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Noruega fará túnel de navios em mar que assustava até os vikings
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62º01'N, 5º28'L
Futuro túnel de navios de Stadhavet
Stad, Vestland, Noruega
Um dos trechos mais perigosos do ultrarrecortado litoral norueguês vai ganhar o primeiro túnel de navios de grande porte do mundo. Ele atravessará a península Stad, um terror para navegantes há muito conhecido. O Stadhavet ("havet" é "mar" em norueguês), que marca o encontro do Mar do Norte com o Mar da Noruega, é uma área de navegação difícil e perigosa durante 90 a 110 dias por ano, com condições marítimas imprevisíveis, muito vento, topografia complexa e naufrágios recorrentes. Tanto que há 150 anos já propunham construir um túnel nessa península.
Segundo o jornal "The Norwegian American", em 1874 uma publicação local deu a seguinte manchete: "Kanaltunnel gjennom Stadt!" (ou "túnel através de Stadt!"). Cento e dez anos mais tarde, o debate voltou à mesa dos políticos. Desde os anos 1980 havia propostas para a criação do sonho, até que em 2013 ele entrou no plano de transporte nacional e em 2021 as obras foram autorizadas a começar.
Se tudo der certo, o túnel será inaugurado em 2025 e terá 1,7 quilômetros de extensão, 49 metros de altura e 36 metros de largura, o suficiente para a passagem dos navios que fazem as rotas regionais na Noruega. Ao deixar de contornar a península, as embarcações deixarão de fazer 56 quilômetros em cada viagem.
Mas há críticas ao projeto, estimado em 2,7 bilhões de coroas norueguesas (ou US$ 312 milhões). O custo-benefício não compensaria, pois embarcações atuais têm melhores condições de lidar com as condições marítimas ruins da região. A NCA, órgão que administra a costa norueguesa, afirma que o projeto economizará combustível dos navios e tornará as viagens mais previsíveis, sem depender tanto das intempéries marítimas.
Não será uma missão fácil. A empresa responsável é especializada na construção de túneis, porém fazer túnel para carro é uma coisa, para navios de 16 mil toneladas é outra. Fora que pioneirismo tem dessas, ela não tem muito onde buscar referências, já que não existe obra do tipo dessa magnitude.
O empreendimento precisará tirar do caminho cerca de 3 milhões de metros cúbicos de rochas. O primeiro passo será a perfuração horizontal a partir das duas pontas. Depois, explosivos para limpar o teto. Limiares de pedra nas aberturas manterão a água afastada durante a construção.
A expectativa é que até 100 navios por dia usem o túnel, que será de mão única, alternando o sentido de hora em hora. Embarcações comerciais terão prioridade na passagem, mas já se espera um incremento nas viagens de turismo, afinal o túnel por si só será uma atração a mais — em uma região repleta delas: Vestland, o condado onde fica Stad, esbanja fiordes e cachoeiras de tirar o fôlego, além da história e cultura de Bergen, que tem uma das regiões portuárias mais antigas do norte da Europa.
O túnel poderá resolver uma questão que os vikings já sabiam que era problemática. Uma das cópias feitas no século 13 do "Landnámabók", manuscrito sobre a colonização da Islândia feito 200 anos antes, menciona Stad:
"Sábios dizem que a partir de Stad, na Noruega, são sete dias de navegação até Horn, na Islândia oriental, mas de Snæfellsnes [península no oeste da Islândia] são quatro dias de navegação até Hvarf, na Groenlândia."
De Stad à Islândia oriental são cerca de 1.000 quilômetros. Do oeste da Islândia ao sul da Groenlândia são 1.200 quilômetros, e segundo os relatos vikings era um percurso que durava praticamente a metade. É claro que o que determinava isso eram outros fatores, como marés, mas dá para ter uma noção de que Stad não era dos melhores pontos de partida para nenhuma viagem.
Pode ser um novo marco nessa longa história, que começou bem antes do primeiro túnel navegável da Europa, o Malpas, em Hérault, na França, escavado em 1679. Há quase 3 mil anos, os persas levavam água de aquíferos ou poços à superfície por meio de aquedutos subterrâneos, o qanat. Um sonho antigo.
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