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Reportagem

Da Caipirinha de rum às minas-maravilha: como foi a Copa dos drinques em SP

Você lembra quando o Brasil sediou a Copa de 2014? É muito semelhante a muito do que se viu e se sentiu na etapa global do World Class, competição que reuniu 54 bartenders do mundo todo numa semana de desafios promovidos pela gigante das bebidas Diageo.

Também como a festa do futebol, a celebração dos drinques sediada pela primeira vez em São Paulo e segunda vez no Brasil teve momentos de puro e genuíno encantamento e, sem dúvida, de decepções.

O choque da Zacaipirinha

Jacob em plena produção de... Zacaipirinha
Jacob em plena produção de... Zacaipirinha Imagem: Juliana Simon/UOL

Vamos tirar esse elefante da sala logo de cara. Quem conhece a bebericagem nacional sabe de cabeça a receita de Caipirinha de cabeça: limão, açúcar refinado, cachaça, e cubos de gelo. Macera o limão com açúcar e acrescenta gelo e cachaça e mexendo. Estamos de acordo, leitor?

Esse é o primeiro drinque brasileiro reconhecido internacionalmente como um clássico - agora ao lado do Rabo de Galo.

Pois bem. Entre os 12 finalistas que competiram pelo título, somente poucos fizeram uso do socador e alguns (respira) sacaram a coqueteleira.

Mas, que me desculpe a gigante, o erro mesmo ficou na conta dela. Foi fornecido aos bartenders gelo picado, xarope simples e.. e.. e... rum Zacapa. Numa etapa que pedia a produção de Cai-pi-ri-nha.

A lambança estava montada e os critérios de aprovação foram "inventividade" e sabor. Outro drinque clássico estava nessa etapa: um Martini. E, claro, não faltou gim geladinho e um especialista de peso para julgá-lo pela correção, sabor e temperatura.

Foi o inegável desrespeito a uma das nossas maiores joias da coquetelaria nacional.

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Nossa mulher lá: Néli

Néli Pereira, a hostess do World Class 2023
Néli Pereira, a hostess do World Class 2023 Imagem: Juliana Simon/UOL

Ela já foi citada aqui nessa coluna e deve ser muitas vezes mais: Néli Pereira.

Apresentadora oficial da etapa global do World Class, a jornalista, mixologista e pesquisadora foi, sim, a representante ideal para o evento. Porém, perdeu-se uma oportunidade de ouro de colocá-la também além do host dos desafios.

Digo isso por duas de suas grandes abordagens: a dos ingredientes brasileiros que ela explora e divulga há anos, seja em seu Espaço Zebra (em São Paulo), seja em seu livro "Da Botica ao Boteco" e até mesmo em suas redes sociais.

Fica a dica para uma longa entrevista de Néli a Pedro Bial veiculada essa semana na Globo. Imperdível para amantes dos drinques e garrafadas.

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Outra tecla batida por Néli constantemente e sempre muito necessária a bebedores do Brasil e do mundo: a de trocar o beber aos montes pelo "beber melhor".

Foram muitos os painéis realizados desde o começo da semana voltados para a indústria mundial de bebidas e muitas oportunidades de mostrar isso também para um público além dos profissionais. Uma pena.

Nossa mulher lá 2: Vitória

Vitoria Kurihara, a representante brasileira do World Class 2023
Vitoria Kurihara, a representante brasileira do World Class 2023 Imagem: Divulgação

Vencedora da etapa brasileira, Vitória Kurihara foi à final do jeito que o Brasil gosta: com uma torcida apaixonada. Infelizmente, a finalíssima não chegou para nós, mas o brilho de uma mulher brasileira entre os melhores bartenders do mundo ninguém apaga.

Em breve conversa com os imprensers (nome cunhado por mim mesma, já que havia mais influencers que jornalistas na "cobertura" da história toda), ela avisa: prepare-se cena curitibana, você tem uma campeã cheia de vontade de colocar a capital paranaense no eixo dos ótimos drinques no Brasil e, claro, no mundo.

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"Nunca foi sobre ganhar. É um monte de gente de fora conhecendo minha cultura, minha comunidade de bar e trazer essa visibilidade pro Brasil é o maior prêmio", contou.

Entre a troca de experiências com os outros bartenders Vitória ressalta a valorização do profissional de bar lá fora - ofício que no Brasil em muitos momentos é visto como subemprego ou "brincadeira".

Cercada de novos amigos e com muitos planos pela frente (inclusive convites para guests pelo mundo), Vitória faz valer o nome - e a nossa torcida.

Nossa mulher lá 3: Aashie Bhatnagar

Os 12 bartenders do desafio final do World Class 2023: uma única mulher
Os 12 bartenders do desafio final do World Class 2023: uma única mulher Imagem: Divulgação

Muito além do prêmio de escolha do público que levou para casa, a indiana Aashie Bhatnagar carregou para a finalíssima uma a torcida de todas as mulheres que estão nesse círculo dos drinques.

