'Casa Branca' tem museu dedicado a um dos piores presidentes do mundo
41º18 N, 69º15'L
Museu Islam Karimov
Casa Branca, Tashkent, Uzbequistão
Apegado ao poder, ele alimentou por décadas um culto a sua personalidade de pai da nação. Amigo de alguns dos ditadores mais notórios e próximo de governos repressivos, isolou o país da comunidade internacional e virou um pária vergonhoso.
Sua filha e herdeira política se envolveu em escândalos e mais escândalos de corrupção. Estava metida numa trama com joias, lavagem de dinheiro, trabalhos de caridade suspeitos, bruxaria e luxos no exterior que incluem triplex em Paris, jatinho e iate.
Pense em quem você quiser, mas estou falando de alguém sem paralelo na nossa história. Islam Karimov, o bisonho ex-ditador do Uzbequistão.
Que lugar é esse?
O Uzbequistão é uma ex-república soviética lembrada quase sempre por causa de dois lugares, cujas histórias são peculiares como o próprio país. Um é o finado Mar de Aral, grande lago que perdeu mais de 90% do volume de água e que só não secou de vez por causa dos esforços feitos do outro lado da fronteira, no Cazaquistão.
O outro é Samarcanda, uma das cidades mais espetaculares da antiga Rota da Seda, mas cujos projetos de restauro e revitalização foram bastante criticados porque teriam transformado o local em uma pataquada cosmética feita para o turista se sentir um Marco Polo desbravador de shopping. Bem, há quem discorde e diga que, sem isso, ela seria só mais um amontoado de ruínas.
Com uma herança cultural milenar, forjada pelos encontros (e embates) de civilizações ao leste e ao oeste, o Uzbequistão é um destino turístico desejado por muitos que buscam roteiros ao estilo além-do-óbvio. Se Samarcanda é uma atração "obrigatória" nessa nação "alternativa", há também, é claro, destinos nada manjados dentro do país.
Um exemplo é o Museu Islam Karimov, dedicado à memória do ex-presidente. Karimov comandou o país desde 1990, às vésperas da independência e do desmantelamento da União Soviética. Só largou o osso do poder quando morreu, em 2016.
No ano seguinte, a capital, Tashkent, ganhou esse museu. Fica em um anexo do palácio presidencial Oqsaroy, construído durante o mandato de Karimov e uma homenagem (ou imitação barata?) da residência presidencial mais conhecida do mundo.
A instituição se dedica a mostrar a vida do ditador por meio de fotografias e pinturas que escancaram o que é, na prática, um culto descarado de personalidade. Tem Karimov ao lado de Putin e do então príncipe Charles. Tem também retratos de um estadista sereno, de gravata, sentado em pose calma e segura, ou ao lado de dois tigres vorazes ou com um eclipse de pano de fundo. Uma farta fonte de memes à la Coreia do Norte.
É bizarro, e pode ser divertido. Especialmente para quem não viveu sob o regime de Karimov. Afinal, é óbvio, não há menção às violações de direitos humanos, à perseguição a rivais políticos, à repressão à religião. Não se fala dos prisioneiros atirados em água fervente nem do patrimônio bilionário acumulado pela família.
Em 2006, Karimov foi eleito um dos piores ditadores do século 21 em uma lista elaborada pelo pesquisador americano David Wallechinsky. O museu em Tashkent é um ótimo local para não conhecer a sua história (ênfase em "não"), apenas o mito.
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Quero receberEm 2018, o culto ganhou nova força e Samarcanda, um novo mausoléu. A cidade de Tamerlão, um dos maiores conquistadores da história, agora tem também um monumento funerário dedicado a Karimov.
O edifício não é tão monumental quanto outros, mas visitá-lo faz sentido e torna uma visita a Samarcanda mais próxima da realidade controversa da geopolítica do Uzbequistão do que de um conto de fadas ambientado na Rota da Seda.
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