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Filme e 'Copa dos bartenders' provam que bar é sangue, suor e paixão

Miyazaki Yui Ogata em "Spirit", documentário da Diageo que retrata rotina de três finalistas do World Class global - Divulgação
Miyazaki Yui Ogata em "Spirit", documentário da Diageo que retrata rotina de três finalistas do World Class global
Imagem: Divulgação

Editora e colunista de Nossa

05/06/2023 04h00

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"Que que esse cara tá fazendo?". Foi essa a minha reação, lá em 2019, ao ver Gabriel Santana vestido com um roupão de boxeador para a final do World Class Brasil, a etapa nacional do que é considerada a "Copa do Mundo dos bartenders".

Para quem estava entre o sisudo mundo dos vinhos e o pretensamente largadão universo da cerveja, entrar escandalosamente e com muito humor numa final de campeonato parecia um suicídio social, um pedido para não ser levado a sério.

Ledo engano. Gabriel saiu merecidamente campeão e eu paguei a língua.

Direto do posto de observação de um bom bebedor que se preze — o balcão de bar — a gente pode até sentir essa aura peculiar dos bartenders, mas entendê-la são outros quinhentos. É storytelling? É teatro? É arte?

"Chef's Table" dos drinques

Segundo "Spirit" (Prime Video), documentário que tem etapa global do competição da gigante das bebidas Diageo como pano de fundo, é tudo isso e um mais um monte.

A superprodução usa da mesma fórmula de sucesso da série "Chef's Table" (Netflix), que tenta traduzir a alma de chefs premiados para um público amplo em episódios de impecável estética e inédita abordagem que combinava vida pessoal e profissional de nomes como Alex Atala e Massimo Bottura.

"Nerds do sabor", "perfeccionistas", "maníacos do equilíbrio": são incontáveis os adjetivos elencados por competidores e júri do filme. Mas os superlativos são só verniz para um recorte muito mais humano, necessário e interessante.

A produção acompanha a rotina pré-final do World Class global 2022 de três competidores: a japonesa Miyazaki Yui Ogata, a finlandesa Liisa Lindrros e o indiano Sahil Essani.

Se a primeira carrega consigo o peso da tradição, que a fez prometer para o pai que seria a melhor bartender do Japão para seguir na carreira, a segunda escancara ousadia e emoção — a frieza nórdica passa longe da competidora que tinha a segunda e última chance no WC.

O terceiro, porém, é um monumento à resiliência, à criatividade e à paixão pelo universo da mixologia. De Goa para Sidney, palco da final, foi uma batalha digna de cinema: contra o tempo, as burocracias e, claro, os desafiantes.

Sahil Essani, em "Spirit" - Reprodução/Instagram - Reprodução/Instagram
Sahil Essani, em "Spirit"
Imagem: Reprodução/Instagram
Liisa Lindrros na final em Sidney - Reprodução/Instagram - Reprodução/Instagram
Liisa Lindrros na final em Sidney
Imagem: Reprodução/Instagram

Afinal, "são 23 minutos que mudam sua vida para sempre", como diz Barrie Wilson (um dos nomes estrelados a rasgar o coração pela coquetelaria no doc).

Mas não, esta coluna não dará nenhum spoiler além deste: nenhum deles levou o prêmio máximo. E nem por isso o filme deixa de retratar a história de vencedores.

Sim, o importante é competir. E não é papo de mãe...

Esta coluna perguntou a campeões anteriores da etapa nacional o que estar na final global mudou em suas vidas. Tire suas próprias conclusões:

Vinicius Demian, campeão do World Class Brasil 2022
"Hoje estou vivendo em Paris, um projeto meu antigo que já iria realizar, mas as coisas aconteceram muito mais rápido e de uma maneira muito melhor para mim, tudo por causa do impacto do World Class Brasil na minha vida.

Ter o selo WC no currículo abre portas e oportunidades para você, além de te dar uma família nova de bartenders que fica espalhada pelo mundo".

Gabriel Santana, campeão do World Class Brasil 2019
"O World Class abriu várias portas na minha vida. E isso desde a primeira vez, quando fui para a final mundial no México representar a Suíça.

Depois de ganhar a etapa nacional pelo meu país de origem, em 2019, senti que novamente novas portas se abriram. Hoje posso dizer que grande parte do sucesso do meu bar se dá a essa conquista"

Kennedy Nascimento, campeão do World Class 2015
"O que mais agregou a minha vida foi a experiência de participar do maior campeonato de coquetelaria do mundo contra os melhores bartenders do mundo sendo avaliado pelos profissionais que mais admiro no mundo, o tipo de profissional que escreveu os livros que nos formaram."

E aqui no Siga o Copo você viu entrevistas com duas n°1 de World Class Brasil: Adriana Pino em 2018 e Bianca Lima, em 2021.

Porque me ufano

Brasil, país da coquetelaria? Não é pra tanto. Mas já dá para bater no peito e encher a boca para falar da fase.com.br dos drinques e dos profissionais brasileiros.

É cachaça celebrada pelos quatro cantos do mundo, é Rabo de Galo prestes a entrar para o Olimpo da Coquetelaria (aka International Bartenders Association) graças ao trabalho árduo e missão cumprida do eterno Mestre Derivan, é Macunaíma estampado na imprensa internacional com trabalho do meu colega colunista e amigo do peito Rafael Tonon e é...

... a finalíssima do World Class global sediada em São Paulo de 23 a 27 de setembro — imagina um "Spirit 2"? Hein? Hein?

Por ora, vale guardar sua torcida para Vitória Kurihara, a vencedora do World Class Brasil 2023, sabendo que longe passa o glamour, mas também longe leva o sangue, suor e paixão dos bartenders.

*Trilha sugerida de harmonização com essa coluna: O Verão - Presto, de As 4 Estações, de Antonio Vivaldi

Quem quiser bater um papinho, sou a @sigaocopo no Instagram.