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Não desistem! Escócia recebe enésima missão para achar monstro do Lago Ness

57º22?N, 4º20?O
Estátua do Monstro do Lago Ness
Highland, Escócia, Reino Unido

Tem uns mistérios da humanidade que nós insistimos em perseguir, por mais insolúveis, impossíveis, insustentáveis que sejam. Ou, talvez, quanto mais inviáveis eles são de desvendar, mais fascinantes se tornam, mesmo que sua busca varie entre a futilidade nascisística e a inevitável curiosidade de saber quando o mundo vai acabar.

Atlântida? Arca da Aliança? Rei Arthur? Jardins Suspensos da Babilônia? A lista é extensa, e hoje o tema é o monstro aquático mais famoso do mundo.

Mês passado, entusiastas da causa se reuniram para mais uma missão à procura da criatura misteriosa que habitaria o Lago Ness, no norte da Escócia. O que a expedição tem de especial em relação a tantas outras do passado é que é a maior já empreendida em pelo menos 50 anos.

O monstrão voltou a estar em alta. Apesar de sua existência jamais ter sido comprovada, ele faz parte da mística da paisagem das Terras Altas há bastante tempo.

História antiga

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Imagem: iStock

Adomnano de Iona foi um abade irlandês que viveu no século 7º d.C. Ele escreveu a hagiografia (narrativa da vida de santos) de São Columba (521-597), homem que teve papel central na introdução do cristianismo na Escócia. Na obra, Adomnano conta que São Columba viu um homem ser morto por uma criatura aquática. Ele fez o sinal da cruz, e o bicho fugiu. O encontro aconteceu no Rio Ness, que deságua no lago famoso.

Essa é a referência mais antiga ao mito, segundo a Biblioteca Britânica. Mas a febre do monstro começou para valer só no século 20.

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Em 1933, o jornal local "The Inverness Courier" reportou que um casal disse ter avistado uma criatura amedrontadora enquanto dirigia perto do lago. Outros depoimentos do tipo surgiram, e cientistas alegaram que podia se tratar de uma foca ou uma lula-gigante. No ano seguinte, o "Daily Mail" publicou a foto que transformaria o monstro em fenômeno global.

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Imagem: Commons

Ainda em 1934, um magnata chamado Edward Mountain organizou uma expedição com 20 pessoas munidas de câmeras e binóculos. Alegou ter visto o bicho dezenas de vezes, mas sem imagens.

Foi um ano prolífico. Um motoqueiro também contou ter avistado o monstro. Ele o desenhou e o submeteu ao crivo de um zoólogo, que não pôde tirar muitas conclusões além de que a criatura tinha comportamento de uma lontra.

Diversas missões retornaram ao lago nos anos 1960. Todas fracassaram. Em 1976, o americano Robert Rines liderou uma busca pela criatura abaixo da superfície. Com câmeras e sonares, a missão, patrocinada por um grupo de ciências aplicadas de Boston e pelo jornal "The New York Times", vasculhou as profundezas do Ness - que é bem grande: com 56 quilômetros quadrados e uma profundidade que chega a 230 metros, é o maior lago do Reino Unido em volume.

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Imagem: Commons
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Rines analisou carcaças e esqueletos em mais de 108 mil fotografias. Não chegou a nenhuma conclusão.

Em 1987, o naturalista Adrian Shine levou mais de 20 embarcações para tentar localizar, por meio de sonares, o monstro. Mais um fracasso.

Em 2003, a BBC usou 600 sonares e chegou a uma conclusão que não causou estupefação alguma: a criatura do Lago Ness não existe! Para reforçar seu ponto, a rede britânica testou o público com uma pegadinha: escondeu um poste abaixo da superfície e o levantava diante de um grupo de turistas. Quando essas pessoas desenhavam o que tinham visto, alguns dos rabiscos pareciam com a suposta cabeça do monstro.

Em 2019, um cientista neozelandês apresentou 250 amostras de DNA retiradas da água do Ness e constatou que elas tinham uma quantidade significativa de material genético de enguias. Isso não ajudou em nada quem desejava alguma comprovação de que o monstro seria um tipo sobrevivente de plesiossauro, uma ordem de répteis aquáticos jurássicos.

Maior grupo de observação

Assim chegamos a 2023, com a nova missão. O Loch Ness Exploration, formado por voluntários, é o maior grupo de observação desde 1972. O pessoal está entretido em rastrear as águas do lago à procura de movimentos suspeitos com tecnologias como drones com câmeras térmicas e hidrofones, para detectar sons debaixo d'água. O grupo da empreitada no Facebook tem 2,3 mil membros e está bastante ativo, caso você queira acompanhar o trabalho.

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Seguimos no aguardo de novidades.

Em tempo: em 1994, ficou comprovado que a fotografia dos anos 1930 era uma fraude das boas e uma das mais emblemáticas pegadinhas em que a imprensa caiu na história. Na década de 1930, M.A. Wetherell era um dos tantos que tentaram encontrar o monstro. Fotografou umas pegadas e as divulgou. Acontece que eram pegadas de hipopótamo.

Hipopótamo na Escócia? Wetherell fora vítima de um fanfarrão, que usou um porta-guarda-chuvas em formato de pata de hipopótamo para espalhar as falsas pegadas na beira do lago.

Wetherell foi exposto e se sentiu humilhado pelo jornal em que trabalhava, o "Daily Mail". Resolveu se vingar ao convidar seu genro, que manjava de escultura, e um amigo. O trio adaptou um molde do monstro em um brinquedo aquático, fez algumas fotos e as compartilhou com outro amigo, um cirurgião, também chegado a uma piada.

O médico vendeu as fotos ao jornal, que as publicou com estardalhaço. O humilhado Wetherell foi exaltado, mas o monstro continua brincando com nossa imaginação.

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