Não é só impressão sua: os restaurantes estão cada vez mais barulhentos
Ninguém precisa de um aplicativo desses capazes de medir com boa resolução os decibéis para constatar que os restaurantes, esses que nós comumente frequentamos, se tornaram espaços muito, muito ruidosos.
Sim, a comunicação em muitos deles ficou insustentável com o barulho que passou a dominar esses lugares e onde frases como "pode repetir?" e" desculpe, não entendi", ditas com um ligeiro esforço para cerrar os olhos, se tornaram respostas comuns para a pergunta "vocês já sabem o que pedir?".
Nos finais de tarde quando chega a equipe inteira da firma para o happy hour, então, há uma confirmação de que o papo das mesas do lado não vai fluir nada bem — e em poucas horas, todo mundo estará, literalmente, gritando.
"Gritando" não é força de expressão: os restaurantes atingiram nos EUA uma media de 80 decibéis em seus horários mais movimentados. Isso significa um ruído semelhante a uma motocicleta, o que obriga as pessoas a aumentarem seus tons de voz duas ou até três vezes, gerando mais e mais ruído.
Em São Paulo, no Rio de Janeiro, ou em qualquer cidade brasileira, a tendência se confirma, é só tirar a prova com plataformas gratuitas que fazem a medição — e ter uma ideia dos altos decibéis a que donos de restaurantes estão expondo nossos ouvidos.
Principal reclamação: ruído
Algumas pesquisas feitas por empresas ligadas aos restaurantes, como Zagat e a Consumer Reports (de defesa do consumidor) descobriram que o ruído excessivo se tornou a principal reclamação dos clientes — mais que erros no serviço ou até mesmo pratos que chegam errado.
Os restaurantes e bares são lugares incômodos para muitas pessoas justamente por conta disso; muitas se viram obrigadas a mudar seus horários de visitas a eles (mais cedo, por exemplo, quando há menos gente) por conta da cacofonia que é gerada em ambientes assim.
Começa pelos ruídos dos garfos e copos nas mesas ao mesmo tempo, depois mais vozes, a música que ficou mais alta, o chef gritando ordens aos cozinheiros, os garçons tentando explicar o menu? a poluição sonora está instaurada.
Alguns chefs e profissionais de sala defendem que faz parte da alta energia do restaurante a música subir a partir do momento que os clientes, mais soltos, também aumentam o tom.
O álcool sobe, o som também
E, de certa forma, eles até têm certa razão em alguns casos: estudos indicam que as pessoas acabam por consumir mais álcool em situações assim. O volume geral aumenta no ambiente e se reflete também na graduação alcoólica, o que aumenta a conta.
Isso porque, defendem alguns cientistas, o álcool ajuda a abafar nossa audição — ou o sentido de audição geral que temos de um ambiente. O cérebro, sob efeito de bebidas, diminui a percepção dos sons.
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Quero receberIsso explica por que as pessoas "mais altas" numa mesa de bar também falam mais alto: eles não se ouvem tão bem como o normal e falam mais alto para compensar — como quando estamos com fones no ouvido. Aí, os decibéis aumentam.
E isso não é apenas extremamente incômodo para os clientes e suas interações na mesa, mas sobretudo representam uma ameaça à saúde pública, especialmente grave para as pessoas que trabalham neles ou os frequentam regularmente.
Cozinha aberta, cozinha barulhenta
Especialistas em acústica dizem que o problema não é recente, claro, mas que o design dos novos restaurantes foi determinante para piorar a barulheira desses locais nos últimos anos.
Primeiro, a ideia das cozinhas abertas, que passou a dominar a gastronomia com o objetivo de deixar os restaurantes mais "transparentes" aos clientes, adicionou decibéis a mais nessa equação.
Sem divisórias com o salão, toda a confusão que acontece entre fogões e panelas, entre chefs e seus subordinados, se propaga diretamente para as mesas.
Uma questão de design
Por outro lado, a estética mais clean e industrial de muitos espaços modernos também contribuiu para o barulho: materiais como metais e vidros, além de paredes cimento queimado, tão na moda, ajudam a refletir o som de volta para o ambiente.
Muitos restaurantes também deixaram de usar materiais que ajudam a absorver as ondas sonoras, como madeiras e estofados, e na maior parte das vezes nem sequer investem em soluções antirruído.
Gastam milhares de reais em cadeiras modernas, mas não investem um décimo disso em espumas e outras soluções acessíveis que poderiam ajudar a minimizar o problema.
O assunto ficou tão sério que Tom Sietsema, crítico de restaurante do The Washington Post, um dos maiores jornais do mundo, passou a inserir informações sobre os ruídos dos lugares que frequenta em Washington para escrever seus textos.
E decidiu que esse seria um critério importante de suas avaliações. "Já estou ficando sem adjetivos para descrever restaurantes barulhentos nos meus textos", disse ele, em uma entrevista ao próprio jornal.
O jornalista conta que sugestões de "lugares sossegados" têm sido os conselhos mais pedidos por seus amigos e leitores quando querem dicas de onde comer. Alta gastronomia só no prato. Na hora de comer fora, os clientes estão mesmo desejando é sossego.
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