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Nascida em uma pequena cidade indiana, ela representa uma mudança inspiradora em seu país: até 2015, as mulheres não podiam trabalhar dentro dos bares e atrás dos balcões. Estar entre os melhores do mundo somente 8 anos após essa revolução é, no mínimo, memorável.

Julgada "apenas" pela pessoa mais influente da coquetelaria em 2023, Monica Berg, Aashie amargou uma nota 4 no desafio final. Mas até nisso existe um lado muito positivo, pois vem provar que não é sobre favorecer mulheres, mas, sim, apoiar pelos mesmos critérios de habilidades, talentos e, claro, qualidade do que servem em seus copos.

Um detalhe nada divertido de acompanhar de perto: dois colegas de Aashie se esgoelando não tanto em torcida, mas em instruções. Não vi nada semelhante acontecer para os outros 11 competidores, todos homens.

A palestrinha roda o mundo e nunca cessa, ao que tudo indica.

É Copa? É Olimpíada? É ONU?

Não importa o nome que o jornalista queria dar para chamar atenção, pois o WorldClass é tudo isso mesmo.

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São 54 participantes da etapa global acompanhados de pequenas delegações, representantes globais da empresa-patrocinadora, jurados de todo o mundo e "celebridades" locais entre influencers e monstros da indústria. Um mundo todo num espaço do Tivoli Mofarrej, basicamente.

Foi bonito de ver as trocas, os abraços, os encantamentos dos gringos em bares paulistanos de nível internacional ou de carinho local (ou de ambos!).

Thiago Bañares, Agostino Perroni, Giacomo Giannotti, Monica Berg e Benja Padrón em conversa mediada por James Grant, o campeão do World Class 2021
Thiago Bañares, Agostino Perroni, Giacomo Giannotti, Monica Berg e Benja Padrón em conversa mediada por James Grant, o campeão do World Class 2021 Imagem: Juliana Simon/UOL

Numa sala, acompanhei ao lado de brasileiros, alemães, nigerianos e mais uma mesa dos melhores dos melhores bares do mundo: nosso Thiago Bañares (TanTan, Kotori, The Liquor Store), o italiano Giacomo Giannotti (Paradiso, de Barcelona, eleito o melhor do mundo no 50Best Bars), o rei do carisma Benja Padrón (Licoreria Limantour, da Cidade do México), o italiano mestre dos Martinis Agostino Perroni e Monica Berg (que pouca gente lembra, mas é da Noruega).

O vencedor do prêmio? O simpatissíssimo representante do Canadá, Jacob Martin. Ele superou, além de Aashi, da Índia, Renato Tonelli (Estados Unidos), Julian Short (África do Sul), Minhong Kim (Coréia do Sul), Fumiaki Nozato (Japão), Israel Barón (México), Christos Klouvatos (Grécia), Jakob Eggertsson (Islândia), Josh Mellet (Israel), Jan Sebek (República Tcheca) e Matt Arnold (Grâ Bretanha).

Sentada logo à frente dos QGs do evento, era um balé de idiomas nas poucas horas e minutos e segundos para a grande final. Estrangeiros eram só sorriso.

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O que era contagiante até perceber que ainda parecemos território exótico.

Mostramos Brasil?

No movimento das coqueteleiras de Vitória, sim, mostramos Brasil. Mas a sensação é de que ficou por aí. Da caipirinha de rum à festa carregada de clichês - com todo respeito à mini bateria de samba e ao dress code coloridíssimo requisitado pela organização - o Brasil não é só isso.

Ao olhar mais atento, crítico (ou pentelho, como queiram), os profissionais brasileiros que fizeram esse evento acontecer não estavam em tanto destaque quanto os de fora. Não um, nem dois, mas pelo menos três ídolos da coquetelaria brasileira estavam circulando tensos, irritados, frustrados pelos corredores. Bem diferente dos embaixadores do mundo na nossa casa.

Na finalíssima, onde todos estavam, ouvíamos "ACEROLA", "JABUTICABA" e dava um orgulho tremendo de saber que elas estariam em taças premiadas. Mas não sei bem quem daqueles que não estavam nos painéis vão realmente lembrar do que só nós temos.

A edição de 2024 será em Xangai - e os olhos se voltam para a Ásia com força, graças. Mais sorte aos chineses e que aS culturaS locais do país (plurais, sim. E MAIÚSCULAS) tenham espaço, força e festa, como o Brasil também merecia.

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Quem quiser bater um papinho, sou a @sigaocopo no Instagram.

Trilha sonora sugerida para este post: Supultura - "Ratamahatta"

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Texto que relata acontecimentos, baseado em fatos e dados observados ou verificados diretamente pelo jornalista ou obtidos pelo acesso a fontes jornalísticas reconhecidas e confiáveis.

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