Ele fez um atlas do McDonald's e celebrou até nossa 'piscininha de cheddar'
Tudo começou durante o Ramadã de 2018, quando o fotógrafo Gary Hee estava em Marrocos e se refugiou em um McDonald's de Marrakech para um almoço familiar, mas recebeu uma refeição inesperada: junto com o combo de hambúrguer, batatas e refrigerante, chegou às suas mãos um pacote com tâmaras acompanhado de uma chebakia (um doce local), sopa de tomate e legumes e uma garrafa de Laban (leite fermentado).
Hee olhou para a comida — que os muçulmanos ingerem para sair do jejum durante o Ramadã — e ficou intrigado como a uma marca de hamburguerias que ajudou a padronizar refeições no mundo todo podia ter algo tão customizado para os locais.
A combinação inesperada, tão distinta do que estamos acostumados em uma rede de fast food, despertou a curiosidade do fotógrafo. Foi quando ele teve a ideia de criar um projeto que servisse como um estudo da "antropologia social visual", como define, da maior rede de fast food do mundo.
O objetivo? Visitar o máximo de países possível, comer em diferentes McDonald's e registrar tudo com sua câmera e anotações. O resultado dessa empreitada, que percorreu mais de 50 países em seis continentes, acaba de chegar em livro ao mercado editorial dos EUA.
"Méqui-mundi"
Fotógrafo de comida premiado, Hee lançou o McAtlas, um verdadeiro mapa-múndi sobre o que o McDonald's tem servido em distintas nações onde está presente. Ou, como ele explica, "uma visão revigorante e real de uma das marcas mais reconhecidas da história".
O compêndio é focado, sobretudo, nos itens dos menus locais criados pelo McDonald's: mais do que saber qual a batata frita era mais saborosa, ou como o Big Mac varia de nação em nação, ele estava interessado em desvendar o único diante do padronizado.
E o que o livro mostra é que há um grau surpreendente de variedades dentro do ecossistema da rede de fast-food — um comportamento, aliás, que foi adaptado em muitos países, e não só aqueles com restrições a algum tipo de alimento, por exemplo.
"Cada item que fotografei foi comprado em um restaurante McDonald's e apresentado como ele apareceria para um cliente: sem truques de estilo de comida de estúdio fotográfico, como usar ingredientes falsos", garante.
Por isso, é curioso folhear as páginas e conhecer alguns produtos que nunca imaginaríamos ver em uma cadeia de fast food.
Tradição resiste à globalização
Na França, um dos itens mais icônicos do menu é o McBaguette, introduzido pela primeira vez na França em 2012 e que sempre reaparece com novos recheios de tempos em tempos.
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Quero receberNa Arábia Saudita, o McArabia Chicken foi criado em meio a uma série de boicotes que empresas norte-americanas sofreram depois de operações dos Estados Unidos no Afeganistão e no Iraque pós-11 de setembro.
A ideia era mostrar aos locais que, no país árabe, a marca era operada por empresários locais, o que os fez sinalizar aos árabes com esse sanduíche que remeteria aos shawarma populares na região.
"A presença do McDonald's no Golfo cresceu tremendamente desde então — o Kuwait mais que dobrou sua contagem de lojas, enquanto as lojas sauditas triplicaram em número — e todas elas ainda apresentam orgulhosamente o McArabia Chicken em seus menus", explica Gee no livro.
A estratégia foi uma forma da empresa global manter sua popularidade e impulsionar suas vendas internacionais — já que cerca de 27 mil dos 40 mil restaurantes da marca estão fora dos EUA.
Hee conta que sua ideia foi tentar relatar um outro lado do McDonald's pós-expansão global, já que a maioria dos livros publicados ou foca-se na história da marca ou nas críticas ao que sua dieta — e sua cultura — representa.
De documentários como Super Size Me, sobre comer McDonald's todos os dias, ao livro, Fast Food Nation, que discorre sobre os danos à alimentação de uma dieta tão centrada em produtos ultraprocessados, a marca sempre teve uma imagem arranhada.
O fotógrafo não quer propor nenhuma ideia de rendição, mas mostrar, sobretudo, como nem mesmo os maiores valores da globalização superam tradições e costumes locais. O McAtlas oferece um olhar mais neutro e curioso.
"Talvez seja constrangedor admitir que gastei tanto do meu próprio dinheiro para documentar o McDonald's, mas é a maior rede de restaurantes do mundo com o maior poder de influência", disse ele em entrevista ao Atlas Obscura.
Gee ressalta que o poder do McDonald's é tão significativo que, em alguns países, a adição de um item ao menu pode interferir drasticamente no preço que ele pode ter no mercado.
Piscininha, meu amor
Entre os itens que o fotógrafo destaca no livro de 420 paginas estão a sopa de macarrão da rede em Hong Kong — em alusão a um hábito que surgiu durante o período colonial britânico como uma forma de os moradores da classe trabalhadora acessarem a culinária ocidental.
"Trata-se de uma massa coberta com presunto em uma tigela de caldo de carne ou frango, geralmente consumida como prato principal do café da manhã", explica no livro.
Outra receita que chamou sua atenção foi café da manhã que a rede oferece na Guatemala: uma variedade de ovos mexidos, salsichas, bananas-da-terra, feijões fritos, salsas e tortilhas, que Hee proclama como "o melhor café da manhã que você pode tomar no McDonald's do mundo".
Curioso que um dos itens preferidos dele no livro foi desenvolvido no Brasil, um país tão louco por cheddar que fez a rede dos Arcos Dourados local criar um pote servido apenas com 100 ml do queijo, para mergulhar nuggets, batatas ovo o que se quiser.
Batizado de "A Grande Chuchada do Cheddar", era apenas isso, uma "piscininha de cheddar", como diz a campanha local, servida como molho, sem nenhuma inovação. Mas tão apelativa aos brasileiros que a rede voltou a oferecer o item uma segunda vez.
Brasil fã da rede
Como um Atlas, o livro também indica lojas do McDonald's onde comer pelo mundo. Uma das mais curiosas está em Taupo, na Nova Zelândia, onde um avião DC-3 foi transformado em uma área para os clientes comerem.
Hee também destaca o McDonald's do Brooklyn, na Cidade do Cabo, que, segundo ele, pode ter a melhor vista dos mais de 40.000 estabelecimentos do mundo
O terraço no segundo andar tem vista privilegiada para a Table Mountain e a Lion's Head. Nesta lista está de novo o Brasil, com o icônico Méqui 1000, na Avenida Paulista, em São Paulo.
O Brasil é "um dos nove países que têm mais de mil locais do McDonald's" no mundo, ele explica. "Para comemorar o marco em 2019, a rede abriu o palaciano Méqui 1000, assumindo o apelido que os locais tão carinhosamente deram à marca, algo incrível", conclui.
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