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Primeira-dama faz da moda uma causa patriótica e sustentável

Janja usou, na posse de Lula, um conjunto de seda com tingimento natural assinado por Helô Rocha em parceria com as bordadeiras de Timbaúba - Ueslei Marcelino/Reuters
Janja usou, na posse de Lula, um conjunto de seda com tingimento natural assinado por Helô Rocha em parceria com as bordadeiras de Timbaúba Imagem: Ueslei Marcelino/Reuters

da AFP

16/03/2023 14h51

Desde que subiu a rampa do palácio presidencial, em janeiro, para a posse do marido Luiz Inácio Lula da Silva, a primeira-dama do Brasil, Janja Lula da Silva, tornou-se uma militante ativa da moda nacional, com um vestuário ligado a diversas causas sociais.

"Janja", como é conhecida a socióloga Rosângela da Silva, de 56 anos, trocou o estilo casual de "jeans" e tênis que manteve durante a campanha com o líder de esquerda, de 77, por um mais elegante, com desenhos feitos a partir de matérias-primas regionais, como algodão ou fibras de seda, com simbolismos coloridos.

Entre eles, uma estrela vermelha, símbolo do Partido dos Trabalhadores de Lula, na sola da sandália de couro; a estampa de Maria Bonita, ícone feminista nordestina, em uma blusa de seda; bordados de cooperativa feminina em um blazer, ou uma saia sustentável feita de retalhos.

Janja, que casou com Lula em 2022, "tem usado diversos elementos do marketing político para construir sua figura política como progressista, feminista e ligada a questões sociais", diz Benjamin Rosenthal, especialista em "marketing" pessoal da Fundação Getúlio Vargas.

Suas escolhas estão alinhadas com o objetivo de ressignificar o papel de primeira-dama, cujo termo ela descarta como "patriarcal" e pediu para não ser usado.

Paralelamente, ela pretende "levar estilistas brasileiros aonde for", como ela mesma disse em janeiro em entrevista à revista Vogue.

Janja, em seu vestido de noiva - Ricardo Stuckert/Ascom PT - Ricardo Stuckert/Ascom PT
Janja, em seu vestido de noiva
Imagem: Ricardo Stuckert/Ascom PT

A primeira de calça

Da marca brasileira Reptilia, ela usou modelos feitos com materiais reaproveitados, com tecidos de lojas antigas fechadas e outros feitos com casca de algodão.

"Ela traz a praticidade para o papel de primeira-dama, de uma pessoa muito mão na massa", analisa Heloisa Strobel, 36, fundadora da Reptilia, que ganhou destaque especial com uma saia vermelha usada por Janja na Argentina.

"Não é aquela primeira-dama que vai usar um vestido justinho abaixo do joelho e que mal vai conseguir andar", acrescenta.

Por outro lado, essa é uma vestimenta comum da esposa do ex-presidente Jair Bolsonaro (2019-2022), Michelle, que costumava usar cores pastéis em contraste com os tons fortes de Janja.

Janja usou, na posse de Lula, um conjunto de seda com tingimento natural assinado por Helô Rocha em parceria com as bordadeiras de Timbaúba - Ricardo Stuckert - Ricardo Stuckert
Janja com o conjunto de seda da posse de Lula
Imagem: Ricardo Stuckert

As estilistas Helo Rocha e Camila Pedrosa chamaram a atenção ao vesti-la para o casamento e posse de Lula, no dia 1º de janeiro, em Brasília, cerimônia em que ela não usou vestido, quebrando os costumes das primeiras-damas brasileiras.

Na ocasião, Janja vestiu uma calça de seda tingida com castanha de caju e ruibarbo — que crescem no Brasil —, com bordados de palha de tradição indígena feitos por artesãs do Nordeste.

A designer Juliana Macedo, que criou os sapatos que Janja usou na posse presidencial - MIGUEL SCHINCARIOL/AFP - MIGUEL SCHINCARIOL/AFP
A designer Juliana Macedo, que criou os sapatos que Janja usou na posse presidencial
Imagem: MIGUEL SCHINCARIOL/AFP

"A calça é um símbolo da emancipação feminina. Em Brasília, até cerca de 20 anos atrás, as mulheres não podiam usá-la para entrar no Congresso ou no Supremo Tribunal Federal", explica Rocha.

A modernidade de Janja contrastou com o estilo clássico do marido Lula, que vestiu terno escuro e gravata.

O presidente Lula e a primeira-dama Janja da Silva em evento do Dia Internacional da Mulher no Palácio do Planalto - EVARISTO SA / AFP - EVARISTO SA / AFP
O presidente Lula e a primeira-dama Janja da Silva em evento do Dia Internacional da Mulher no Palácio do Planalto
Imagem: EVARISTO SA / AFP

Mais profundo

Na Misci, marca de destaque na São Paulo Fashion Week, a socióloga comprou blazers, saias e camisas, como a que homenageia a nordestina Maria Bonita.

"A moda materializa o momento sociopolítico. Janja pegou ferramentas da marca para falar através do que ela veste", diz Airon Martin, 31, criador da Misci.

Airton Martin, fundador e designer da Misci, mostra peças usadas por Janja - MIGUEL SCHINCARIOL/AFP - MIGUEL SCHINCARIOL/AFP
Airton Martin, fundador e designer da Misci, mostra peças usadas por Janja
Imagem: MIGUEL SCHINCARIOL/AFP

"Lá fora, o Brasil é conhecido pelo Carnaval. Mas o Brasil é mais profundo que isso. Também temos uma indústria de luxo muito poderosa, com sedas e algodões incríveis", defende Martin.

Janja "quer mostrar o que há de melhor na moda brasileira, diferente do óbvio representado por uma estampa de coqueiro ou a calçada de Copacabana", resume Heloisa Strobel.

Janja prioriza peças sustentáveis e mais práticas do que o guarda-roupa tradicional das primeiras-damas - EVARISTO SA/AFP - EVARISTO SA/AFP
Janja prioriza peças sustentáveis e mais práticas do que o guarda-roupa tradicional das primeiras-damas
Imagem: EVARISTO SA/AFP

No Brasil, a indústria têxtil e de confecções movimentou R$ 153 bilhões em 2022, segundo estimativas do setor.