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Fiordes no deserto? Com paisagem surreal, Omã quer ser famoso como Dubai

26º20'N, 56º24'L
Kumzar
Khasab, Musandam, Omã

Um de cada cinco barris de petróleo do mundo passa por uma faixa de apenas 39 quilômetros de largura, o Estreito de Ormuz, que separa o Irã da Península Arábica e é a porta de entrada no Golfo Pérsico. É uma região estratégica para a economia global e tensa na geopolítica.

Isso não é uma exclusividade dos nossos tempos. As potências sempre estiveram de olho nessa região.

Na pontinha do estreito, chamada Península de Musandam, os portugueses, no auge de seu domínio no Oriente Médio, construíram um forte na cidade de Khasab, no começo do século 17. Duzentos anos mais tarde, eram os ingleses que representavam o imperialismo europeu na área. Uma enseada leva, até hoje, o nome de um governante da Índia britânica. Ali fica uma ilhota chamada Telégrafo, porque era um ponto importante da linha telegráfica que conectava Londres e Calcutá.

Castelo de Khasab, em Musandam, Omã
Castelo de Khasab, em Musandam, Omã Imagem: jacquesvandinteren/Getty Images/iStockphoto

No século 20, os britânicos ajudaram Omã, seu ex-protetorado do Oriente Médio, independente desde 1960, a assegurar o controle sobre a península. Hoje, Musandam é um exclave do Sultanato de Omã, cercado pelo mar do Estreito de Ormuz e ligado por terra ao vizinho muito mais badalado de Omã, os Emirados Árabes Unidos (como sempre, no pé do texto tem o mapa da região para você visualizar melhor).

Que lugar é esse?

O kumzari é um idioma local, falado por apenas 5 mil pessoas. É a língua do vilarejo de Kumzar, aonde só se chega de barco. É também a única língua persa da Arábia, e por isso ela tem muita influência do árabe, é claro, mas também do português e do hindi. Isso por si só já reflete os muitos séculos de intercâmbio cultural do estreito. De quebra, entrega também que esse lugar, apesar de remoto e aparentemente inóspito e deserto, não é tão isolado assim.

Praia de areia branca em Mirellas, no Golfo Pérsico
Praia de areia branca em Mirellas, no Golfo Pérsico Imagem: Getty Images
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Dubai, por exemplo, está logo ali, a duas horas de estrada. É um contraste monumental: as torres de aço e vidro dão lugar a muralhas de rocha beijando um mar de águas quentes e cristalinas. É como se fossem fiordes, o que lhe rendeu o apelido "Noruega da Arábia".

Mas é fiorde?

Enseadas com encostas íngremes e penhascos, tripas de mar encravadas entre montanhas: os fiordes são uma paisagem típica, especialmente, da Noruega (até a palavra é originária do norueguês). Mas eles também são comuns em outros países com latitudes elevadas, seja no Hemisfério Norte (Canadá, Dinamarca, Rússia, Islândia?) seja no Hemisfério Sul (Chile, Argentina, Austrália e Nova Zelândia). É uma exclusividade dessas regiões do planeta porque na origem dos fiordes estão geleiras que cederam sobre vales.

Logo, as paisagens de Musandam, tecnicamente, não são fiordes, porque não foram formadas pelo deslizamento de geleiras, mas pelo choque de placas tectônicas. Elas apenas parecem fiordes.

Da mesma forma, o Saco do Mamanguá, em Paraty, não é um "fiorde tropical" como muitos vendem, mas uma ria, um pequeno canal ligando a foz de um rio ao mar. É uma paisagem comum no litoral da Península Ibérica.

Não existe fiorde no Rio de Janeiro. Não existe fiorde no Oriente Médio. Mas o apelo turístico é forte e acaba atropelando a geografia e gerando essa forçação de barra.

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Turistas navegam no típico dhow para avistar golfinhos e os 'fiordes'
Turistas navegam no típico dhow para avistar golfinhos e os 'fiordes' Imagem: Getty Images

Nas planícies desérticas de Ras-Al-Khaiman, um dos sete reinos que compõem os Emirados Árabes Unidos, fica a única ligação por terra às enseadas, sacos e baías de Musandam. É por essa estrada pavimentada que a maioria dos (poucos) turistas chega à região.

Muitos povoados só são acessíveis por mar, o que preservou a identidade cultural e manteve o turismo de massa afastado. A maioria dos itinerários que partem dos EAU são passeios de bate-volta ao longo de Khor ash Sham, a maior das enseadas de Musandam. Os dhows, típicos barcos a vela comuns da Arábia à Índia, vão parando de baía em baía para os visitantes mergulharem entre corais, nadarem com golfinhos e admirarem outras formas de vida marinhas.

É possível contratar esses passeios em Khasab também, para quem já estiver em Omã. A oferta e a infraestrutura são bem mais precárias, mas os omanis se orgulham de sua hospitalidade. Segundo um repórter da rede americana CNN, um membro de seu grupo esqueceu um brinquedo de criança no hotel. O gerente fez questão de dirigir centenas de quilômetros e cruzar a fronteira para recuperá-lo e entregá-lo em mãos.

Mas só hospitalidade não enche barriga, então Omã está começando a investir nessa pérola ainda bem escondida. Aliás, o país, como um todo, é um grande desconhecido do turismo mundial. Já falei aqui na coluna dos grandiosos planos para mudar isso ao longo da década.

Próximo destino: Omã

A estrada entre os 'fiordes' e o mar do golfo, em Omã
A estrada entre os 'fiordes' e o mar do golfo, em Omã Imagem: Getty Images/iStockphoto
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Musandam faz parte do pacotão de investimentos para fazer de Omã o novo destino queridinho, além de pequena potência emergente, do Oriente Médio até 2030.

Só a posição estratégica, encravada no Estreito de Ormuz, já faria de Musandam um foco prioritário de investimentos. O potencial turístico a torna ainda mais irresistível.

Entre os maiores projetos estão um aeroporto em Khasab, uma universidade e um sistema de táxi marítimo, além de um aplicativo local de transporte. Haverá também novas estradas, incluindo uma rodovia cênica entre a vila de Kumzar e Khor Najd. "Khor" é a palavra local para "enseada".

Há planos ainda para embelezar as cidades e melhorar a infraestrutura turística. Segundo o jornal "Times of Oman", o número de visitantes na região vem aumentando. Foram 90 cruzeiros na última temporada, além de barcos menores, que não vinham antes. Khasab deverá ganhar um resort e um parque à beira-mar.

Talvez num futuro menos dependente do petróleo, o Estreito de Ormuz seja reconhecido pelas paisagens e pela cultura. Não por tensões geopolíticas.

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