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Hamburgueria leva esperança para a periferia de São Paulo

A Happiness, no Heliópolis - Reprodução/Instagram
A Happiness, no Heliópolis Imagem: Reprodução/Instagram

Gilberto Amendola

do Estadão Conteúdo, em São Paulo

01/02/2022 10h57

Uma hamburgueria dentro de Heliópolis, na zona sul de São Paulo, vem empregando moradores da comunidade e egressos do sistema prisional. Lá, com uma simples mordida no cheeseburguer da casa, é possível perceber o respeito ao consumidor local e entender o conceito, muitas vezes abstrato, do chamado empreendedorismo social e de propósito.

O criador da Happiness Burguer é o empresário Marcus Vinícius Massarenti, 32 anos. Ele recebeu a reportagem do Estadão na própria hamburgueria.

Nunca passei fome, mas muita vontade. Não tinha fruta em casa. Eu ganhava de uma vizinha. Minha mãe era marmiteira. E meu pai, um homem que veio da roça."

Neste contexto familiar, Massarenti descobriu uma forma de ganhar um dinheirinho e promover o bem-estar entre os amigos. "Aos 9 anos, eu cobrava ingresso de quem queria assistir filmes em casa. A gente tinha um videocassete e alugava fitas de Os Cavaleiros do Zodíaco e outros animes. Rolava pipoca e tudo."

Apesar do tino comercial, ele não foi um garoto muito afeito aos estudos. Por isso, aos 13 anos, o pai decidiu puxá-lo para o trabalho. Foi ser mão de obra na prestadora de serviços condominiais que o pai acabara de abrir. "No primeiro dia, ele me colocou em uma Fiorino, às 5 horas da manhã. Foi limpar a fossa de um condomínio", lembra. Aos 16 anos, criou sua primeira empresa — também no ramo de prestação de serviços para condomínios.

Propósito

Mas aí chegou o momento de fazer faculdade. "Coloquei no Google: 'Faculdade que menos precisa ler'". O resultado foi Publicidade e Propaganda. Foi o que ele fez. Já no segundo ano de faculdade, durante um trote nos novos alunos, conheceu Raiza, sua futura mulher e mãe de Cauã e Bella.

Raiza foi fundamental para a transformação na vida de Massarenti. Ela levou o então namorado para a igreja evangélica que frequentava. Para além dos dogmas, ele começou a entender que sua história não era apenas "ganhar dinheiro, mas ganhar dinheiro com propósito, ser feliz, deixar um legado e causar impacto na sociedade".

O primeiro passo foi um projeto social conectado com a igreja. Na ocasião, ele e outros amigos levavam aulas de futebol, circo e balé para crianças de comunidades e ocupações do centro da cidade. "Mas o projeto não era sustentável." Em 2013, para financiar os projetos sociais, começou a fazer hambúrgueres na frente da Igreja Batista da Liberdade. "A gente divulgava e recebia visitas até de quem não frequentava a igreja", lembra. O sucesso fez com que ele e outros sócios abrissem a Holy Burger, no centro da cidade.

Em 2018, turbulências na vida pessoal e no casamento quase fizeram com que ele jogasse tudo para o alto. "Machuquei muitas pessoas." Neste período, ele vendeu a participação na Holy Burger. "Eu e a minha mulher decidimos implodir tudo e recomeçar sem marcas. E foi o que a gente fez", conta.

Movimento Happiness

Em 2019, recomposto dos tropeços na vida pessoal e mais focado na importância do impacto social nos negócios, ele fundou o Movimento Happiness.

A ideia é tirar as famílias do ciclo da pobreza por meio do conhecimento, criando negócios nas favelas e revertendo parte do faturamento para o financiamento de projetos sociais."

Massarenti chegou a abrir uma Happiness Burguer na Mooca, mas, em poucos meses, encontrou sua casa definitiva em Heliópolis. "A mão de obra dos restaurantes está na periferia, pessoas que passam mais de quatro horas no trânsito para poder trabalhar. Trabalhando aqui, a vida destas pessoas também ganha qualidade."

A inauguração foi em março de 2020, uma semana antes de a pandemia de covid-19 obrigar a cidade a entrar em lockdown.

Foi um banho de água fria. Pior do que isso, a gente viu as pessoas passando fome na comunidade", diz.

Com outros empresários, criou o Happy Voucher — R$ 100 destinados a mais de 600 famílias, que podiam escolher onde comprar e o que consumir no comércio da própria comunidade. Além disso, para a hamburgueria não parar, criou o próprio serviço de delivery — já que os aplicativos não funcionam na comunidade.

Neste período, Massarenti começou a estudar a realidade do sistema carcerário do País. "Nossa população carcerária é a terceira maior do mundo. Um ex-presidiário, em média, só consegue um trabalho depois de quatro anos de deixar a cadeia", explicou. Assim, ele criou uma indústria para produzir Kit Burguer (pão, carne e queijo) para o varejo.

Nesta empresa, os funcionários são, em sua maioria, mulheres egressas do sistema prisional. A prática estendeu-se para a hamburgueria — que emprega moradores da comunidade e também ex-presidiários. Hoje, cerca de 35 empresas têm o selo do Movimento Happiness. Para conquistar o selo, é preciso mostrar que o empreendedorismo social vai além do discurso.

E os lanches? O hambúrguer de 100 gramas, com queijo e maionese, sai por R$ 13. A opção com frango custa R$ 15 e a vegetariana, R$ 16. Existem versões mais completas do lanche, como o Joy (hambúrguer, queijo prato, alface, tomate, cebola roxa, maionese artesanal, R$ 22) ou o Barbecue Supreme (hambúrger, duplo queijo cheddar e prato, barbecue artesanal e cebola crispy, R$ 28). Fica na Estrada das Lágrimas, 2.008, em Heliópolis. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.