há italianos, alemães, sírios e libaneses a viverem em distintas regiões. Há descendentes africanos de muitos países que ajudaram a dar mais personalidade e sabor à nossa cozinha nativa. Há uma herança portuguesa que ajudou a determinar a forma como comemos.
Por isso, é tão difícil identificar uma só cozinha brasileira: ela é constituída de cozinhas regionais, ainda que marcadas por alguns ingredientes e receitas presentes em todo território.
Saber traduzi-la e levá-la além das nossas fronteiras é uma tarefa que requer muito trabalho, que deve ainda levar muitos anos. Mas que, graças a uma maior projeção do país nesse cenário internacional, já vem galgando seu lugar.
Graças a chefs e prêmios, a eventos e investimento dos governos — como no caso do Rio, que abocanhou logo duas das mais importantes premiações do setor: os 50 Best e o Michelin —, aos poucos vamos mostrando ao mundo por que podemos ser uma potência da gastronomia mundial.
E termos restaurantes com as nossas principais receitas espalhadas por restaurantes por todo o mundo — para lá das Brazilian steakhouses — como países como o Peru, o México e outros que estão mais próximos de nós já conseguiam tão bem.
Comendo pelas beiradas, podemos ser um dos novos países que atraem hordas de turistas e o interesse do mundo pelo que servimos. E, obviamente, pela maneira de fazê-lo — isso sim, tão único e tão nosso.
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