Por que Trump é viciado em McDonald's? A razão vai além da política
A camisa impecavelmente limpa, o avental imaculado e o sorriso branco no rosto de um bronzeado alaranjado não deixavam dúvidas: Donald Trump estava em seu habitat natural.
No domingo (20), o ex-presidente e candidato novamente à cadeira pelo Partido Republicano foi até um McDonald's em Feasterville, na Pensilvânia, e preparou batatas fritas. Em seguida, serviu-as aos clientes no drive-thru, sorrindo e acenando enquanto entregava os sacos de comida.
Era claramente parte de uma estratégia de sua campanha para mostrar um lado mais mundano e trabalhador do empresário e bilionário que tem chances reais de regressar à Casa Branca.
Um lugar familiar
Poucos lugares, porém, são tão familiares para Trump como uma loja do McDonald's, onde ele frequentemente passa para comer — ou de onde vem a comida com a qual ele se alimenta muitas vezes na semana.
Basicamente, o cardápio do presidente no menu das lojas dos Arcos Dourados consiste em "dois Big Macs, dois Filet-O-Fish e um copão de milkshake de chocolate maltado".
Pelo menos foi o seu menu quase diário durante a sua primeira campanha, antes de ascender ao cargo mais importante dos Estados Unidos, como tornou público seu ex-organizador de campanha David N. Bossie.
Logo que Trump descia de um palanque, seu assistente Corey Lewandowski pegava o carro e corria ao McDonald's mais próximo enquanto os coordenadores o mantinham informado e o atualizavam sobre seu desempenho. Muitas vezes era a única refeição que ele tinha no dia.
Hambúrguer na Casa Branca
A paixão pelos Big Macs seguiu também durante a presidência: já empossado, um de seus primeiros pedidos foi que os cozinheiros da Casa Branca recriassem uma versão do Quarterão com Queijo, seu sanduíche favorito de todos os tempos, além de tortinhas de maçã recheadas — a equipe respondeu que "não poderia atender ao pedido".
Li muitas biografias e algumas dezenas de reportagens para tentar descobrir a razão pela qual Trump era tão fanático por lanches e refeições servidas no McDonald's — o que culminou em um dos capítulos do meu livro, "As Revoluções da Comida" (Todavia).
A obsessão por fast food não denota apenas o paladar infantil do ex-(e talvez futuro) presidente dos EUA — que já ficou conhecido por só comer bife bem passado com ketchup —, mas sobretudo um comportamento mais íntimo dele.
Trump já declarou ser germofóbico, alguém com um medo irracional de germes, um nojo patológico de sujeira, de onde quer que ela venha.
Por isso, prefere comer um sanduíche devidamente embalado em uma caixa de papel cartão do que qualquer coisa que seja servida em um prato de louça que passou tempo demais em contato com o ambiente de um restaurante cheio de gente.
Trump acredita que a comida mais segura que se pode comer em qualquer lugar vem de um balcão de fast food. O processo semi-industrial da rede de lanchonetes, depois copiado no mundo todo, é algo que lhe garante a insuspeição do que pode consumir.
Embora a imagem do fast food tenha sofrido muito arranhões ao passar das décadas, culminando em uma série de críticas de nutricionistas, gastrônomos e ativistas alimentares por se tratar principalmente de uma comida ultraprocessada, algo permaneceu imutável na essência de seu sucesso (e justamente por conta desse fator, inclusive): o padrão, algo dificílimo de alcançar em uma cozinha.
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Quero receberE qualquer bom chef sabe disso. Basta comer um hambúrguer em qualquer uma dessas redes hoje e voltar a comê-lo meses depois. Tudo segue praticamente imutável: o mesmíssimo sabor regular, a mesma textura padrão a preencher a boca, a mesma experiência como refeição em si.
A constância de saber exatamente o que se vai encontrar numa mordida é que principalmente determina que as pessoas encarem a fila do drive-thru, voltem para mais uma calórica sessão de ingestão de batatas fritas e escolham uma dessas lanchonetes em detrimento das outras dezenas de opções de uma praça de alimentação de um shopping qualquer.
O fast food, como conceito, tornou-se uma imagem da eficiência americana: a capacidade de manter padrões, de obstinação, algo que Henry Ford já tinha feito pelo país em outro segmento.
Desde a sua primeira campanha, sempre fez questão de aparecer em fotos com os dedos lambuzados pelo excesso de gordura e condimentos, em uma ótima tática de popularização de sua imagem.
"Não há nada mais americano e do povo que fast food", chegou a dizer um dos estrategistas do Partido Republicano antes de o presidente ser eleito ainda em 2016. A ideia, agora, é repetir a fórmula apostando em uma fórmula repetida.
Desta vez, tentaram ainda associar Trump a uma ideia de trabalhador — aproveitando-se do fato de que 1 em cada 8 americanos já trabalhou em uma loja do McDonald's, como a sua adversária Kamala Harris, que afirma já ter fritado hambúrgueres ali.
Nas fotos, Trump parece mais à vontade ao olhar para as batatas do que ao fritá-las. Resta saber se, para prová-las, ele pelo menos arregaçou as mangas da camisa branca e sujou o avental de ketchup.
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