Árvore da morte: vítimas de lepra eram forçadas a viver dentro deste baobá
15º'01'S, 35º15'L
Árvore da Lepra
Parque Nacional Liwonde, Machinga, Malauí
O Malauí é um país sem saída para o mar, mas água é o que não falta: 20% do território, que é pouco maior do que Pernambuco, é coberto pelo Lago Malauí. Montanhas, savanas e florestas completam a paisagem, que faz do país um destino relativamente popular entre a turma do safári.
O Parque Nacional Liwonde figura entre os mais bonitos do continente. Ele é lar de grandes mamíferos, como o rinoceronte-negro (ameaçado de extinção) e algumas espécies de antílopes, além de mais de 300 espécies de aves. Visitantes podem observar centenas de elefantes e hipopótamos em veículos terrestres e aquáticos, através do Rio Shire.
Entre várzeas salpicadas de palmeiras-de-leque e candelabros (a árvore) e savanas enfeitadas ora pelo enfeitiçante preto-e-branco zebrino ora pelas multicores de aves como o abelharuco-de-cabeça-ruiva, há espaço também para história humanas. E nada bonitas.
Que lugar é esse?
A Árvore da Lepra é um grande baobá aos pés do Chinguni, o morro que se destaca no sul do parque, logo após a entrada. Uma placa simples, próxima à raiz, diz o seguinte, em inglês: "A sepultura das pessoas que sofriam de lepra no passado."
Ao lado dela, há uma fenda no tronco, que faz a curiosidade, estimulada pela narrativa dos guias turísticos, beirar o irresistível. Eles contam aos visitantes que, em meados do século passado, um surto de lepra atingiu com força uma aldeia em Liwonde. Os líderes, temendo que a doença se espalhasse ainda mais, condenavam os infectados a uma quarentena eterna no oco do tronco da árvore.
Na falta de tratamento eficaz disponível, as pessoas não tinham como se curar. Então ficavam lá até morrer, ao lado de cadáveres e esqueletos dos que já tinham tido o mesmo fim.
Doença tão antiga quanto carregada de estigma em diversas culturas, a hanseníase era encarada de maneira semelhante nesse rincão do Malauí como na Europa de um tempo atrás, quando leprosários eram destinos comuns para os infectados. O baobá de Liwonde era, na prática, um desses hospitais para isolar pessoas infectadas com lepra, quando se acreditava que a doença era muito mais contagiosa do que de fato é.
Quem visitou o lugar, como o blog sul-africano "Reprobate", diz que, mesmo décadas após o surto, ossadas permanecem dentro do oco da árvore. É um momento de contemplação sinistra, ainda mais com o choque de se estar em meio a uma beleza natural viva e estonteante. Explica a reportagem:
Pessoas que morriam de lepra não tinham direito a um ritual fúnebre tradicional, então não eram enterradas, mas deixadas penduradas em árvores em cemitérios ou amarradas e enfiadas em ocos de árvores
Nove pessoas tiveram esse destino trágico no baobá.
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Quero receberFaltam mais evidências quanto à veracidade total da história, que tem como fontes apenas os guias do parque. Mas, dado o contexto, ela faz sentido.
O país conquistou a independência em 1964, quando assumiu o novo nome. Antes, era o protetorado britânico de Niassalândia. A publicação inglesa "Leprosy Review", em 1940, dizia o seguinte:
Lepra é uma doença comum em Niassalândia. Só uma fração [dos infectados] se encontra em instituições para lepra. A distribuição é incerta, mas há indicações de que é mais frequente nas áreas populosas ao longo da margem do lago, ao sul da Baía Domira
Liwonde fica na região descrita. Hoje, felizmente, muita coisa mudou.
A hanseníase é considerada uma doença controlada. Os mais de 5 milhões de casos no mundo nos anos 1980 caíram para cerca de 200 mil em 2020.
Mas ela não está extinta. Ano passado, houve 500 casos no Malauí, em regiões onde a doença não dava as caras havia anos.
Por ora, isso não é uma preocupação. O país, que semana retrasada derrubou a necessidade de visto para turistas americanos, quer mais visitantes para ouvir suas histórias.
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