Uma noite, em Bogotá, estive no melhor bar do mundo (do meu copo e coração)
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Pouco me importam os rankings e prêmios: fui ao melhor bar do mundo dia desses. Como qualquer paixão, não preciso ser racional, nem imparcial, logo, afirmo e confirmo que La Sala de Laura foi, de longe, o lugar que mais me impressionou em alguns anos de andanças etílicas por aí.
Esse arrebatamento começou muito antes de, finalmente, botar os pés em Bogotá.
Conheci Colômbia já fervilhante, em 2019, mas muito como uma turista que passou, curtiu e não mergulhou.
Bogotá foi somente uma conexão para Medellín, onde passamos um tanto de perrengue e vivemos de cerveja e arepas. Por Cartagena, a diversão era andar pelo lindo centro histórico num calor caribenho, bebericar muito rum, suco de Lulo e não ir além dos restaurantes baratos da (ótima) comida local - estava na mesma rua do Celele e não entramos. Ah, se pudesse voltar no tempo.
Com o arrefecimento da pandemia, e já mais atenta, fui me encantando primeiro pelas possibilidades gastronômicas, depois pelas etílicas.
Num susto, em menos de um mês, a Colômbia estava no centro do meu mapa imaginário: no final de 2023, um guest em São Paulo com o Mamba Negra de Medellín. No mesmo mês, a vinda de Laura Hernández Espinosa ao Brasil, eu fora do país sem possibilidade de conhecê-la e uma entrevista por e-mail que mudou tudo.
La Sala de Laura virou um pouco de obsessão.
Finalmente, lá

A volta à Colômbia e, desta vez, com pés fincados em Bogotá era minha chance de ver de perto tudo o que Laura havia dito na entrevista.
E, sim, agora as expectativas estavam ainda mais altas graças ao 44° lugar no 50 Best Bars e também pela escolha de Laura no 50 Best Restaurants latino como melhor sommeliére. Fazer o que? Quero mesmo ver qual é que é dos premiados.
Quem quiser, pode apenas entrar, beber e sair satisfeito com ótimos drinques e comida. Afinal, Leo - o restaurante - está logo ao lado e Leo - a chef e mãe de Laura - é responsável pelas bocadas cinco estrelas, ao estilo bistrô.
Mas recomendo fortemente pedir a apresentação de uma pequena sala, logo na entrada.

É lá que Laura conta mais sobre os destilados produzidos pela casa. Sob o nome Territorio Ciclobioma, provamos bebidas inspiradas em ecossistemas colombianos: Páramo, Vale Andino, Pé das Montanhas, Montanhas, Florestas Úmidas e Deserto.
Límpidos todos, sabores e corpos diferentes. A prova que nem só de Hemisfério Norte e os tradicionais gim, vodca, uísque e rum vive a boa destilaria.
Não deixei de pensar na imensidão de possibilidades para o Brasil, no trabalho hercúleo de Néli Pereira com suas garrafadas, como contou Rafael Tonon por aqui.

Também são da casa alguns vermutes e fermentados resgatados da identidade colombiana, como os a base de açaí, folhas de coca e borojó.
Da sala de aula para La Sala de Laura
Ainda que não estivesse no balcão (meu lugar favorito no mundo, talvez), não tem como perder de vista o que sai das garrafas do bar e da equipe elegante e silenciosa que sai dos fundos do grande espaço de iluminação baixa para colocar na sua frente drinque, prato e carta de tarô.
Explico.

Inaugurado em 2021, o bar se renova aos projetos de Laura e equipe. Com ares místicos, filosóficos - "ela é meio bruxa mesmo", diz a mãe Leo — em fevereiro de 2025, a carta Arcana se inspira no tarô e na biodiversidade colombiana.
A cada drinque, sua deliciosa correspondência gastronômica entre arepas, dumplings, baos, hand rolls, espumas e até uma espécie de sanduíche de atum entre bolachas de sementes. E uma Laura, hoje gestante, para cima e para baixo explicando cada detalhe, assertiva e apaixonadamente.

Para ficar somente entre os favoritos, destaco:
- o Mago, que virou o drinque El Frailejón, uma planta típica dos Páramos colombianos;
- o Sol se torna El Ají, um apimentado cheio de ousadia com base destilada de tamarindo e tequila;
- a Roda da Fortuna está representada como La Chagra, com tucupi, cúrcuma, planta de melancia;
- a Rainha se torna El Maiz, com vodca, azeite de tusa (uma planta das florestas úmidas locais);
- e o Rei que fecha a carta com El Café, claro, com rum, café, óleo de banana verde e uma moeda de cacau.

Ingredientes que nunca havia provado, em combinações que não experimentaria em mais nenhum lugar, com a criadora tão disponível a explicar - e não de uma forma professoral, mas curiosa em saber se fazia sentido às referências e paladares variados da mesa.
O que posso dizer? Em 10 de fevereiro de 2025, La Sala de Laura foi o melhor bar do mundo.
Da entrada à saída, foi uma noite de encantamentos pelos destilados próprios, pela carta de drinques, pelas harmonizações, pelo serviço, pela trilha sonora.

Por ser uma mulher, uma mulher latina, uma das "brabas" que botaram o pé na porta do mundo da coquetelaria e não têm planos de sair. Me senti em casa, como tantas vezes errei ao falar, na sala de Laura.
*A jornalista visitou o bar a convite do Grupo Leo e Agência Síbaris
**Trilha sugerida para harmonização com essa coluna: "Escrito nas estrelas", Tetê Espíndola
Quem quiser bater um papinho, sou a @sigaocopo no Instagram.
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