É o fim da "loira gelada"? Cervejarias "acordam" para o público feminino
Corpo escultural num cenário de praia, uma voltinha que revela as curvas e um homem à espera da "loira gelada" - seja ela líquida ou humana mesmo. Já viu esse filme? Após décadas de campanhas voltadas para o público masculino, as marcas de cerveja começam a despertar para o fato de que seu público não se restringe a homens heterossexuais.
Até pouco tempo, a marca Skol (da gigante Ambev) era uma das grandes cervejarias que insistiam nas "gostosas" em seus anúncios. Diante do crescimento do número de consumidoras - que hoje representa metade das vendas da marca – a mudança foi radical, como diz Maria Fernanda Albuquerque, diretora de marketing da marca.
A marca assume que fez, durante muito tempo, propagandas machistas. No Carnaval de 2015, a campanha da cervejaria foi acusada de incentivar o assédio às mulheres.
"A gente precisava de uma quebra icônica. Nenhuma marca da Ambev coloca mais a mulher objetificada", conta, após a repercussão da campanha "Redondo é sair do seu passado".
Em março, por conta do Dia Internacional da Mulher, a marca declarou que o uso da figura feminina nas campanhas, como foi feito no passado, já não representava o posicionamento da Skol. Na ocasião, oito artistas foram convidadas para fazerem releituras de pôsteres antigos da marca e mostrarem as mulheres fortes e independentes.
"Não é apagar a história. Ela aconteceu, mas ficou no passado. E redondo é deixar para trás o que não te representa mais", disse Maria Fernanda na época.
O caminho de conquista, no entanto, não tem sido fácil. "Acho que a gente mostrou que não é uma solução, é um caminho. Pode ser que a gente erre e acerte", diz.
E quem pensa que a marca quer falar diretamente à mulher, engano. Para Maria Fernanda, o importante é não separa-la do todo e promover uma igualdade real, agradando qualquer gênero que esteja com o copo na mão.
As 007 da vez
Se as consumidoras se sentem mais representadas, as marcas, por outro lado, devem esse despertar ao público feminino, cada vez mais atento às campanhas e mais exigente a produtos que não só não firam, como defendam inclusão e igualdade de gêneros.
Vanessa Brandão, diretora da marca Heineken, diz que é impossível traçar um perfil da mulher cervejeira. "A mulher cervejeira vem de todas as idades e classes sociais", diz.
Hoje, as mulheres já representam 40% do público consumidor da marca e, segundo Vanessa, nunca sofreu com propagandas estereotipadas.
"É uma libertação para mulheres e homens, pois todo mundo se sente à vontade de provar e gostar do que quiser. Seja uma mulher por uma cerveja forte ou um homem por uma cerveja mais delicada", diz.
Recentemente, a Heineken ganhou aplausos das cervejeiras com a campanha que coloca uma mulher como uma espécie de James Bond. Ao invés da figura frágil ou "decorativa", ela salva o dia e termina se refrescando com uma long neck.
Evolução definitiva?
Cliene Saorin, mestre-cervejeira e sommelier com 25 anos de experiência, acredita que essa nova fase das campanhas veio para ficar, apesar de alguns exemplos contrários que insistem em alardear cervejas divididas por gênero. "Quero crer, com otimismo, que a gente está evoluindo no discurso de inclusão não só de mulheres, como de negros e do público LGBT, e que seja uma tendência", diz.
Segundo Cilene, a entrada cada vez maior de mulheres no mercado e no consumo cervejeiro tem sido sempre fruto de conquistas lentas, mas que estão rendendo resultado e que quem ainda insiste nos estereótipos - seja nas propagandas, na sommelieria ou nas cervejarias - deve ser “engolido” por uma postura socialmente consciente.
E pra quem pensa que somente as grandes cervejarias precisam ficar atentas às mulheres, Cilene faz o alerta: as cervejarias artesanais e os entusiastas de marcas menos conhecidas também pecam pelas abordagens machistas, seja nas fábricas, na mídia, nos nomes de rótulos ou em eventos, como festivais e degustações, que ainda parecem ser território voltado para o público masculino.
"Por trás das cervejarias, desde as nano até as mega, existem pessoas mais ou menos preparadas para o tema da inclusão", diz.
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